Daniela Santos*, Jairo Macedo-Especial para o Correio
postado em 09/09/2019 07:00
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A segunda etapa de aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), em 10 de novembro, guarda um dia puxado para quem é da ;turma de humanas;. É nele que serão cobradas as 45 questões de ciências da natureza e suas tecnologias. Não tem sido fácil. Das quatro áreas de conhecimento exigidas, ciências da natureza foi a única que mostrou queda na média nacional. A média caiu de 510,6, em 2017, para 493,8, em 2018. No Centro-Oeste, a média foi de 494,76, atrás do Sul (504,40) e do Sudeste (500,80).
Além de destreza em cálculos e fórmulas, é preciso relacionar os conteúdos de física, química e biologia. Não é raro ver temas de mais de uma disciplina na mesma questão.
;É muita coisa!”, espanta-se Anna Letícia Gama, 17 anos, aluna do Sigma. O volume de assuntos, especialmente os de química, a preocupam. ;São muitos detalhes, que complicam a nossa vida. Tenho trabalhado bastante o tempo, especialmente com simulados.;
Luís Felipe Marques, 17, lembra que, no mesmo dia, há ainda outras 45 questões de matemática para enfrentar. O tempo disponível é de cinco horas. ;Todo dia faço uma hora de treino de exercícios e de tempo.;
Habilidades
Gabriel Borges, 19, tem dúvidas sobre o que esperar. Para ele, a abordagem varia entre o puramente técnico e o contextualizado. ;Está difícil saber o que pode acontecer, mas não espero assuntos polêmicos;, especula.
Os professores não veem motivos para alarde. O conteúdo cobrado é amplo, mas razoavelmente previsível. Mapeá-los a partir das edições anteriores é fundamental. ;Em relação ao Enem 2017, o de 2018 manteve o nível médio de dificuldade, assim como uma distribuição de conteúdos semelhante;, avalia Ivys Urquiza, professor do cursinho on-line Física Total. ;Como a matriz da prova é organizada por habilidades, e não por conteúdo, você deve mapear certos assuntos que são cobrados mais comumente e a abordagem proposta;, acrescenta Paulo Ferrari, professor de física do Sigma.
Coordenador pedagógico do colégio Mopi e professor de biologia, Luiz Rafael Silva também não acredita em grandes surpresas. ;Na verdade, as mudanças até aqui não foram estruturais.;
Biologia atual
A porção de biologia privilegia assuntos voltados à ecologia, saúde e agropecuária. A degradação ou conservação ambiental, a partir da ação humana, dá o tom de boa parte da prova. ;Ecologiaé mais tranquilo, porque já entendo na leitura do texto. Nos conceitos de manipulação do DNA, tenho mais dificuldade;, avalia o aluno Gabriel Choucair, 17. ;Se você lê as notícias e está ligado nos debates ambientais, você consegue, pois está no seu dia a dia.;
;Saúde e ambiente são os dois pilares. Sempre temos perguntas que traçam um paralelo entre cultura agrícola e desmatamento;, exemplifica Luiz Rafael Silva. ;Em saúde, o exame aborda a biologia humana, genética e doenças.;
Segundo o professor, há diversos temas no noticiário que têm ligação com o exame. Dentre eles, os focos de incêndio na Amazônia, debate atualíssimo, e a tragédia do rompimento da barragem de Brumadinho (MG), ocorrida em janeiro deste ano. Embora não caiam diretamente, uma vez que a prova é definida com antecedência, a causa deles é pertinente ao Enem, sem dúvida. ;Aí o candidato começa a estabelecer conexões entre os temas, como desmatamento e liberação de gás carbônico. A floresta é uma reguladora do ar e o fogo aumenta a camada de retenção de calor;, diz.
;O Enem cobra muita atualidade. Então, certamente haverá rompimento de barragem na prova, que tem a ver com pressão hidrostática. Tem que estudar, não é tão básico;, afirma Anna Letícia. ;Eles sempre cobram a contextualização, como o desenho da barragem, por exemplo;, diz Raíssa Liberal.
Física aplicada
Laura Guazzelli, 17, vê nas questões de física a maior barreira pessoal. ;Tenho mais dificuldade em física, especialmente em óptica e funções, matérias do primeiro e segundo ano;, diz. ;Quando estudo resistência elétrica, que é mais do terceiro ano, tenho mais facilidade;, diz.
;É de se esperar circuitos e energia elétrica em um terço da prova, e outro terço dedicado a fenômenos ondulatórios, incluindo temas como acústica e óptica;, diz Paulo Ferrari. O terço restante fica entre energia, princípios da dinâmica de Newton e hidrostática.
Nesta reta final, vale revisar mecânica, principalmente dinâmica de partículas. A dica é de Ivys Urquiza. ;Também reforçaria os estudos de ondulatória, com ênfase na parte de fenômenos ondulatórios. Aprofundaria os estudos sobre calor e termodinâmica, também revisando questões com corrente elétrica, resistência elétrica, energia elétrica e circuitos. Com isso, o estudante vai garantir quase 80% da prova.;
Química preocupa
;As questões em que predominam a química são, geralmente, consideradas as mais difíceis pelos alunos;, antecipa a professora do Sigma Juliana Gaspar. A maioria não nega: temas como estequiometria, termoquímica, equilíbrio químico e funções orgânicas preocupam. ;É minha maior dificuldade, porque as equações químicas têm muitas regras e é difícil saber todas;, afirma o candidato Luís Felipe Azevedo, 17.
Para ultrapassar essas barreiras, ele mantém rotina de exercícios diários. ;Enem é fazer exercício mesmo, não tem como;, define.
;Em equilíbrio químico, entender a lógica e fazer as relações é o mais complicado. Tenho feito muitos exercícios nessa parte;, concorda Gabriel Choucair. ;Química é a mais difícil, justamente pelas reações. As regras são muito específicas, com muitas exceções;, acrescenta Raíssa Liberal. ;Em eletroquímica e reações, fico atenta, porque certamente cai. Tenho mais dificuldade em química orgânica, que é mais decorar do que aprender;, avalia a estudante.
;Física exige conhecimentos e correlação de assuntos. Além disso, a abordagem vem do cotidiano, voltado muitas vezes para a tecnologia;, avalia Juliana Gaspar. ;De 2009 a 2018, a área mais cobrada foi fisico-química. Equilibrio químico e termoquímica são questões de puro cálculo;, avalia a professora.
Não procede, portanto, aquela história de que muito da prova se responde apenas com boa leitura dos enunciados. ;Tem que praticar o tempo todo, não dá para fazer só com interpretação;, diz Gaspar. Química geral vem em segundo lugar de recorrência e a dificuldade pode ser alta. ;Para a nossa surpresa, em 2018 sentimos alto índice de erros em ligações químicas. É um assunto muito recorrente e usado no cotidiano;, acrescenta a professora.
Disciplinas dialogam
O volume de cálculos também incomoda. ;Física e química têm mais raciocínio do que propriamente cálculo. Em química, é preciso visualizar o sistema de uma reação. Em física, alguns processos mecânicos têm que ser entendidos na aplicação real;, exemplifica Raíssa Liberal. ;Normalmente, a dificuldade está na habilidade adaptativa: pegar um conteúdo e transpor para novo contexto;, explica Paulo Ferrari.
Ivys Urquiza acredita que o exame se diferencia dos vestibulares tradicionais pela interdisciplinaridade. É na prova de ciências da natureza e suas tecnologias que ela se faz mais presente. ;Algumas questões não têm limite claro sobre ser desta ou daquela matéria.;
Urquiza exemplifica com uma questão do Enem para Pessoas Privadas de Liberdade (Enem PPL), cujo banco de questões é o mesmo do exame comum. A questão fala sobre a incidência da luz em certas substâncias, ;o que libera elétrons que, circulando livremente de átomo para átomo, formam uma corrente elétrica;, como diz o texto. Ivys explica: ;Embora a questão solicite a identificação de um processo biológico, o texto (e a compreensão para solução do item) trata de um fenômeno físico, o efeito fotoelétrico. Sem esse tema da física, o item, considerado de biologia, não seria respondido corretamente;.
Luís Felipe Azevedo também se arrisca em um exemplo. ;Hidrocarbonetos caem muito, especialmente pela demora da decomposição dos plásticos e consequente poluição. Isso dá para relacionar com a ecologia.;
* Estagiária sob supervisão de Jairo Macedo