Pensar Brasilia

Presidente das coopertativas de catadores pede boas condições de trabalho

postado em 30/10/2012 17:49
Membro do Movimento Nacional de Catadores, Ronei Alves da Silva explica os motivos de a categoria ir de encontro ao modelo estabelecido para o primeiro aterro sanitário do DF, em Samambaia ; com previsão de funcionamento para o próximo ano. Ele reclama da falta de atenção dos governos, nega que a categoria seja contra o aterro sanitário, destaca a falta de estrutura física das cooperativas como o principal problema vivido pelos catadores, defende o pagamento aos rabalhadores pelos serviços prestados e propõe o tratamento do depósito usado atualmente de maneira a minimizar os impactos ambientais.

Quais os principais entraves reivindicados pelas cooperativas do DF?
O maior problema para os catadores é a falta de infraestrutura de trabalho. Hoje a reciclagem é feita sem estrutura apropriada. Mesmo as cooperativas instaladas na área do SLU (Serviço de Limpeza Urbana) não têm infraestrutura necessária para trabalhar. O ideal é ter unidades de triagem com esteiras, transporte e equipamentos para a pré-industrialização de material reciclável.

O que a Centcoop aguarda para conseguir essa estrutura?
Temos o apoio do governo federal. Ele disponibilizou os terrenos para a construção dos galpões das cooperativas. Também existe a pré-disposição do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) em liberar recursos do fundo social para a construção dos centros de triagem. O que resta é vencer a burocracia estatal e a falta de vontade política.

Os catadores estão inseridos em programas e políticas do governo local?
A Casa Civil do DF vinha num processo para a instalação dos centros de triagem e estamos dependendo da articulação com outros órgãos do GDF para a implantação das políticas públicas. Fora isso, existem também várias leis de inclusão do catador, como a 3.517, de 2007, que propõe a coleta seletiva com destinação de resíduos para as cooperativas e associações e a 11.445, a Lei de Saneamento Básico, que prevê a contratação de cooperativas e associações com a dispensa de licitação. Foram vitórias que ainda não chegaram na ponta para mudar a realidade do catador. Hoje é muito bacana, por exemplo, a novela falar de nós. Porém, ainda não conseguimos mudar a situação.

E vocês têm articulado de alguma forma?
Participamos da Frente Parlamentar Ambientalista, da Câmara Legislativa do DF, e buscamos a interlocução dentro do governo para a inclusão dos catadores e para a mudança da realidade das famílias.

Os estados têm até 2014 para aderir à Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). De que forma ela vai incluí-los? Quais as perspectivas para o futuro?
A PNRS (12.305/2010) inclui o catador de material reciclável com o encerramento dos lixões. O grande problema é o ;como;. A inclusão não é apenas social, é socioprodutiva. O Estado deve ver as quatro mil famílias de catadores do DF como agentes socioprodutivos e deve prever que elas sejam contratadas. A nossa luta é não ser apenas mais uma mão de obra barata para os empresários. Da mesma forma, lutamos pela infraestrutura, para ter material reciclável para trabalhar, pela contratação das cooperativas e associações e pela remuneração por serviços prestados. Essa seria a mudança de vida efetiva.

A remuneração seria como um salário?
Não, não queremos apenas um salário, queremos receber pela nossa produção. Quanto mais toneladas você reciclar, mais você ganha; quanto menos, menos recebe. Imagine que uma cooperativa produza 200 toneladas por mês, ela vai receber por isso. Se ela produz 100 toneladas, ela vai receber por 100.

O DF está desativando o Lixão da Estrutural. O que vocês pensam sobre isso?
Fala-se no encerramento das atividades do lixão, mas ninguém cita o tratamento do lugar. Se não houver, o lixo que está lá vai contaminar o lençol freático por muitos anos. Acho que a política de resíduos tem que prever tudo o que é necessário para a mudança da realidade. Precisamos ver o resíduo reciclável não como um problema, mas como a solução ambiental, social e para o consumismo exacerbado. O grande dilema é quando os governantes veem o lixo como um problema, que tem de ser empurrado para debaixo do tapete. Porém, esse lixo pode ser transformado em copo, jarra, plástico e se tornar uma solução.

E qual o posicionamento de vocês sobre o aterro sanitário que será construído em Samambaia?
As pessoas acham que somos contra a implantação do aterro sanitário, e isso não é verdade. Sonhamos com a implantação da coleta seletiva. Ela consistiria na destinação dos materiais reciclados para as cooperativas e associações de catadores, dentro dos seus centros de triagem, e a contratação dessas famílias por meio da cooperativa com o pagamento pelos serviços prestados. Também seria necessário haver a implantação das usinas de compostagem, que tratam a parcela orgânica. Com o sistema de coleta seletiva, o que vai para o aterro é só o que chamamos de rejeito - aquilo que não pode ser reciclado por meio orgânico e é da parcela seca. Reforçamos que o aterro não é um problema para o catador de material reciclável. O grande problema é você ver o catador como uma mão de obra barata para trabalhar para uma empresa que receberá pelo serviço prestado.

Então o principal questionamento de vocês é com relação ao modelo de gestão do aterro?
Sim. A falta da coleta seletiva é um grande problema. Para nós, a implantação dos centros de triagem para as cooperativas e associações é a política coerente. A sociedade vai separar esse material reciclável? OK, então precisa dar uma destinação correta para ele. O grande problema é entregar isso na mão de uma empresa. Dizemos isso pois, na proposta, uma empresa será responsável por tudo: varrição, coleta, transporte, tratamento e destinação final. As cooperativas ficam fora e eles vão apenas permitir o nosso acesso aos centros de triagem espalhados pela cidade.

Como vocês analisam a atitude da sociedade na separação do lixo?
Para nós, fazer a separação por tipo de material é papel do catador, e não da sociedade. O papel da população é separar em lixo orgânico e seco.

Por quê? Essa atitude desvalorizaria o trabalho de vocês?
A separação em lixeirinhas não acontece efetivamente. Hoje o cidadão não tem tempo. Segundo, o que faz com que uma cooperativa sobreviva é a quantidade, o quanto de material entrou. O valor agregado da matéria reciclada é muito baixo. Se você criar o centro de triagem para separar 10% do que efetivamente pode ser reciclável, tira-se a viabilidade. Resumindo, para nós, se não tem volume de resíduo, não tem viabilidade. Isso porque o centro de triagem é como uma empresa, tem de pagar IPTU, água, luz e outros impostos.

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