Renda maior, desemprego menor, mais famílias com acesso à casa própria, à geladeira e à internet. Tudo isso seria motivo de comemoração, não fosse o fato de a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2011 revelar uma péssima notícia: caiu a quantidade de alunos entre 15 e 17 anos na escola desde 2009, de 85,2% para 83,7%. Isso significa que menos jovens estão completando o ensino médio. Só não houve queda na RegiãoCentro-Oeste.
Ao mesmo tempo, a proporção de jovens ocupados no país também diminuiu em relação a 2009. O Instituto Nacional de Geografia e Estatística (IBGE) admite que podem ser os mesmos que deixaramo colégio antes de concluir o ensino médio. ;Não conseguimos apurar exatamente a causa da saída do mercado de trabalho, mas a princípio eles não trabalham e não estudam;, diz a gerente da Pnad,Maria Lúcia Vieira. Oministro da Educação, Aloizio Mercadante, reconheceu ontem que o maior problema na área de educação hoje é o ensino médio.
Os outros indicadores de educação melhora ramentre 2009 e 2011: a taxa de analfabetismo de pessoas com 15 anos ou mais caiu de 9,7% para 8,6%, a taxa de escolarização das crianças entre 6 e 14 anos aumentou 0,6% e já atinge quase a totalidade delas, 98,5%. Há cada vez mais brasileiros cursando ensino superior, e a quantidade média de anos de estudo subiu para 7,3 anos. O problema é que esse ritmo de melhora está lento, apontam os especialistas. Em 2009, a média de período de estudo de cada brasileiro era de 7,2 anos.Ou seja, o indicador avançou apenas 0,1 ponto percentual em três anos.
Entre os adultos acima de 25 anos,essa média está em7,7anos, o que revela que os brasileiros não completam sequer o ensino fundamental.O coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, alerta que, nesse ritmo, o Brasil chegará a 2040 com uma população majoritariamente adulta com baixa escolarização. Isso será fatal para o desenvolvimento econômico da nação. ;Seremos um país de adultos mal escolarizados, o que trará fortes prejuízos em termos de capacidade produtiva;, lamenta Cara.
Analfabetismo
Embora esteja mais escolarizado, o Brasil também não conseguirá cumprir metas determinadas anos atrás, como a erradicação do analfabetismo, prorrogada diversas vezes. Ainda existem 12,9 milhões de pessoas com 15 anos ou mais que não sabem ler nem escrever. A maior parte está noNorte e noNordeste e entre os brasileiros mais velhos; acima de 40 anos. Em 2009, eram 14,1 milhões. Agora, espera-se que a erradicação seja atingida nos próximos dez anos, conforme estabeleceu o Plano Nacional de Educação (PNE) aprovado em junho pelo Congresso.
Para Maria Helena Guimarães, coordenadora da Associação Parceiros da Educação e integrante do Conselho Estadual de Educação de São Paulo, o que mais preocupa são as pessoas analfabetas com idade entre 15 e 39 anos. No Sul, o índice de analfabetismo na faixa de 25 a 29 anos é de 1%, enquanto no Nordeste chega a 5,9%.
Comos indicadores apontados pela Pnad, o país também dificilmente cumprirá a Emenda Constitucional 59, de novembro de 2009 que determina que, a partir de 2016, não poderá haver um jovem entre 4 e 17 anos for a da escola. ;O Brasil está distante de cumprir as metas na área de educação. O último Censo do IBGE revelou redução nas matrículas de ensino médio. Só que deveriam ter sido criadas 500 mil vagas;, afirma Daniel Cara.
Pobreza extremaperto do poder
Cecília Maria de Freitas Souza, 42 anos, não tem emprego. Ela está entre os 6,7% de brasileiros sem trabalho que figuram na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). Ainda assim, garante a sobrevivência de seis filhos, que moram com ela em uma casa de um cômodo, de alvenaria e madeira, em Ceilândia (DF). Piauiense, veio à capital do país para fugir da seca do sertão, mas, por falta de dinheiro, ainda sofre com a escassez de água. Apesar de ocupar uma residência com encanamento e esgoto, não tem renda suficiente para ter direito a banho e água potável. Todos os dias é obrigada a pedir ajuda aos vizinhos para não morrer de sede. Estoca todo o líquido que pode em garrafas de plástico em uma geladeira antiga.
A desempregada e os filhos aparecem em segundo plano no Brasil apresentado na Pnad. Cecília não viu a renda do país crescer nem sabe o que é a nova classe média. Ela está entre os milhões de brasileiros sem máquina de lavar ou filtro de água. ;Eu sou analfabeta, mas tento botar na cabeça dos meus filhos que estudo é muito importante, que, indo para a escola, eles vão ter o que eu não tive;, conta. Um dos meninos de Cecília, Denilson, deixou o colégio aos 14 anos. Está prestes a fazer 15 e não deve voltar tão cedo. ;Tive de tirá-lo porque sofreu ameaças. Fiquei com medo do que podia acontecer;, justifica.
;Palhaçada;
Esse cenário de pobreza extrema não está longe de quem planeja o país. Fica a apenas 36 quilômetros do Ministério do De senvolvimento Social e Combate à Fome. Apesar da proximidade, Cecília garante que não recebe Um único benefício social. Quando a situação aperta, corre para um Centro de Referência da Assistência Social (Cras) ou para uma igreja e pede o que mais for possível carregar. O ex-companheiro, um catador de lixo, leva alguma comida e dinheiro para a família sempre que pode.
Ainda mais próximo do centro do poder, na Quadra 12 da Estrutural, a família da aposentada Maria das Graças Rodrigues Lopes, 43 anos, vive em uma rua sem asfalto e sem rede de esgoto. ;A poeira é tamanha que tem dia que é preciso lavar a roupa à noite, senão, não há como elas ficarem limpas enquanto secam no varal;, conta. Uma fossa serve de banheiro para a família, e a água da pia da cozinha desemboca na rua mesmo. ;Água tem, mas falta uma ou duas vezes por mês, no mínimo;, reclama. ;Vem governo, muda governo e a situação de quem mora aqui não melhora. Continua a mesma palhaçada;, critica. (VMeRH)
Levantamento vai mudar
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) deixará de apurar no ano que vem a versão anual da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). O levantamento tradicional será substituído por trabalho contínuo, com divulgações completas a cada trimestre e mais enxutas a cada mês, com dados relativos apenas à desocupação. A última Pnad nos moldes atuais será liberada em setembro do ano que vem. ;Desde outubro de 2011, implantamos a Pnad contínua, que passará a fazer, mensalmente, o que a Pesquisa Mensal de Emprego faz. Então, teremos trimestralmente uma divulgação mais agregada, com mais informações, e, mensalmente, o que a PME faz, os dados sobre desocupação;, explicou Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE. A intenção é dar mais abrangência territorial aos dados do emprego e tornar mais dinâmica a divulgação das informações levantadas pela Pnad. ;A grande crítica em relação à PME é não ser uma pesquisa nacional. E a maior crítica à Pnad é de ela não ter divulgações periódicas;, assinalou.