[VIDEO1]
Cerca de 16 profissionais de educação, vindos das cinco regiões do país, estão sendo capacitados para disseminarem o projeto Conhecendo nossa história: da África ao Brasil, que visa provocar um debate sobre as principais questões relacionadas à cultura negra. A iniciativa é da Fundação Cultural Palmares, instituição vinculada ao Ministério da Cultura (M inc) em parceria com o Ministério da Educação (MEC). Além do curso de capacitação, estão sendo distribuídps 40 mil kits educativos para alunos e professores em 16 estados: bahia, Alagoas, Paraíba, Amapá, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espiríto Santo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Mato Grosso.
Ontem (18), no primeiro dia da capacitação, os multiplicadores, que são servidores do quadro das secretarias de Educação da rede de ensino municipal, principalmente professores, debateram e fizeram uma análise crítica sobre o livro O que você sabe sobre a África?, que faz parte do kit educativo que está sendo distribuído aos professores. Um dos objetivos do curso de capacitação é preparar os docentes da rede municipal para o combate ao racismo, preconceito, discriminação e intolerância religiosa.
Os profissionais marcaram presença no curso de capacitação, que terminou nesta quarta-feira,e mostraram-se otimistas com a implementação do projeto Conhecendo nossa História: da África ao Brasil. No país ainda há muito preconceito por parte dos governantes, dos secretários e da população em relação ao tema. O presidente da Fundação Palmares, Erivaldo Oliveira, enfatiza que essa mudança não ocorre instantaneamente e que o projeto, com o apoio do MEC, está sendo aplicado no lugar correto: ;Esse é um projeto para resolver problemas de preconceitos para as novas gerações, pois a sociedade só muda pelo processo educacional e com a ajuda da sociedade;. A ampliação do projeto é uma construção conjunta de todos os estados e a Fundação conta com a ajuda dos multiplicadores, que é ; tão necessária nesta etapa;.
Amapá engatinha
Annie Caroline Carvalho, 29 anos, é professora da Secretaria de Estado de Educação do Amapá e coordenadora do projeto Conhecendo nossa História: da África ao Brasil no estado. Segundo ela, a capacitação dos multiplicadores é fundamental. ;É muito relevante até para saber que não estamos sozinhos nesse desafio. Ouvindo o relato dos colegas, contribui para fortalecer o conhecimento e multiplicá-lo, pois esse assunto é muito vago no sociedade ;. Segundo ela, existe muito preconceito da comunidade escolar contra o ensino sobre história e cultura afro-brasileira. A professora destaca que no Amapá o ensino da disciplina ainda está engatinhando e por isso acredita que o projeto da Fundação Palmares vai ampliar o interesse da comunidade escolar para as questões étnico-raciais e trazer à tona a temática para dentro da sala de aula. O Amapá implementará o projeto em 42 escolas de 16 municípios por meio de oficinas de capacitação dos professores.
Boas práticas em Pelotas
A psicopedagoga Maria Fernanda Zanotta, 48 anos, veio de Pelotas, no Rio Grande do Sul, para participar da capacitação. No estado, são oferecidos seminários de formação básica para os professores da rede municipal de ensino, envolvendo cerca de 80 profissionais. Essas iniciativas geram boas práticas em sala de aula, como a realização da mostra de trabalhos escolares da cultura afro-indígena, evento que ocorre em agosto. A mostra também traz aos alunos o contato com danças e artesanatos que são produzidos por eles ao longo do ano. Maria, ficou otimista com a capacitação e fala como o projeto será realizado no município. ;Professores de Pelotas estão encantados e o nosso objetivo é desenvolver o projeto em 23 escolas, com a capacitação de 39 professores;, afirma.
Na terra de Zumbi
Zezito de Araújo, 65 anos, leciona desde 1980. Ele sempre acompanhou as iniciativas que o estado de Alagoas promove para a disseminação da cultura afro-brasileira nas escolas. O professor reconhece que o tombamento do Quilombo dos Palmares, na década de 80, trouxe à tona essas questões com a ajuda de organizações de movimentos negros. Mas reconhece as dificuldades que o tema enfrenta por preconceitos que ocorrem até dentro das universidades. Ele afirma que seu trabalho como professor foi desqualificado por sua cor quando dava aula de antropologia na Universidade Federal de Alagoas. O acusador disse que Zezito provocaria mais racismo por ser negro. ;O racismo se apresenta de forma subliminarmente para desqualificar as pessoas e dizer que elas não são capazes de exercer determinada função;. O professor quer levar, por meio do projeto da Fundação Palmares, boas iniciativas aos professores do estado para combater o preconceito. "Vamos fazer uma nova releitura da história do africano, do homem e da mulher negra nos livros didáticos e suas relações sociais na sociedade brasileira ;, disse.
O peso dos movimentos negros
A pedagoga Eliane Boa Morte, 36 anos, está na sala de aula há 33 anos e comenta sobre a implementação da Lei 10.639/2003, que estabelece o ensino de história e cultura afro-brasileira nas escolas. Para ela, a lei ajudou na abordagem da cultura negra e contribuiu com a busca de professores por especialização no tema. Eliane destaca que a luta pela valorização da história e da cultura afro-brasileira foi intensificada com os movimentos negros e com o surgimento de escolas quilombolas. Ela fez questão de destacar a importância do projeto da Fundação Palmares e o curso de capacitação para os multiplicadores: ;Esse encontro é importante porque está aliado às atividades dos projetos para ser aplicado este ano, ouvindo e acolhendo os multiplicadores e dando uma proposta de acompanhamento dessa formação;. Ao longo da vida, a professora Eliane sofreu alguns preconceitos e palavras ofensivas por sua cor. E, a partir daí, começou a se dedicar aos estudos. ;Uma coisa que ninguém pode tirar de mim é o conhecimento.Então, estudo muito, inclusive essa temática;, enfatiza.
Presença em Ouro Preto
Sidnéia Francisca dos Santos, 40 anos, é historiadora e mobilizadora cultural. Ela trabalha na Secretaria de Cultura e Patrimônio de Ouro Preto (MG). No estado, ela disse, foram lançados alguns projetos, como A cor da cultura, mas não alcançaram bons resultados porque essas iniciativas não foram bem aplicadas. Os professores recebiam o material didático, mas não sabiam como utilizar. Portanto, a capacitação dos professores é bem recebida pelo estado ;É extremamente importante esse momento em Brasília, pois vamos tratar da cultura negra com respeito;, destaca Sidnéia. No estado há uma necessidade de reafirmar a identidade do negro, pois eles trabalharam na construção da cidade. O projeto levará não só a história do negro às escolas, como também a interdisciplinaridade de outras culturas. ;A partir da formação dos professores, será possível transmitir o conhecimento aos alunos com foco no protagonismo negro" , conclui.
Preconceito forte
A professora Anny Michelly Brito, 32 anos, exerce a profissão há 10 anos e percebe que na cidade de Campo Grande (MS), o preconceito é muito presente. No âmbito da Secretaria de Educação, segundo ela, há uma divisão que aborda a relação étnico- racial, porém, "Existe uma dificuldade sobre como o ensino da história e cultura afro-brasileira pode ser abordado pelos professores. Percebe-se que não é reconhecido o protagonismo do negro", afirma Anny. Para ela, o projeto Conhecendo nossa História: da África ao Brasil vai ajudar o estado a elaborar novas formas de ensino em parceria com os projetos existentes. Ela também destaca a importância do curso de capacitação oferecido pela Fundação Palmares. "Vai contribuir muito para o professor elaborar atividades em sala de aula. Vejo também como um subsídio para a formação dos professores da rede municipal;, argumenta.
* Estagiária sob supervisão de Ana Sá