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Saiba como funcionam as escolas do DF em processo de 'militarização'

Equipe de reportagem visitou três escolas submetidas à nova administração, em Ceilândia, na Estrutural e no Recanto das Emas. As maiores mudanças dizem respeito ao aspecto disciplinar

Alexandre de Paula, Augusto Fernandes, Ana Viriato
postado em 13/02/2019 06:02
No Centro Educacional 308, no Recanto das Emas, alunos receberam orientações de disciplina da PM
A polêmica que envolveu a ;militarização; de quatro escolas do Distrito Federal segue após a implementação do programa. Enquanto nos quatro centros educacionais, apesar de controvérsias, a mudança ocorre de forma gradual, na Câmara Legislativa, o debate aumenta a cada dia. O distrital Leandro Grass (Rede) tentou, ontem, emplacar um projeto de decreto legislativo para anular a portaria que regulamentou a gestão compartilhada, administrada pelas secretarias de Educação e de Segurança Pública. O parlamentar, no entanto, foi derrotado. Durante a votação, manifestantes contrários à presença dos policiais militares nos colégios foram retirados do auditório da Casa, a pedido do presidente da Casa, Rafael Prudente (MDB).

O Correio visitou três escolas submetidas à nova administração, em Ceilândia, na Estrutural e no Recanto das Emas. As maiores mudanças dizem respeito ao aspecto disciplinar. Os estudantes passaram a entoar o Hino Nacional diariamente. Além disso, quando há necessidade de troca de sala de aula ou de deslocamento a outro ponto da escola, os jovens fazem fila e seguem os comandos de um policial militar. Eles ainda se dirigem aos professores como senhor ou senhora e, ao conversar com os colegas, os chamam por ;aluno; antes de dizerem o nome do amigo.

No Centro Educacional 7, em Ceilândia, policial militar conversou com os estudantes dentro de sala de aula As estruturas dos colégios também passaram por alterações. Pintadas de branco, as fachadas dos centros educacionais deterão o nome ;Colégio da Polícia Militar; antes do restante da identificação da escola. Por enquanto, a pintura ficou pronta apenas no CED 1, na Estrutural, onde também houve uma polêmica: um grafite em homenagem a Nelson Mandela foi apagado. A arte, além do rosto do ex-presidente da África do Sul, descrevia uma frase dita por ele, em 2003: ;A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo;.
[SAIBAMAIS]

No CED 1 da Estrutural, muro com imagem e frase de Mandela foi apagado: 'Será refeito', afirma secretário Pintado em novembro do ano passado durante as comemorações pelo Dia da Consciência Negra, o grafite ficava no interior da escola, logo após a entrada. A diretora do centro de ensino, Estela Accioly, adiantou que outro espaço receberá um tributo ao sul-africano. O secretário de Educação, Rafael Parente, manifestou-se sobre o assunto pelas redes sociais e reforçou o compromisso. ;Sobre o caso do mural com Mandela: ele será refeito o mais rápido possível. Compartilharemos fotos;, reforçou o chefe da pasta.

As mudanças relativas aos uniformes devem demorar mais. Até ontem, os alunos continuavam vestindo as camisetas do ano anterior e não as vestimentas provisórias escolhidas pelo GDF ; camiseta branca e calça jeans ; até que as fardas definitivas sejam entregues, o que deve ocorrer em maio. Além disso, meninas ainda usam cabelo solto e brincos de argola, e meninos, blusas de time de futebol, bermudas e bijuterias nas orelhas.


Controvérsia

A nova gestão escolar foi bem recebida por alguns dos responsáveis dos cerca de 6,9 mil adolescentes matriculados nos quatro centros educacionais enquadrados pelo formato de militarização. A gari Omarilza Fernandes, 46, é mãe de um adolescente de 13 anos que estuda no CED 1 da Estrutural. ;Moro em uma das quadras mais perigosas da Cidade Estrutural e tenho medo de que o meu filho se perca em meio a tanta criminalidade. Por isso, com a disciplina que será dada pelos militares, tenho certeza de que ele poderá diferenciar o que é bom e o que é ruim para a vida dele;, avaliou.

O modelo, entretanto, não é unanimidade entre os estudantes. Para Cauany Maria da Silva, 15, do 9; ano, o governo deveria investir em mais infraestrutura para as escolas. ;Temos de estudar em salas de aula em péssimas condições. Isso é ruim para o aprendizado. Acho que a presença dos policiais militares pode ajudar, mas não será certeza de que teremos todas as mudanças que precisamos;, opinou.

Em meio a polêmicas e protestos de sindicatos da educação, a militarização também esteve no centro das atenções da Câmara Legislativa. Por 15 votos a 5, o plenário acatou o segundo parecer da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), relatado por Roosevelt Vilela (PSB), deputado da base aliada ao GDF, reprovando o projeto de decreto legislativo proposto por Leandro Grass (Rede) para anular os efeitos da portaria que regulamentou a gestão compartilhada. O primeiro relatório da comissão, favorável à iniciativa, elaborado por Reginaldo Veras (PDT), foi rejeitado pelo mesmo placar. Agora, a única opção dos opositores a iniciativa é recorrer à Justiça.

Para embasar a proposta, Grass pontuou que o Conselho Distrital de Educação não se manifestou sobre o assunto e indicou ;a inexistência de previsão de gestão, por parte da Polícia Militar, de unidades escolares do DF;. ;Quando um poder viola a lei, cabe ao outro poder alertar para essa violação. É o caso da gestão compartilhada. É ilegal;, disse. Roosevelt Villela, no entanto, defendeu que ;a portaria não afronta a constituição federal, uma vez que promoverá melhorias nas escolas. Cabe salientar que não se configura abuso do poder Executivo nesse caso;.





Como funciona


Com o convênio firmado entre as Secretarias de Educação e de Segurança Pública, quatro unidades de ensino tiveram acrescidos aos nomes o termo Colégio da Polícia Militar e foram submetidas à gestão compartilhada. Confira detalhes:

; Cada unidade escolar deve receber de 20 a 25 militares ; PMs ou bombeiros que estão na reserva ou sob restrição médica

; A Secretaria de Educação segue responsável pela parte pedagógica, enquanto os militares ficam com a gestão de aspectos disciplinares, administrativos e das atividades de contraturno

; As escolas seguirão as Diretrizes Curriculares da Educação da rede. Contudo, PMs ministrarão disciplinas relativas à cultura cívico-militar, como ética e cidadania, musicalização, esportes e ordem unida

; Os alunos receberão uniformes diferenciados, produzidos pela Fábrica Social

; Meninas deverão usar coques, e meninos, cabelo curto

; Os responsáveis poderão acompanhar o dia a dia dos estudantes na escola por meio de um aplicativo, que irá informá-los sobre a frequência dos alunos, os horários de entrada e saída, o comportamento e o desempenho escolar

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