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Debate em torno da BNCC mobiliza personalidades da educação

Tema foi tratado durante o 1º Congresso de Jornalismo de Educação

postado em 01/07/2017 16:48

Um dos debates mais atuais e entusiasmados do 1; Congresso de Jornalismo de Educação, organizado pela Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca), em São Paulo entre a última quarta (28) e a última quinta (29), foi sobre os desafios e os próximos passos da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). A terceira versão do documento, que passa por análise do Conselho Nacional de Educação (CNE), estabelece os conteúdos que devem ser ensinados para a educação infantil e o ensino fundamental ; o ensino médio foi deixado de fora pelo Ministério da Educação (MEC) porque será tratado na reforma que atingirá o período, definida pela Lei n; 13.415, de 16 de fevereiro de 2017. Na próxima sexta-feira (7), será iniciada uma série de audiências públicas regionais para tratar da BNCC.

César Callegari, Cleuza Repulho, Paulo Carrano e o mediador Rubem Barros


A primeira delas será em Manaus. Em seguida, Recife (28 de julho), Florianópolis (11 de agosto), São Paulo (25 de agosto) e Brasília (11 de setembro) receberão encontros sobre o assunto. César Callegari, presidente da Comissão de Elaboração da BNCC no CNE, avalia que a terceira versão da base apresenta muitas melhorias e explica que o documento vem sendo construído a partir da participação popular, não só por meio das audiências públicas. ;Foram feitas consultas públicas com 12 milhões de contribuições pela internet;, diz. Já Paulo Carrano, professor associado da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF), onde coordena o Observatório Jovem do Rio de Janeiro, não está convencido de que essa participação foi efetiva e suficiente.


[SAIBAMAIS];A base é deficitária em termos de contribuição da sociedade, e os professores só participaram na internet ou em eventos das secretarias de educação;, conta. Outra crítica é a de que pais e alunos têm ficado de fora da discussão. Diretor da Associação Nacional de Pesquisa (Anped), ele não é contra a existência de uma base curricular, mas se indigna com o modo como ela vem sendo construída. ;Há duas fontes privilegiadas no debate da base: o governo e as fundações empresariais que trabalham com o governo. Faltam mais vozes na discussão;, reclama. ;A Anped foi alijada desse processo no governo do golpe!”, critica.

E o ensino médio?

;A base está na gaveta de algum burocrata do MEC e foi esquartejada, sem observar como funciona o sistema como um todo;, diz Paulo Carrano, referindo-se ao fato de o ensino médio não ser abordado no documento. Cézar Callegari, conselheiro do CNE, também lamenta o fato de os três anos finais da educação básica não estarem sendo foco da BNCC. ;Infelizmente a parte do ensino médio ainda está no MEC. A justificativa é a reforma que enseja um conjunto de cuidados para elaborar uma proposta para essa fase;, afirma.
;Isso é um problema porque uma base curricular precisa ter uma culminância e as coisas precisam se conversar entre cada etapa. Como pensar na progressão se não temos um norte, um fim?;, questiona. Callegari é crítico também com relação à própria reforma do ensino médio. ;Vejo um problema porque ela retira o direito de aprendizagem integral: o governo brasileiro restringe a 1.800 horas (praticamente a metade do currículo) os direitos de aprendizagem dos jovens sob a desculpa de abrir espaço para as trilhas;, alerta.

Demanda nacional

Para César Callegari, do CNE, a necessidade de se estabelecer o conjunto de conteúdos que deve ser ensinado em cada série escolar é gritante. ;A LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) já propugnava uma base para toda a educação. Depois, o PNE (Plano Nacional de Educação), uma lei vigente, estabeleceu prazo para que o MEC encaminhe sua proposta de currículo;, conta. ;É um passo necessário para que a educação brasileira possa dar o que o Brasil necessita;, defende. Pedagoga, especialista em didática e mestre em educação, Cleuza Repulho avalia que ;a Base Nacional Comum Curricular faz parte de um projeto que defende educação de qualidade, privada e pública, para todos e todas neste país;.


Ex-diretora de Políticas Nacionais do MEC, ex-presidente da União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), ela foi secretária de educação em municípios paulistas por 14 anos e considera que um documento do tipo se faz ainda mais importante em meio à instabilidade econômica e política pela qual passa o país. ;Para a educação, passar, em pouco tempo, por seis ministros e dois presidentes, é muito desgastante;, diz. Apesar disso, Paulo Carrano, professor da UFF, não acredita que a criação e a aplicação da BNCC serão efetivas. ;Se temos um computador antigo (a escola pública), não adianta colocar um software novo;, compara.

Aplicação

;Minha posição é a de que a base não resolve todos os problemas da educação brasileira, mas é um passo importante. É sempre chocante verificar que 90% dos jovens brasileiros completam a escola sem os conhecimentos mínimos em matemática e português, um problema que não começa no ensino médio, mas muito antes;, observa César Callegari. Tudo isso tem impacto na carreira do estudante, por isso, a base é importante não apenas para a vida escolar, mas também para a profissional, segundo ele. Outra consequência da BNCC, de acordo com Callegari, deve ser a reformulação das formações de professores e dos materiais didáticos. O que, claro, será complicado, especialmente por causa da proporção, como reforça Cleuza Repulho. ;A Finlândia tem 5 milhões de habitantes. Aqui, temos 2 milhões de professores. Temos duas Finlândias dando aula;, observa.


;A mudança na educação inicial e continuada de professores não pode se dar só na mesa das universidades públicas: só as faculdades particulares estão formando 200 mil professores;, afirma. Os desafios também serão grandes no que diz respeito à aplicação prática nas escolas. ;Se foi difícil fazer a base, será extremamente difícil fazê-la chegar à sala de aula. Os muitos professores com quem falei não são contra a base, mas querem entender como isso vai afetá-los, como aplicar;, revela Cleuza Repulho. ;O grande desafio é definir por onde vamos começar. O Brasil vai implementar a base de um vez só ou vai ser ano a ano? Se for assim, vai levar 15 anos para terminar a implementação;;


Cleuza acredita que, para garantir uma aplicação mais efetiva, seria interessante que ela não fosse feita por meio do MEC, mas por meio da criação de uma instituição reguladora específica. ;Além disso, precisaremos de um pacto nacional, pois não adianta o MEC querer se os municípios e estados não quiserem. É preciso criar um sistema nacional de educação para unificar e regular;, propõe. ;Hoje, as pessoas têm sorte ou azar com relação ao acesso à educação de qualidade dependendo do CEP, pois cada cidade e unidade da Federação tem muita autonomia;, pontua. A dimensão do país é um grande obstáculo nesse sentido. ;Temos que administrar melhor para garantir direitos e não privilégios, pois direito é para todos e privilégio, para poucos.;

* A jornalista viajou a convite da Fundação Telefônica

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