Jairo Macedo-Especial para o Correio
postado em 13/11/2018 11:04
A Comissão Especial da Câmara dos Deputados que analisa o projeto de lei do Escola sem Partido (PL 7180/14) realizou reunião nesta terça-feira (13) para discutir o substitutivo do relator, deputado Flavinho (PSC/SP). As reuniões da comissão têm sido marcadas por tumulto entre parlamentares e visitantes a favor e contrários ao tema. Ao longo do dia, a reunião foi suspensa por duas vezes. A votação vem sendo prorrogada desde julho.
Diversos bate-bocas entre parlamentares e deles com o público estão forçando o novo atraso. O projeto, que tramita na comissão da Câmara, é de caráter conclusivo, ou seja, caso seja aprovado na comissão, segue direto para o Senado, se não houver recurso que o conteste. Nas últimas semanas, a votação já havia sido adiada duas vezes.
Os opositores do projeto tentam inverter a ordem da sessão, deixando a leitura do parecer para o fim. Até o momento da suspensão, PT, PSB, PC do B e PSOL tinham votado pela obstrução da pauta.
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O projeto Projeto de Lei, proposto por Erivelton Santana (PSC-BA), procura alterar o art. 3; da Lei n; 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Na prática, a explicação da ementa reza pela ;inclusão entre os princípios do ensino o respeito às convicções do aluno, de seus pais ou responsáveis, dando precedência aos valores de ordem familiar sobre a educação escolar nos aspectos relacionados à educação moral, sexual e religiosa.;
Ânimos acirrados
A pauta delicada, acompanhada por cerca de 150 pessoas, provocou acirramento dos ânimos, com diversos bate-bocas entre os parlamentares. Muitos se queixaram de que não havia transmissão ao vivo pela internet para o público no início da sessão. Havia cartazes ofensivos aos professores ; um deles exigindo exame toxocológico dos profissionais, insinuando o uso de drogas pelos docentes.
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Houve deputados que pediram a retirada do cartaz, o que não foi atendido. O deputado Éder Mauro (PSD-PA) se exaltou e fez, com as mãos, o sinal de arma em direção a visitantes que protestavam contra a PL 7180/14. O gesto ficou famoso como símbolo do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL-RJ), que o usou amplamente durante a campanha e ainda hoje. Após o gesto, Éder Mauro ironizou os opositores em seu twitter: "A ;arminha com as mãos; é o terror na vida dos esquerdopatas. Devem lembrar da peia que pegaram do Jair Bolsonaro".
Diversos deputados que se opõem ao projeto fizeram pedidos de ordem, de modo a atrasar as falas dos inscritos, o que irritou o deputado Deputado Rogério Marinho (PSDB-RN). "Estou vendo que não irão cessar os pedidos, é uma tática prevista em nosso regimento", lamentou.
Em citação que ele credita a Max Weber, Rogério Marinho afirmou que "a tarefa do professor é servir aos alunos com seu conhecimento e experiência, e não impor-lhes suas opiniões políticas pessoais". Ele sustenta que há uma "ditabranda" em curso no país, que estabelece um "pacto de mediocridade" nas escolas e universidades. Na avaliação dele, o ensino de temas como a obra de Marx e a atuação política de Lênin predomina no ensino público, em detrimento de outros assuntos que seriam mais relevantes.
"Se houvesse doutrinação do ensino fundamental à educação básica, não haveria a eleição de um presidente de extrema-direita;, contra-argumentou o deputado João Carlos Bacelar Batista (Podemos-BA). Para ele, o projeto ;beira o ridículo; e a intenção é ;colocar uma corda no pescoço dos professores do Brasil, como se fossem inimigos do país;. ;Qual é a real intenção da doutrinação? Nenhum defensor do projeto veio dizer quais são as escolas que passam por doutrinação e que doutrinação é essa", questionou. Tachando o texto de ;obscurantista;, ele acredita que a intenção geral é enfraquecer o agente central da educação, o professor.
"Hegemonia de pensamento"
"Se estabeleceu em nosso país a hegemonia de uma corrente de pensamentos. Isso impede a pluralidade. Se alguém for a uma universidade pública vestido com uma camiseta de Jair Bolsonaro, corre o risco de ser espancado", afirmou Rogério Marinho. Na retomada da sessão, Erika Kokay (PT-DF) argumentou que o projeto não é sem partido, mas, ao contrário, possibilita o cerceamento de debates. "Hoje, uma professora pode entrar em sala de aula vestindo uma camiseta de Jair Bolsonaro", observou ela, em alusão à deputada estadual eleita pelo PSL, Ana Caroline Campagnolo, que incitou pessoas a filmarem professores que estariam doutrinando alunos. Campagnolo, que é do partido de Bolsonaro, já foi flagrada vestindo camiseta com o rosto dele em sala. "É isso que vocês defendem: calar os professores, como se fossem inimigos", afirmou Kokay.
A deputada também falou em obscurantismo e defendeu que, no ensino, é fundamental a "capacidade de argumentar e contra-argumentar". "O conteúdo em sala de aula não pode ser apartado das experiências de cada um. Ele dialoga com as vidas das pessoas, não estamos falando de robôs. Nós defendemos a liberdade de ensinar", afirmou.
Em resposta, o deputado Flavinho se exaltou e chamou a colega parlamentar de "dissimulada e mentirosa". "Mostre no projeto onde se criminaliza professores", bradou o relator. Pelo twitter, ele escreveu: "Estamos aqui enfrentando uma obstrução do PT, PCdoB e PSOL, partidos que tem (sic) seus braços de militância espalhados na estrutura educacional brasileira."
Presidente da Comissão de Educação da Câmara, Danilo Cabral (PSB-PE) se disse totalmente contrário à proposta. ;Ratifico a palavra de diversos companheiros quanto ao equívoco que é essa proposta;, disse, recorrendo aos artigos 205 e 206 da Constituição Federal. ;Esta casa celebrou 30 anos da constituição na semana passada. Devemos respeitá-la. Os artigos afirmam que a educação é um direito de todos e um dever do Estado, falando em formação da cidadania, igualdade de condições, liberdade de aprender, ensinar, divulgar o pensamento e o saber.;