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Dentro dos muros da escola

Estabelecimentos de ensino público adotam dinâmicas de grupo e diálogo para combater a prática da humilhação. Professores debatem temas relacionados à discriminação, e GDF formata Plano de Convivência Escolar

postado em 26/09/2013 13:30

Estabelecimentos de ensino público adotam dinâmicas de grupo e diálogo para combater a prática da humilhação. Professores debatem temas relacionados à discriminação, e GDF formata Plano de Convivência EscolarOs apelidos maldosos e os xingamentos disfarçados de brincadeira quase provocaram a saída de Sara da Costa Oliveira, 11 anos, do Centro de Ensino Fundamental 3, na Asa Sul. A lista de termos pejorativos usados para descrever o físico da menina era extensa. ;Alguns colegas me chamavam de gordinha, baleia assassina, canhão e outros nomes. Eu me sentia muito ofendida e ficava magoada. Cheguei a pensar em sair do colégio e me afastar;, lembra a garota. A menina também enfrentou ameaças e violência psicológica por parte dos colegas do 5; ano. ;Para piorar, eu era ameaçada pelos meninos e, se contasse aos professores, eles diziam que iam me bater. As piores horas eram a chegada à escola e a saída, quando eu ficava com medo de que isso acontecesse;, descreve.

A situação vivida pela estudante é um caso típico de bullying ; termo criado na Noruega na década de 1980 e que significa intimidar, ameaçar ; que se popularizou nos últimos anos. Pesquisas apontam que, entre os meninos do 9; ano do ensino fundamental no DF, 32% sofrem com as atitudes. No Brasil, as ofensas são 6% menores, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Especialistas acreditam que o caminho é o diálogo, a capacitação dos professores e o envolvimento da família com a escola. O primeiro passo é não esconder o problema. ;Um verdadeiro educador leva a discussão para a sala de aula;, acredita o professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Walter Ude. ;A escola suspende, expulsa, pune, quando, na verdade, deveria discutir o que é amizade;, completa.

No CEF 3, a forma de trazer o assunto à tona foi por meio da escrita e de dinâmicas de grupo. ; O bullying pode ser motivado pela tentativa de se manter um status, ser o popular ou o brigão. O que queremos mostrar é que isso não existe;, explica a diretora do CEF 3, Sheila Cristina Moreira Santana.

Durante o projeto de combate ao bullying, os alunos leram o texto Gentil e cruel agressão como tarefa de casa. Eles discutiram a questão com os pais e, em sala, escreveram sobre as impressões provocadas pelo tema. Após a reflexão e a exposição, trabalhou-se a diversidade de raças, culturas, hábitos e comidas típicas no Brasil. ;Percebemos uma melhoria na convivência e a diminuição de brigas entre colegas. Nossa preocupação foi, então, mostrar que as diferenças são comuns e interessantes;, defendeu a gestora.

Reconhecer-se no lugar do outro foi fundamental para a mudança de comportamento de Wilian Barbosa Lopes, 12 anos. ;Já pratiquei bullying. Chamei um garoto de buldogue e outro de palito. Não pensei que poderia ofender alguém;, disse o estudante do 5; ano. No exercício aplicado pelo estabelecimento de ensino, ele descobriu que os outros se sentiam mal com algumas brincadeiras: ;Agora, eu não os chamo mais dessa forma, e estamos mais próximos. Aprendi que devo respeitá-los;.

Nas escolas da rede pública do DF, a orientação é que o docente trabalhe temas de discriminação, como o preconceito contra a mulher e o homossexual, o racismo, a desmistificação dos padrões de beleza da sociedade. ;São dezenas de microviolências que ocorrem todos os dias;, resumiu o coordenador de Educação em Direitos Humanos da Secretaria de Educação do DF, Mauro Gleisson Evangelista.

Ele informa que está em andamento a criação do Plano de Convivência Escolar. ;Pretendemos realizar atos de formação com os professores, discutir as relações no ambiente escolar e ajudar a identificar problemas com os alunos. Afinal, de que adianta aprender a teoria de Pitágoras, se o aluno não sabe lidar com o próprio colega?;, lembrou Evangelista.

Palavra de especialista
Efeitos sociais e psíquicos

;Muitas vezes, o bullying é banalizado como se fosse apenas uma brincadeira. Porém, ele provoca efeitos psíquicos e sociais para quem o sofre. Uma reincidência de situações vexatórias ou o apontamento de determinadas características de modo pejorativo têm consequências graves. A criança pode internalizar o desvalor. Em alguns casos, compromete as relações pessoais, o desempenho escolar e provoca depressão. Outros alunos podem temer se relacionar com quem é objeto de bullying por acreditar que também serão alvo de chacota. Para quem pratica, uma intervenção pedagógica é necessária. A escola também é um lugar para aprender a conviver com as diferenças e praticar o comportamento cidadão.;

Tatiana Lionço, professora de psicologia do UniCeub

Tema ganha Oscar de melhor filme estrangeiro

Estabelecimentos de ensino público adotam dinâmicas de grupo e diálogo para combater a prática da humilhação. Professores debatem temas relacionados à discriminação, e GDF formata Plano de Convivência Escolar

No filme Em um mundo melhor, de Susanne Bier, um médico intercala o trabalho em um campo de refugiados na África com as visitas à família na Dinamarca. Ele tem dois filhos, Marianne e Elias. O menino sofre bullying na escola. Por ter dentes grandes, chamam-no de Rato (foto, D). Os autores da agressão esvaziam o pneu da bicicleta do garoto e o agridem. Ele nunca reage, tem medo dos mais fortes e é tímido. Elias conhece Christian, que perdeu a mãe e acaba de chegar à pacata cidade. A partir daí, os dois bolam um plano de vingança contra os opressores. A produção, de 2010, ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro e a 68; edição do Globo de Ouro, em Los Angeles.

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