Enem

Pretos no Enem: ação voluntária paga inscrição de pessoas negras

Projeto atende candidatos em situação de vulnerabilidade que não podem arcar com a taxa de R$85. O prazo para o pagamento vai até esta quarta-feira (10)

Correio Braziliense
postado em 09/06/2020 14:08
Nos últimos dias, a luta antirracista ganhou voz devido protestos ocorridos por todo o mundo após o assassinato de George Floyd, homem negro asfixiado até a morte por um policial branco. Em apoio às pautas que cresceram junto às manifestações, um grupo de jovens uniu uma rede de voluntários para pagar a taxa de inscrição do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de pessoas negras em situação de vulnerabilidade. 

Trata-se da iniciativa Pretos no Enem, que, em apenas uma semana, conseguiu engajar mais de 20 mil voluntários. O pagamento da taxa de R$ 85, estabelecido pelo Ministério da Educação (MEC), ocorre por meio de um processo de apadrinhamento. O voluntário se inscreve, preenche um formulário com apenas dois itens (quantos boletos deseja pagar e contato) e, de acordo com a demanda, recebe o boleto do candidato apadrinhado. 


Home da página Pretos no Enem“Não pedimos dados bancários, transferência, nem nada. Nós mandamos o boleto, em que consta o nome no Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira). É tudo muito transparente”, explica o podcaster Luan Alencar, 25 anos, um dos fundadores da ação. 
 
O prazo para o pagamento da taxa de inscrição no Enem termina nesta quarta-feira (10). O boleto pode ser quitado em qualquer banco, casa lotérica ou agência dos Correios.

Iniciativa pretende alcançar mais candidatos 


O projeto, que nasceu na última terça-feira (2), rapidamente conseguiu um grande número de voluntários. No entanto, visto a quantidade de pessoas dispostas a ajudar, a procura dos candidatos que precisam do benefício ainda é baixa.


Até o momento, cerca de 200 pessoas foram apadrinhadas e tiveram as inscrições do Exame pagas. “É muito legal saber que 200 pessoas que não iriam fazer a prova agora vão fazer. No entanto, perto da quantidade de pessoas que poderíamos ajudar ainda é pouco”, comenta Luan Alencar.


Segundo o Inep, aproximadamente de 300 mil candidatos fizeram a inscrição, mas não pagaram a taxa de R$ 85. Luan acredita que a baixa demanda se dá ao fato de muitos dos estudantes negros em situação de vulnerabilidade não terem acesso à internet e, por isso, não terem conhecimento do projeto. “Contamos com a ajuda de alguns movimentos, entramos em contato com escolas e cursinhos porque queremos chegar nessas pessoas”, afirma. 

Movimento essencial


O jovem João Victor Deboni Silva teve a taxa de inscrição paga por voluntária do projetoO sonho de cursar odontologia agora está mais próximo para João Victor Deboni Silva, 22, um dos apadrinhados. Sem condições de pagar a taxa, o jovem não faria o Exame este ano. Assim que soube da ação, ele entrou em contato com os responsáveis pelas redes sociais e, no mesmo dia, o pagamento da inscrição estava confirmado.  


Em razão da pandemia no novo coronavírus, João Victor perdeu o emprego. Para ele, no meio do atual um contexto, o movimento é se tornou ainda mais essencial. “Todo mundo que foi contemplado deve ser muito grato e, assim que tiver oportunidade, ajudar o próximo também”, diz. 


Apesar de saber o nome, João não teve contato com quem o apadrinhou. “Agradeço muito. Me espelho em pessoas como ela para fazer o bem para outras pessoas”, afirma. 

Ajudando o próximo

A professora Estefanni Alves pagou a inscrição de João VictorDe acordo com o Pretos no Enem, João recebeu ajuda de uma madrinha, a professora de pedagogia da Universidade Estadual do Ceará (Uece) Estefanni Alves, 31. Formada em psicologia, Estefanni conta trabalhou com assistência social e pode acompanhar de perto a vida de em situação de vulnerabilidade socioeconômica. 


“A população negra é a mais afetada. Como professora universitária, eu faço a reflexão de quantos colegas e alunos em sala de aula tenho. Ainda são muito poucos”, expõe a professora.


Segundo o Inep, mesmo os candidatos que não pediram a isenção formalmente, mas que se encaixam nos critérios, terão direito ao benefício. No entanto, a maioria dos estudantes que procuram o Pretos no Enem, apesar de se encontrarem em vulnerabilidade, não atenderam as especificações dos editais. “Uma coisa é ter o direito, outra é conseguir”, afirma Estefanni. 

Projeto veio para ficar 


A iniciativa começou quando a jornalista e podcaster cearense Lyara Vidal publicou em rede social que se disponibilizaria a pagar a taxa de inscrição de alunos do 3º anos do ensino médio. Então, o também podcaster Luan Alencar se organizou com colegas em um grupo de mensagens e o que era para ser um pequeno gesto ganhou aproximadamente 1.000 voluntários em 24 horas. 



“Começamos a nos mobilizar, divulgamos nas redes sociais e a ideia foi crescendo. Fechamos um grupo com 72 pessoas que se organizaram em comissões de divulgação, planilhas, boletos, imprensa”, conta Luan Alencar, formado em direito pela Faculdade Paraíso, no Ceará. 

Agora, o grupo pensa em se organizar com mais tempo que a iniciativa continue no ano que vem. “Esperamos que daqui para frente a gente consiga ajudar mais estudantes. Queremos mobilizar toda essa força tarefa que unimos para algo que vá além do dia 10 de junho”, revela. 

Como ter a taxa de inscrição paga


1 - Basta mandar uma mensagem para @pretosnoenem (Instagram)


2 - Com o boleto em mãos, a equipe entrará em contato com algum dos voluntários, que pagará a inscrição e  enviará o comprovante do pagamento.


Como ser um voluntário


1 - Os voluntários devem preencher o formulário, em que informam uma forma de contato e a quantidade de boletos que poderão arcar;


2 - Preenchido o formulário, os nomes vão para uma planilha em que é feito o controle de quantas inscrições estão com promessa de serem pagas;


3 - Assim que um candidato solicitar o apadrinhamento, um voluntário é escolhido e recebe o boleto. 


4 - O voluntário, então, deve efetuar o pagamento mandar o comprovante.


*Estagiária sob a supervisão de Ana Sá

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  • Selfie de rapaz branco frente a quadro
    Selfie de rapaz branco frente a quadro Foto: Arquivo pessoal
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  • Jovem negro sentado à mesa de estudos
    Jovem negro sentado à mesa de estudos Foto: Arquivo Pessoal

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