Eu, Estudante
postado em 14/10/2019 07:00
O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), além de redimensionar o acompanhamento e a avaliação do nível de ensino no Brasil, permitiu que as diversas áreas do conhecimento tivessem parâmetros mais robustos de pesquisa, análise e intervenção, com vistas à recomposição de estratégias em relação ao ensino, aprendizagem e avaliação. Em se tratando da área de ciências humanas e suas tecnologias, os dados de desempenho dos estudantes permitiram não só ressignificar abordagens no âmbito da sala de aula, mas também pautar discussões e ações em torno de novos referenciais curriculares que desembocariam, recentemente, na reformulação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
A lei n; 11.684/08 inclui filosofia e sociologia como disciplinas obrigatórias nos currículos do ensino médio. A partir desse marco, os componentes passam a aprofundar o caráter interdisciplinar do ensino, que já se colocava como valor fundamental às diversas correntes e práticas pedagógicas. Assim, delineiam-se os desafios e potencialidades para o ensino das duas disciplinas. Com um acúmulo de duas décadas, há um repositório de itens testados e validados que permitem mapear, a partir da matriz de referência, em cada componente curricular, conteúdos e temáticas mais recorrentes.
Em filosofia, observa-se a predominância de itens que exploram o pensamento ético, epistemologia, filosofia política, história da filosofia. É importante lembrar que, em cada tema da filosofia aqui mencionado, há uma abordagem histórica inerente. Assim, no caso do pensamento ético, por exemplo, é plausível que apareçam itens relacionados às teorias desenvolvidas no pensamento antigo, medieval, moderno e contemporâneo. Uma tendência observada é a ênfase dada aos filósofos que se destacam em cada tempo histórico. É o caso de Aristóteles na Antiguidade, Kant na modernidade e Habermas na contemporaneidade, o que não é necessariamente uma regra.
[SAIBAMAIS]
É muito importante também a percepção de que além da historiografia, há temas de interesse filosófico que dialogam com o universo existencial e cultural dos estudantes, como natureza, cultura, cidadania, identidade, amor, vida, morte, entre outros.
É primordial observar, na matriz do Enem, as competências relacionadas ao conteúdo dos itens. A primeira fala em ;compreender os elementos culturais que constituem as identidades;, o que é fundamental como forma de avaliar a visão de mundo, cidadania e comportamento ético do candidato. Nesse caso, não se trata só da resolução de itens da prova, mas também do referencial temático que os textos, charges e imagens oferecem a outras áreas.
A sociologia, por sua vez, se articula a outras ciências sociais, como antropologia e ciência política. Destacam-se conteúdos mais específicos, como as teorias clássicas que deram corpo ao nascimento da sociologia: o positivismo, de Augusto Comte; a teoria funcionalista, de Émile Durkheim; o pensamento dialético-materialista de Karl Marx e a teoria compreensiva, de Max Weber. Importante ressaltar o valor das contribuições de pensadores brasileiros, como Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freire, Florestan Fernandes, Darcy Ribeiro, dentre outros, em relação ao estudo sobre a formação do povo brasileiro, da cultura nacional e toda a complexidade temática associada a esses estudos.
Outros conteúdos com maior ênfase sociológica são socialização, trabalho, mudança social, movimentos sociais, estratificação e desigualdade social, imaginação sociológica. No que concerne ao vínculo com a antropologia, destacam-se os temas da cultura, identidade, diversidade, relativismo cultural, etnocentrismo, aculturação, genocídio, xenofobia, gênero e sexualidade, dentre outras variantes temáticas. Com relação à ciência política, há uma recorrência em temas como Estado, governo, poder, política, cidadania e participação política, alienação, ideologia, dominação, regimes e sistemas políticos.
No Enem, é importante reconhecer a dimensão holística e conjuntural dos postulados em filosofia e sociologia, bem como a influência em processos de fundamentação teórica, problematização, interpretação de referenciais temáticos e propostas de intervenção. Os componentes curriculares não são mera coleção de conteúdos, mas fundamento para composição e ampliação do universo cultural, vocabular e existencial dos estudantes.