Quem é Você na Novela

Avenida Brasil chega ao fim atingindo público de variadas classes sociais

Caroline Maria
postado em 19/10/2012 07:00

Às vésperas da estreia no tablado, luz desafinada e cenário incompleto, o diretor teatral Hugo Rodas encontra tempo para questionar as horas. Alguém do elenco responde ;nove e dez da noite!”, para a tréplica imediata do uruguaio. ;O que estará fazendo Carminha agora?; Neste momento, essa é a pergunta de 38 milhões de brasileiros, segundo a Rede Globo, número de espectadores diários que assistem Avenida Brasil, e hoje aguardam o último capítulo da novela que invade as salas do Divino à Zona Sul.

O arrastão cultural recrutou também noveleiros da cidade, atraídos pela ingenuidade de Tufão (Murilo Benício), a ardilosidade de Carminha (Adriana Esteves) e a vingança de Nina (Débora Falabella). Com o mesmo efeito, o público se afeiçoou à espontaneidade de Suelen (Ísis Valverde), aos braços nus de Leleco (Marcos Caruso) e à ingenuidade de Adauto, interpretado pelo brasiliense Juliano Cazarré. Talvez esta seja a primeira vez em que o nome das personagens chegue antes das estrelas globais, o que dá poder ao público e o posiciona igualmente como protagonista.

A horizontalidade do elenco, sem figuras que se isolam em importância ou popularidade, refletiu na conquista dos espectadores. ;Antes chegava em casa e entrava direto no computador. Agora, só depois da novela;, declara a estudante Marília Naomi, 21 anos. Quando perde alguma cena, resgata-a na internet, plataforma em que Avenida Brasil atingiu sucesso colossal, chegando a mais de 400 mil curtidas na página do Facebook, nove trending topics simultâneos no Twitter e picos de audiência que se distanciavam em até 45 pontos em relação às emissoras concorrentes.

Naomi e os amigos se reuniram dezenas de vezes na Asa Norte para sentar no sofá e assistir à trama. ;Parei de malhar à noite por causa da novela;, confessa Luísa Coelho. ;Só saio de casa depois que termina;, concorda Juliana Beal. ;A agenda social precisou mudar;, reforça Fernanda D;Abreu. ;Somos comentaristas, mais até do que espectadores;, completa Paulo Henrique.

Para o motorista Gilson Pereira, morador de Santa Maria, o horário de transmissão do folhetim é também o momento de reunião familiar. O grupo, formado pela esposa Maria Aparecida, os filhos Cleber e Jeferson, as noras Vera Lúcia e Ivonete (além de mais quatro netos no elenco) adiantam as tarefas o mais rápido possível para estar a postos diante da televisão. ;A novela virou o momento em que conseguimos reunir toda a família, nem na hora das refeições é assim. Nós fazemos tudo o que temos de fazer antes da novela;, reconhece Pereira. O motorista se identifica com os maus modos do catador de lixo, Nilo (José de Abreu) e com a doçura de Adauto. ;Acabou essa história de que homem não vê novela, aqui em casa eu sou o que mais gosta;, admite com orgulho.

A influência de Avenida extrapola os lares dos brasileiros e alcança altos escalões do poder. Para não competir com a novela, os comícios com a presença da presidente Dilma Rousseff foram antecipados para as 19h.

Segundo a autora do livro Brasil antenado: a sociedade da novela, Esther Hamburguer, a trajetória de superação dos personagens folhetinescos criaram a empatia necessária para atrair público de todas as fatias sociais. ;Avenida se destaca por ter atraído o público considerado de classe AB que havia nos últimos anos abandonado o gênero e os canais da tevê aberta. Mesmo assim, vale lembrar que essa novela não se apoia no chamado ;merchandising social;. A dramaturgia e os elementos que lhe dão vida, como elenco, figurino e cenários ; nesse caso, também o trabalho de fotografia e edição ; alinhavados por uma boa direção são essenciais;, enumera a especialista.

nAvenida Brasil foi fiel à jornada de vingança, com direito a pitadas de vilania em todos os mocinhos, sem escassez de desgraças e grandes revelações. O resultado é uma ferramenta crítica nas mãos do autor João Emanuel Carneiro, que coloca na boca de Carminha o pensamento reprimido do público: ;Pega uma sacolinha de plástico, Max. Pobre sempre carrega uma sacolinha; ou ;Eu mandei você jogar a Rita no lixo e ela voltou como Nina. É essa porcaria de reciclagem; e até mesmo ;Um bando de baiucas encalhadas que nem a Ágata;, referindo-se à própria filha.

Ao se converter em crônica social, sem pudores e meias palavras, Avenida oferece uma fotografia do país. Vista por outro ângulo, mostra mais um jogador de futebol transformado na imagem de um povo. Tufão emite para o Brasil que não importa se o Divino continuará nas graças da Zona Sul após a novela, mas que sem dúvidas sai de lá maior do que entrou. É o Divino dizendo ;oi; e ouvindo os ecos do seu recado.

7 meses
Duração da novela

70min
Último episódio

38 milhões
Média de espectadores diários

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