Gustavo Aguiar
postado em 07/05/2013 15:17
O tombamento do Centro de Ensino Fundamental Metropolitana, no Núcleo Bandeirante, não impediu que uma recente reforma modificasse a cor original do prédio histórico. O tom de vermelho dos muros do colégio contrasta com o azul-claro da Igreja Nossa Senhora Aparecida, último patrimônio remanescente do acampamento pioneiro da Vila Metropolitana. A suspeita é que de a pintura faça alusão à cor do Partido dos Trabalhadores (PT), ao qual pertence o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz. Para o professor Frederico Flósculo, da faculdade de arquitetura e urbanismo da Universidade de Brasília (UnB), a nova pintura é um crime. "Modificar um prédio assim é uma agressão ao patrimônio histórico da cidade", garante. "Isso é um caso policial, e precisa ser encarado como tal."
O professor não descarta a possibilidade de a cor ter a ver com a identidade visual do PT. "Se isso ficar comprovado, mostra o quanto os partidos políticos perderam completamente o decoro. Independente disso, o fato revela o quanto a administração pública do DF está equivocada. Brasília vem sendo administrada de forma bárbara", ressalta.
Flósculo diz ainda que a modificação pode trazer prejuízos inestimáveis à memória do DF. "Será preciso fazer uma perícia minunciosa para definir como essa pintura foi feita. É preciso descobrir quem mandou pintar, que tinta usou, quantas demãos foram feitas. Dependendo do produto, a madeira pode ficar permanentemente danificada", explica.
O professor diz que só depois de uma avaliação detalhada será possível saber se dá para recuperar o patrimônio. "O governo vai ser obrigado a gastar muito para isso", prevê o especialista.
Crime contra o patrimônio
Ricardo Dantas, diretor do colégio, nega a suposta campanha política. ;A escolha da cor foi baseada nos tons do Centro de Ensino Fundamental Polivalente, na Asa Sul. Lá ficou muito bom, e achamos que podíamos usar aqui também. Mas erramos um pouco o tom, e o vermelho acabou ficando mais forte;, explica.
Dantas afirma que, quando assumiu o CEF Metropolitana, há dois anos, o prédio estava abandonado. Ele diz ainda que não recebeu qualquer instrução especial sobre a preservação da instituição. ;Não sabia que não podia mudar a cor da escola. Depois que pintamos, apareceu uma pessoa da Secretaria de Educação dizendo que a pintura original, um tom de amarelo, precisava ter sido mantida. Mas, quando cheguei aqui, a escola estava pintada de verde;, lembra.
Em nota, a Secretaria de Educação do DF afirmou que, durante a reforma, os gestores do CEF Metropolitana não informaram sobre as cores que deveriam ser usadas na pintura da escola. "Nesse sentido, a SEDF fará uma análise da situação para verificar se houve alteração no patrimônio tombado, para assim tomar as providências cabíveis, se verificada necessidade de manter as características originais do projeto da escola", informou a assessoria de comunicação do órgão por e-mail.
O subsecretário do patrimônio histórico, artístico e cultural, José Delvinei, ligado à Secretaria de Cultura do DF, garante que houve danos ao prédio original. "Desaprovamos a conduta do professor, mas não vimos necessidade de punição. Ele é apenas um ignorante", conta.
Segundo ele, a subsecretaria está criando um projeto de revitalização e de educação da comunidade escolar sobre o patrimônio histórico do DF. "A escola será revitalizada, mas precisamos esperar o parecer da Secretaria de Educação para começarmos os trabalhos."
O subsecretário admitiu que o órgão não faz visitas regulares aos prédios tombados da cidade, e que o professor de fato não recebeu nenhuma orientação sobre como administrar uma escola tombada pelo patrimônio. "Estamos criando um plano de restauração de toda a Brasília histórica para corrigir esses erros", promete.
Além da nova pintura, a reforma feita para receber os alunos no início do ano letivo de 2013 no CEF Metropolitana também garantiu a troca de parte do forro da escola e do piso do pátio, da reforma hidráulica, a revitalização dos banheiros e compra e a instalação de ventiladores nas salas de aula. Em 2011, a quadra esportiva da unidade foi reconstruída e ampliada.
Memória abandonada
;Nunca vi escola de cor vermelha;, conta Cleusa Godoi, 73 anos. A dona de casa estudou no CEF Metropolitana na década de 80, onde fez supletivo. Lá, a dona de casa matriculou todos os filhos, e é onde atualmente estuda a neta da moradora que vive no bairro de pioneiros há 35 anos.
Para ela, propaganda política é a única explicação para a nova cor do prédio histórico. ;O povo daqui só faz as coisas no interesse. Mas, depois da reforma, ficou bem melhor. Conheço muito esse lugar, e posso dizer que, antes, estava tudo abandonado.;
Margarida Barros, 70 anos, que mora em frente à escola e tem um sobrinho matriculado na instituição, confirma que, antes dos reparos, a escola estava mal cuidada. "A reforma deixou a praça mais bonita. Eles arrancaram o mato que crescia em volta e melhoraram o aspecto da Vila Metropolitana. Mas podiam ter escolhido outra cor, assim fica parecendo propaganda para o PT", opina. "Não pode mexer numa coisa assim, que é como um museu da nossa história."
O CEF Metropolitana atende atualmente a 500 alunos do 1; ano do ensino infantil até o 9; ano do ensino fundamental, e recebe também alunos com necessidades especiais. Segundo o diretor da instituição, a reforma feita no início do ano é provisória, e custou R$ 70 mil. Tudo pago com os recursos do Programa de Descentralização Administrativa e Financeira (Pdaf), que dá autonomia na administração das escolas do DF.
Como parte do colégio ainda preserva a estrutura original de madeira e o telhado de amianto, o diretor reclama que o cupim e o calor prejudica o rendimento dos alunos. Ele aponta paredes apodrecendo, e que precisam ser restauradas. ;Melhoramos a estrutura para conseguirmos elevar os índices de educação da unidade. Cuidar de uma escola assim é um desafio, e a reforma era urgente;, avalia.
Histórico
O CEF Metropolitana, antiga Escola Classe, é uma das primeiras instituições de ensino erguidas pela Novacap no DF. Foi inaugurada em 20 de abril de 1958, com a previsão de funcionar de forma provisória. Entre as escolas, é a única que manteve a estrutura preservada desde a época da construção de Brasília.
A instituição passou por uma reforma de ampliação entre 1988 e 1990, quando novos blocos de salas foram construídos. O tombamento veio em 1995, por uma reivindicação dos moradores. A área considerada patrimônio histórico inclui a praça, a Igreja Nossa Senhora Aparecida e o campo de futebol, localizado nos fundos do terreno.