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Subúrbios e favelas batem ponto na teledramaturgia e aprimoram abordagem

postado em 19/10/2012 12:14
Nathália Dill em Escrito nas estrelas, da Globo: vida de suburbanaNunca a representação da vida nos subúrbios e comunidades carentes nunca esteve tão em alta na televisão. Cheias de charme e Avenida Brasil, da Globo, chegaram trombeteadas como ;novelas para a classe C;, conceito que hoje já é considerado raquítico para definir o paradoxalmente rico universo que vem à tona em algumas dessas abordagens. É a era do realismo na teledramaturgia brasileira. Mas engana-se quem pensa que o foco no mundo mais popular é novidade contemporânea trazida à tona pelas novelas da Globo.

Quando se trata de mostrar favelas, por exemplo, o pioneirismo é da Record, que, em Vidas opostas (2006-2007), levou as câmeras para gravar o cotidiano da Comunidade Tavares Bastos, encravada nas imediações do Catete, no Rio de Janeiro. Escrita por Marcílio Moraes e dirigida por Alexandre Avancini, a novela não lançou mão de cenários artificiais em seu núcleo de favelados: as locações eram feitas barracos de verdade, o que garantiu à trama uma verossimilhança tamanha que repercutiu na audiência. ;Passei um ano gravando dentro da favela. Era uma dinâmica muito difícil, mas fazer novelas em locações é o grande diferencial da Record. Cidade cenográfica engessa a criatividade;, avalia Avancini.

Nem por isso a Globo pode ser vista como estreante no foco popular. Em 1983, a minissérie Bandidos da falange mostrou o submundo do crime e incursionou pelo cotidiano de comunidades desassistidas do Rio de Janeiro. No ano seguinte, a novela Partido alto foi exibida com várias cenas ambientadas no subúrbio carioca do Encantado, local já celebrizado, décadas antes, por Aracy de Almeida, sua moradora mais ilustre. Os anos foram se passando e, em 1994, Pátria minha, outra novela, teve o roteiro pontuado por diversas inserções em locais marcados pela pobreza.

[SAIBAMAIS]A preferência pelas comunidades carentes foi se aprimorando com o passar do tempo. Em América (2005, Globo), Sol (Deborah Secco) teve a casa da família derrubada na favela e foi morar em Vila Isabel, na Zona Norte do Rio. Dois anos depois, Duas caras estreou com farto espaço para o núcleo da fictícia favela da Portelinha, invasão que se desenvolveu a partir do conflito com uma incorporadora de imóveis e celeiro de importantes personagens da novela ; o líder comunitário Juvenal Antena (Antonio Fagundes) e seu pupilo, Evilásio (Lázaro Ramos), que enfrentou preconceito racial e social ao se envolver com Júlia (Débora Falabella), personagem rica e moradora da Lagoa, na Zona Sul. ;A novela levou as pessoas a diversas reflexões. Que visão é essa que a gente tem da favela?;, questiona Lázaro Ramos, ao avaliar Duas caras.

Favela de mutantes

Na mesma época em que essa trama conquistava a audiência na Globo, a Record contra-atacou com Caminhos do Coração, na qual várias cenas tinham como pano de fundo a favela Paraisópolis (também fictícia), onde morava o mutante Vavá (Cássio Ramos). Era mais uma investida em um olhar diferente sobre o tema, mas não foi suficiente para salvar a novela, cujo roteiro se perdeu em intermináveis aventuras de novos mutantes. Ainda naquele ano, a Globo estreou no Fantástico a série Central da periferia, em que Regina Casé mostrava a cultura de várias comunidades carentes do país.

Seriados da Globo, como Cidade dos homens (2002) e Antônia (2006-2007, com duas temporadas), deram sequência ao desdobramento das novas abordagens. Mas foi com Cheias de charme e Avenida Brasil, exibidas este ano, que a emissora número um demonstrou ter amadurecido o olhar. Tanto na primeira novela, já encerrada, quanto na segunda, que termina nesta semana, as locações suburbanas não estão focadas na abordagem da violência ou da miséria de sempre. Cheias de charme resgatou o sonho da classe emergente, e Avenida Brasil mostra que subúrbio do Divino tem mais calor humano, alegria e charme do que os bairros elegantes estampados em cartões-postais da Cidade Maravilhosa. Mesmo as tomadas no lixão são diferenciadas: mostram uma realidade sofrida, mas deixam entrever que a solidariedade local é o ouro da história.

Salve Jorge, novela que estreia no dia 22 em substituição a Avenida Brasil, também terá ambientação popular. As gravações iniciais, feitas no Complexo do Alemão (conjunto de 13 favelas na Zona Norte do Rio), mostram a comunidade pacificada, com a vida menos assolada pelo medo e pela repressão. ;A pacificação do Alemão foi um momento histórico, parou o país;, analisa a autora, Glória Perez. ;As pessoas da comunidade estão orgulhosas de serem representadas. Querem trazer a voz da comunidade;, resume a atriz Nanda Costa, que, protagonista da nova trama, dará vida a Viviane, uma personagem da favela.

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