Jornal Correio Braziliense

Ser Sustentável

ONG diz que humanidade esgotou os recursos naturais do planeta para 2014

A WWF alerta que os resultados da conta são desmatamento, escassez de água doce, erosão do solo, perda de biodiversidade e o aumento de CO² na atmosfera

A cota de recursos naturais que a natureza poderia oferecer em 2014 se esgota hoje. Em menos de oito meses completos, o planeta chegou ao Dia da Sobrecarga (em inglês, Overshoot Day). A data é um marco anual de quando o consumo humano ultrapassa a capacidade de renovação do planeta. O cálculo é da Global Footprint Network (Rede Global da Pegada Ecológica), organização não governamental (ONG) parceira da rede WWF.

A WWF alerta que os resultados da conta são desmatamento, escassez de água doce, erosão do solo, perda de biodiversidade e o aumento de CO; na atmosfera e, com isso, mais prejuízos humanos e econômicos. Secretária-geral da entidade no Brasil, Maria Cecília Wey de Brito defende que o país tem potencial para reverter a situação, mas teria de mudar a postura. ;Pela extensão territorial e por estamos nos trópicos, o Brasil tem uma posição vantajosa porque tem tempo e condições de olhar para os outros países e fazer as coisas de forma diferente, como melhorar a matriz energética usando mais a eólica e a solar e não poluir os rios;, comenta.

Para Maria Cecília, o país tem biocapacidade para promover tal mudança. ;A técnica existe, o conhecimento e o recurso existem, mas o Estado prefere usá-los em setores que acredita ser mais importantes do que colocar água de qualidade para as pessoas beberem e garantir a produção de alimentos;, comparou a secretária da WWF. Maria Cecília afirma que o Brasil desperdiça o potencial que tem para produzir energias alternativas e investe em modelos ultrapassados. ;Estamos colocando nossa prioridade no pré-sal, apostando em uma energia do século passado, enquanto temos lugares remotos que poderiam sobreviver de outros tipos de energia;, completa a ambientalista.

Transporte
O foco no petróleo acarreta outros problemas. O professor da Universidade de Brasília (UnB) Gustavo Souto Maior classifica como ;nefasta; a política brasileira em transporte público. ;As grandes cidades do mundo estão criando dificuldades para quem quer dirigir nos centros, colocando impostos altos para a manutenção de carros, dando metrô e possibilidade de uso das bicicletas. No Brasil, ainda há a cultura de que bicicleta é para a baixa renda;, diz o professor. Além disso, o governo brasileiro cria incentivos variados para a aquisição de novos carros, como melhoria das malhas viárias, redução de impostos, facilidades de financiamentos.

Souto Maior lembra ainda que um status como o do Brasil, de país em desenvolvimento, o risco de aumentar o consumo de recursos naturais é grande. ;O padrão que o cidadão quer alcançar é o de um norte-americano. Precisaríamos de três ou quatro Terras para suprir essa demanda;, calcula. Para ele, manter dois ou três carros na garagem, trocar de aparelhos eletrônicos uma vez por ano e comprar sem pensar no desperdício são formas de aumentar o consumo. ;Tudo isso é matéria-prima e são resíduos com os quais depois o planeta tem de lidar.;

O uso dos recursos naturais acima da capacidade da Terra se tornou um dos principais problemas do século 21. Hoje, 85% da população mundial vivem em países que demandam mais da natureza do que os seus ecossistemas podem renovar. Projeções da Global Footprint Network sobre a população, o uso de energia e a produção de alimentos sugerem que a humanidade usufruirá da biocapacidade de três planetas bem antes da metade do século. Isso pode ser fisicamente impossível.

A GFN compara a demanda sobre os recursos naturais empregados na produção de alimentos e o uso de matérias-primas com a capacidade da natureza de regeneração e de reciclagem dos resíduos. A medida que contabiliza o impacto ambiental do homem sobre esses recursos é chamada pegada ecológica. Desde o início do ano, o consumo global exauriu tudo o que a natureza consegue repor em um ano e, entre setembro e dezembro, o planeta vai operar no vermelho, causando deficit ao meio ambiente. Nesse ritmo de consumo, seria necessário 1,5 planeta para suprir a demanda da humanidade.

Os especialistas concordam que, para evitar um colapso dos recursos naturais, todos os setores ; sociedade civil, poder público e empresas ; precisam avaliar e repensar os hábitos de consumo.


Obras avançam no Pará
Foco de polêmicas e brigas judiciais, as obras da Usina Belo Monte avançam no Pará. A Justiça Federal rejeitou, no mês passado, pedido do Ministério Público Federal para suspender as obras da hidrelétrica e condenar a construtora Norte Energia a indenizar os índios araras e jurunas, além dos ribeirinhos da Volta Grande do Xingu. Para o MP, os índios estariam com a estrutura social ameaçada e dificuldade de acesso à água potável. A Justiça Federal considerou inconsistentes as alegações do MPF que exigiam indenização. O principal projeto energético do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) já acumula mais de cinco meses de paralisações parciais ou totais. O início de operações da usina está previsto para fevereiro de 2015.