A contradição circula pelas vias próximas às escolas do Distrito Federal. Em uma vizinhança supostamente comprometida com a aprendizagem e a cidadania, papel desempenhado por instituições de ensino e pela família, é muito comum flagrar cenas de desrespeito às normas de trânsito. Vão desde a formação de fila dupla à entrada pela contramão e o estacionamento em faixa de pedestres. A situação agrava-se em horários de pico, quando o fluxo de carros aumenta, e a correria do dia a dia consome a paciência de muitas pessoas.
Nessas horas, o ;jeitinho; toma conta das ruas e expõe pedestres e condutores a situações de desgaste e perigo. A falta de educação é a principal causadora do problema, segundo o comandante do Batalhão Escolar (BPE), tenente-coronel Fábio Sousa Lima. Para ele, como os pais querem deixar os filhos na porta da escola, a qualquer custo, as infrações são cometidas. ;Nossas ocorrências não são de episódios de violência nas escolas, mas de pais que brigam e discutem na porta delas. Muitas vezes, nos solicitam para controlar motoristas que se desentendem por fechadas ou falta de vagas em estacionamento;, relata.
Cidadania
Plano Piloto e Taguatinga são as cidades que concentram a maioria das infrações e desentendimentos do tipo, segundo o comandante do BPE. Isso porque são aquelas com maior número de escolas privadas. ;Não percebemos problemas tão graves em locais próximos às escolas públicas, em que os estudantes, em sua maioria, vão e voltam para casa por meio de transporte coletivo;, explica Sousa Lima. A psicóloga Angela Borges, 47 anos, enxerga um absurdo no comportamento de alguns condutores. ;Eu acho uma falta de cidadania se comportar de uma forma tão nociva, justamente em um local ao qual se traz o filho para ser educado;, avalia. Para ela, a solução é simples. ;Basta que cada um dê passagem, entenda que está em sociedade e que todos aqui têm compromisso. Assim, o fluxo anda;, diz.
Na tentativa de romper com um ciclo de descortesia e erros no trânsito, as crianças são o foco de algumas ações do Departamento de Trânsito do Distrito Federal (Detran DF). Isso porque, além de serem sensibilizadas para questão, ainda incentivam a mudança de comportamento dos pais. ;Nós nos importamos em educar a nova geração porque eles também atuam como fiscais mirins. Se o responsável ultrapassa o sinal vermelho, por exemplo, a criança o chama à responsabilidade;, explica o diretor de educação de trânsito do Detran, Marcelo Granja.
Alunos e professores
O método usado para ensinar a criançada é através de peças teatrais e dinâmicas em que podem interagir com situações muito parecidas com as enfrentadas nas ruas. ;Trabalhamos a criança para que elas percebam o risco a que estão expostas e, com isso, os pais também dão retornos positivos;, diz Granja. Atores importantes na formação de uma cultura de paz no trânsito, os professores da rede pública de ensino reclamam da suspensão de um curso de reciclagem específico sobre o tema nas regionais. ;Há uns 10 anos, nós fazíamos aulas em que trabalhávamos especificamente as leis de trânsito. Agora, só as abordamos de maneira transversal, com outros conteúdos, em sala de aula;, conta o diretor do Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro-DF) Cláudio Antunes.
Há 21 anos como motorista de transporte escolar, Carlos José da Silva, 49 anos, acredita que as vias têm se tornado um local de disputa com o passar dos anos. ;Tem muito mais gente, muito mais carro, e o espaço para circular continua o mesmo;, afirma. Silva reclama que o celular é um vilão. ;Os pais ficam mais preocupados em atender o telefone, em avisar que chegaram e usam o aparelho enquanto dirigem. O resultado é a desatenção, as fechadas, as pequenas colisões;, conta. Para ele, a criação de faixas exclusivas de recuo para o transporte escolar já ajudaria em muito o fluxo. ;Assim, nós desafogamos as vias principais e garantimos um embarque mais seguro para os alunos;, sugere.