Jairo Macedo-Especial para o Correio
postado em 20/12/2017 11:31
O presidente Michel Temer e o ministro da Educação Mendonça Filho homologa nesta quarta-feira (20) a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para a educação infantil (creche e pré-escola) e ensino fundamental (1; ao 9; ano). Após três anos de debate público e votação pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), com vitória de 20 votos contra três, o documento passa a estabelecer as diretrizes básicas de ensino no Brasil. Escolas públicas e particulares devem colocá-las em prática a partir de 2019 até 2020. Ficou fora da decisão o ensino médio, cuja terceira versão da base será apresentada em 2018.
A implantação da BNCC receberá aporte de R$ 100 milhões de recursos para apoio, anunciou o ministro no ato da homologação. De acordo com ele, o texto homologado consiste em passo decisivo na melhoria das etapas da educação, auxiliando no aperfeiçoamento do material didático, programas de formação e direcionamento dos professores. ;A CNE teve visão ampla do Brasil e deu uma passo histórico, previsto na Constituição Federal e que hoje se torna realidade;, afirmou no ato da homologação. ;A Base não é um fim em si mesmo, mas garante tratamento e objetivos de aprendizagem;, esclareceu.
Pauta vinha sendo adiada, diz Temer
O presidente da República afirmou se tratar de tarefa adiada há 20 anos pelos governos anteriores. ;Outros governos não tiveram a ousadia e a coragem de levar a tarefa adiante. Com o documento, agora temos mais clareza das competências que a nossas crianças devem encontrar e cumprir nas escolas.;
;A BNCC tem a pretensão de extrapolar as paredes das nossas escolas, estabelecendo diretrizes para livros didáticos e estimulando a formação continuada do professor dentro de sala de aula. Trata-se de grande oportunidade de construir coletivamente nossos currículos;, acrescentou Maria Helena Guimarães de Castro, secretária executiva do MEC.
Alfabetização antecipada em um ano
Um dos pontos polêmicos, a aceleração da alfabetização em um ano passará a valer com a nova BNCC. Desse modo, os alunos de todo o país devem ser alfabetizados até o fim do 2; ano, meta com um ano de antecedência em relação ao atual.
Secretário de Educação de Pernambuco, Frederico da Costa Amancio classifica o momento como ;histórico e de grande desafio; para o Brasil. ;Nosso estado vê com bons olhos a mudança no ciclo de alfabetização. Sou da filosofia de que, quando estabelecemos padrões elevados, subimos o nível da educação;, avalia.
Para ele, ainda que haja discordâncias em um assunto tão amplo como esse, a importância da educação nacional ter uma base comum é uma unanimidade. ;Foi uma discussão intensa que rodou o país e, se não resolve todos os problemas, é uma ferramenta fundamental para isso. Base não é currículo, é importante esclarecer isso. Na BNCC, estão estabelecidos os direitos de aprendizagem do Amapá a Pernambuco, da Bahia ao Rio Grande do Sul. Tudo o que os estudantes devem e têm o direito de receber das escolas está colocado nele.;
Daniel Damasceno Crepaldi, subsecretário de educação básica do Distrito Federal, também aprova as mudanças e acredita ser essa uma meta viável e correta. ;Quando você baixa em um ano a expectativa de alfabetização, muda um pouco a lógica na educação infantil, que vem prevalecendo há décadas no Brasil e está provado que não funciona. Uma lógica fracassada, cujas diretrizes não estariam sendo discutidas se fossem boas;, afirma.
;Hoje o estabelecido é que as crianças sejam alfabetizadas aos nove anos e passamos a um ano mais jovem. Um país que não consegue alfabetizar suas crianças aos oito anos é um país que não tem um futuro pela frente. Penso que qualquer movimentação que venha no sentido de ajudar é positivo;, completa Crepaldi.
Coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara tem posicionamento mais duro a respeito. Para ele, a BNCC é formada de modo a privilegiar o bom desempenho em avaliações de larga escala, sem, contudo, propor mudanças que dê respaldo e base ao professor no dia a dia. ;No ensino fundamental é problema é maior do que no infantil, na medida em que se busca aceleração da alfabetização das crianças, o que é um equívoco e serve mais como imposição da vontade do estado sobre o processo cognitivo do jovem;, avalia.
;O estado precisa ter capacidade de construir uma política pública que seja producente em termos pedagógicos. Avalio a BNCC como texto de baixa qualidade. De modo geral, não condiz com as necessidades da escola pública, formando a ideia de que o professor apenas transmite conhecimento, ao invés de construí-lo junto ao aluno;, diz Daniel Cara.
Questões de gênero suprimidas
Prevista na Constituição e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), a implantação da Base Nacional de Comum Curricular teve sua primeira versão divulgada pelo MEC em setembro de 2015 e recebeu 12 milhões de contribuições. Em maio de 2016, foi lançada uma segunda versão e, em dezembro de 2017, a versão final foi aprovada, retirando-se do documento normativo questões envolvendo gênero e sexualidade. O MEC terá ainda 30 dias, a partir da homologação, para ajustes no texto.
Para a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, a BNCC falharia ao realizar tal exclusão e demonstra que governo cede às pressões das alas mais conservadoras da política. ;É um texto mutilado ao não citar questões como as de gênero. É preciso que a escola seja inclusiva e respeitosa, promovendo valores condizentes com a Constituição Federal, desconstruindo formações machistas, homofóbicas e construindo no jovem o senso de respeito ao próximo que não havia anteriormente. Grande número de ex-estudantes, hoje adultos, são pessoas que não se encaixaram nas normas da heterossexualidade e foram excluídos do processo;, avalia Daniel Cara.
O ministro Mendonça Filho minimizou as divergências e enfatizou o caráter universalizante do texto. ;Não ficamos na teoria nem ao debate estéril. Muitas vezes, o debate é tomado pelas ideologias radicais. Buscamos fazer com que a BNCC tenha a expressão de identidade de um Brasil amplo, diverso e vivo.;