postado em 31/10/2013 14:11
O reajuste da mensalidade das escolas particulares do Distrito Federal provocou reação dos pais dos alunos, que mais uma vez ameaçam levar o caso à Justiça. Liderados pela Associação de Pais e Alunos das Instituições de Ensino do DF (Aspa-DF), eles estão dispostos a denunciar os percentuais abusivos fixados para 2014 ao Ministério Público do DF e Territórios, que investiga os aumentos fixados nos últimos três anos. Eles querem que os colégios apresentem as planilhas de custo para justificar a alta de quase três vezes a inflação prevista para 2013. Como o Correio mostrou, ontem, os índices variam entre 8% e 14%. Apesar disso, há duas situações preocupantes: uma escola elevou a mensalidade em 17% e outra tem sete índices diferentes, que variam de acordo com a série do estudante.O presidente da Aspa, o advogado Luis Claudio Megiorin, vai reunir as reclamações dos pais e levá-las ao promotor de Defesa do Consumidor, Paulo Roberto Binicheski, com o pedido de que sejam analisadas. Desde outubro do ano passado, Binicheski apura o aumento da mensalidade dos colégios. Ao todo, 20 instituições se tornaram alvo do MP. Ele concluiu que, possivelmente, uma escola elevou a mensalidade de forma abusiva. O promotor preferiu não divulgar o nome da instituição nem quanto ela teria lucrado indevidamente. As demais instituições não apresentaram a documentação completa solicitada, e as contas ainda estão sob análise.
Segundo o presidente da Aspa, as duas escolas que apresentaram índices abusivos para o ano que vem estão entre as 12 que não encaminharam todos os documentos pedidos pelo Ministério Público. ;Elas sonegaram informações para o MP e estão apostando na impunidade. O processo de mudança será lento. Vai demorar até pegarmos uma escola como exemplo e levarmos para os tribunais;, afirmou. ;Elas cobram o que querem e não há nenhum tipo de fiscalização. Queremos mostrar que a sociedade não está inerte;, acrescenta o advogado, que não descarta entrar com ações individuais contra as escolas futuramente.
Pesado
A indignação de Megiorin é compartilhada por pais na porta das escolas. A advogada Daniela Leal, 42 anos, tem duas filhas de 18 e 15 anos matriculadas em uma escola particular. A mais velha vai para o terceiro ano do ensino médio e a mensalidade dela saltou de pouco mais de R$ 1.600 para R$ 2.198 ; um reajuste superior a 35%. Essa disparada no preço é justificada, pois a escola garante todo o material didático ao estudante dessa série,a caçula ingressará no primeiro ano do ensino médio, e a mãe que pagava cerca de R$ 1.400 mensais, terá que desembolsar quase R$ 1.900 ; 18% a mais. Nesse caso, a alta se deve ao fato de o ensino médio ser mais caro do que o fundamental.
;Mesmo assim, foi um aumento muito pesado. Ontem fui pagar a mensalidade delas e foram quase R$ 4 mil. É trabalhar para pagar escola. Só pago porque considero essa escola a melhor de Brasília. Mas que é um abuso é;, completa a advogada Daniela Leal. Segundo os pais de alunos matriculados em outras séries no mesmo colégio, o reajuste da mensalidade para o ano que vem foi de 13,68%.
O Instituto de Defesa do Consumidor do DF (Procon-DF) discute com escolas e universidades particulares a apresentação das planilhas de custo para os pais na hora de reajustar as mensalidades a partir do ano que vem. O diretor do órgão, Tódi Moreno, ressalta que a relação entre as instituições e os pais é protegida pelo Código de Defesa do Consumidor e o pai tem direito à informação. ;O consumidor que se sentir lesado pode procurar o Procon que vamos notificar a escola para que a planilha de custos seja mostrada;, afirmou.
A presidente do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do DF (Sinepe-DF), Fátima de Mello Franco, disse que, de acordo com a lei, as escolas somente são obrigadas a apresentar as planilhas para o Ministério Público e para a Secretaria de Direito Econômico, mas costumam estar disponíveis para conversar com os pais. ;A relação entre pais e escolas é de muito respeito. Normalmente, quando abre matrículas para o ano seguinte, a escola envia uma circular explicando os reajustes ou faz reuniões com os pais. Cada uma tem uma maneira de se comunicar;, garantiu.
O que diz a lei
A Lei Federal n; 9.870, de 23 de novembro de 1999, permite os aumentos anuais, mas proíbe reajustes ao longo do ano letivo. O valor anual ou semestral deverá ter como base a última parcela da anuidade ou da semestralidade legalmente fixada no ano anterior, multiplicada pelo número de parcelas do período letivo. A legislação estabelece a transparência das demonstrações financeiras das instituições de ensino, que devem comprovar, quando solicitadas, receitas e despesas do período levado em conta para os cálculos.
De acordo com o Decreto
n; 3.274, de 6 de dezembro de 1999, são componentes de custo os encargos sociais, as despesas com corpo docente, pessoal técnico e administrativo, as despesas gerais e administrativas, os gastos com material, conservação e manutenção, serviços de terceiro e públicos, Imposto Sobre Serviços (ISS), outras despesas tributárias, aluguéis, depreciação (de bens, por exemplo), pró-labore, valor locativo, contribuições sociais, PIS/Pasep, Cofins. A planilha também deve considerar o número de alunos pagantes e o número de não pagantes.
O artigo 6; do Código de Defesa do Consumidor estabelece que a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem, é um direito básico do consumidor. Por isso, pais que discordarem do índice reajuste da mensalidade escolar dos filhos devem procurar o Procon. O órgão pode intermediar a relação e notificar a escola a apresentar as planilhas de custo.
Análise
da notícia
Direito à transparência
O reajuste das anuidades escolares seguiu, nos últimos anos, uma tendência de alta acima da inflação acumulada no período. A pressão sobre o bolso dos pais chegou ao ápice em 2012. Organizados, eles recorreram ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, a fim de exigirem que a legislação fosse cumprida pelos estabelecimentos de ensino particular. Eles cobravam o direito à transparência, como dispõem as normas legais, a fim de entender a composição de custo dos colégios.
Os argumentos tanto das instituições quanto das entidades representativas do segmento foram entendidos como insuficientes. A Promotoria de Defesa do Consumidor (Prodecon) acolheu as queixas dos pais e fez uma avaliação rigorosa nas contas de 20 estabelecimentos ; 13 escolas e sete faculdades. Os documentos periciados mostraram que pelo menos uma instituição impôs reajustes abusivos aos consumidores. Esse resultado pode parecer pífio, mas teve impacto importante.
Neste ano, exceto por duas ou três escolas, todas as demais reavaliaram a composição dos gastos e baixaram o índice de aumento das mensalidades. As exceções já foram denunciadas, pois seguem em sentido contrário ao do próprio produto que comercializam: educação. Trata-se de um serviço essencial à formação das novas gerações do país, que não pode ser entregue embalado em ambição desmedida, tecido com usura e ganância. Nesse ramo, não está em disputa o sonho de consumo dois mais abastados. Educação é fundamental, como o oxigênio à vida, para a construção de uma sociedade melhor.