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Caminho aberto para o novo ensino médio

Com a sanção da MP que muda os últimos três anos de estudo nas escolas, governo avalia que o sistema estará em pleno funcionamento daqui a três anos. Especialistas alertam que estados e municípios terão papel fundamental nesse período de transição

Natália Lambert, Rodolfo Costa
postado em 17/02/2017 20:42
A reforma nacional do ensino médio, sancionada pelo presidente Michel Temer na manhã de ontem, tem deixado alunos, professores e estudiosos apreensivos, sem saber como e quando ela começa a funcionar e os efeitos que terá na educação. Para o presidente, a Medida Provisória n; 746, de alteração da etapa escolar, foi uma ;ousadia responsável;. Para especialistas, as mudanças, na prática, dependem de muitas variáveis e só ocorrerão a médio e longo prazo, apesar de o governo apostar em uma implementação plena a partir de 2019.

O novo modelo prevê um aumento da carga horária de 800 para mil horas anuais. Ou seja, as 2,4 mil horas atuais ; divididas entre os três anos ; passarão para 3 mil horas. Já as escolas que optarem pelo ensino em tempo integral terão carga horária anual de 1,4 mil horas. Há mudanças também na grade curricular. O reformulado padrão de ensino contemplará a mesma quantidade de disciplinas (13), mas com flexibilidade e a inclusão da formação técnica. A proposta causou polêmicas e motivou a invasão de escolas por estudantes no fim do ano passado.

Com a sanção da MP que muda os últimos três anos de estudo nas escolas, governo avalia que o sistema estará em pleno funcionamento daqui a três anos. Especialistas alertam que estados e municípios terão papel fundamental nesse período de transição
Especialista em políticas educacionais e professor da Universidade Católica de Brasília (UCB), Célio da Cunha comenta que a reforma não ocorrerá da noite para o dia e será necessário muita vontade política, um planejamento rigoroso e apoio financeiro continuado. ;Muitas das críticas que vinham sendo feitas foram corrigidas no produto final, mas ele ainda suscita dúvidas e polêmicas. No papel, é uma mudança que dá aberturas, mas vai depender de reformas constantes, de gestores estaduais e da capacidade do governo em acompanhar, monitorar e avaliar;, afirma. ;Como diria Barão de Itararé, ;tudo seria mais fácil se não fossem as dificuldades;;, ironiza.

Embora o conceito esteja concluído e já seja lei, ele não será aplicado imediatamente. A implementação depende da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que estabelece os conteúdos gerais que serão aplicados nos três anos de ensino. A BNCC está em discussão e deve ser homologada no fim de 2017. A preocupação é não acelerar as discussões em torno da base nacional, justifica o ministro da Educação, Mendonça Filho. ;Não podemos atropelar os passos dados a partir de etapas muito bem definidas e casadas com o planejamento do ministério e os estados, mas a nossa luta é para que comecemos a mudar o ensino a partir de agora;, comentou.

Apesar de a homologação do BNCC ainda estar começando, o esboço já existe. A secretária-executiva do MEC, Maria Helena Castro, defende que o primeiro ano seja concentrado na base. E, a partir do segundo, as escolas comecem a flexibilizar e diversificar o currículo com os itinerários formativos. ;O Brasil é o único país que mantém o ensino médio único e inflexível para todos até o fim dos três anos. É impossível o mundo inteiro estar errado e só nós estarmos certos. Se não, não teríamos índices tão tristes e ruins;, avalia.

O diretor institucional do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), Antonio Neto, diz que a mudança dependerá de uma mobilização muito grande de estados e municípios. Neto explica que será preciso um replanejamento das redes estaduais de educação. ;As escolas funcionam em rede. Há um grande número de variáveis, como espaço físico, quantidade de professores, merenda. Uma escola sozinha não consegue reorganizar isso. Cada secretaria precisa começar a desenhar o modelo, considerando as diversidades de cada região e as carências;, orienta.

Aporte
Para assegurar a implementação, os estados terão suporte técnico e financeiro do governo federal. Mendonça afirmou que R$ 1,5 bilhão já foi disponibilizado para ampliar a oferta de matrículas no ensino integral em 2017 e 2018, que é outra meta. ;Hoje, 6% das matrículas do ensino médio são para o ensino integral. A nossa meta é dobrar em dois ou três anos colocar esse número em 25% até 2024;, disse.

Apesar dos esforços, o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo, acredita que a lei é inviável por não trazer condições para aplicação nas escolas do país. ;É uma medida que não bate com a realidade brasileira, vai ser aplicada para poucos. Não resolve o problema da evasão, vai afastar os alunos e dificultar ainda mais o acesso;, avalia. Araújo ressalta ainda o elevado custo para que a lei saia do papel. ;Os estados não têm estrutura e a ajuda financeira passa pelo orçamento e a vontade do ministro. O investimento anunciado de R$ 1,5 bilhão se dilui em vários anos.;

Professores do ensino médio, especialmente aqueles que ministram disciplinas que passarão a ser optativas, demonstram preocupação também com o mercado de trabalho. O diretor de organização do Sindicato dos Professores do Distrito Federal, Julio Barros, afirma que a categoria está muito apreensiva. ;O maior medo é da evasão escolar e, obviamente, disciplinas que serão colocadas como optativas, terão menos demanda o que, consequentemente, levará a uma redução de vagas e menos concursos públicos;, acredita.

* Estagiária sob a supervisão de Roberto Fonseca


Sem mudanças no Enem

O ministro da Educação, Mendonça Filho, afirmou que a sanção da lei não terá um impacto imediato no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e que somente após a aplicação das novas medidas é que o teste deve ser alterado. ;Nenhuma mudança ocorrerá de forma repentina. Elas vão obedecer ao rito de aplicação das mudanças do ensino médio;, afirmou o ministro, destacando que o Enem precisa ;se adequar; à nova realidade.


"No papel, é uma mudança que dá aberturas, mas vai depender de reformas constantes, de gestores estaduais e da capacidade do governo em acompanhar, monitorar e avaliar;
Célio da Cunha, especialista em políticas educacionais

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