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Dívidas com mensalidades escolares podem levar a cobrança judicial

A legislação determina que não pode haver constrangimento para o aluno, ou seja, a falta de pagamento não pode levar a desligamento do estudante ao longo do ano letivo

Renata Nagashima*
postado em 15/04/2019 06:00
Ilustração de criança em labirinto
Inadimplência escolar é um problema que afeta tanto a escola, quanto a família. A legislação determina que não pode haver constrangimento para o aluno, ou seja, a falta de pagamento não pode levar a desligamento do estudante ao longo do ano letivo. A escola pode optar, no entanto, por recusar a renovação de matrícula.

De acordo com o artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), o inadimplente não pode ser exposto ao ridículo, nem ser submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça por parte do estabelecimento. ;O consumidor em hipótese alguma pode ser ridicularizado ou cobrado de forma vexatória, nem passar por qualquer constrangimento em relação ao andamento escolar; não pode ser impedido de frequentar as aulas; não pode ter provas suspensas ou documentos retidos;, aponta Simone Keiko, chefe da assessoria jurídica do Procon-DF.

A Lei n; 9.870, de 1999, também determina que a instituição não pode impedir que o estudante tenha acesso aos seus direitos acadêmicos ou aplicar qualquer outro tipo de penalidade pedagógica por conta do débito. O artigo 6; proíbe a aplicação de quaisquer penalidades pedagógicas por motivo de inadimplência.

O administrador Pedro Henrique Vieira, 27 anos, endividado, não conseguiu pagar as últimas mensalidades de um curso e foi surpreendido ao ter o diploma retido pela faculdade por causa de dívidas. ;Assim que me formei, consegui um emprego, mas precisava do diploma para ocupar a vaga. Eles disseram que eu só teria acesso ao documento quando quitasse minha dívida. Eu precisava, no entanto, do emprego para pagar o que estava devendo;, afirma.

Para não perder a vaga, precisou gerar outra dívida, fazendo um empréstimo, para quitar o débito com a instituição de ensino. ;Eu sabia dos meus direitos, que não podiam me proibir de frequentar as aulas ou fazer provas, nem me negar documentos. Mas não ouviram meus argumentos e se negaram a dar meu diploma. Como eu estava desesperado para não perder a vaga de emprego, tive que aceitar as condições deles.;

Em casos como o de Pedro, Simone Keiko aconselha que, em qualquer situação que considere constrangedora, o consumidor procure o Procon de sua cidade e faça uma denúncia, para que o caso seja devidamente investigado. Outra opção é recorrer à Justiça.

Planejamento

Segundo especialistas, evitar a inadimplência exige ficar atento e fazer acompanhamento do orçamento mensal. ;Quando se prevê uma situação de inadimplência, é importante tentar, primeiro, avisar a escola sobre a situação financeira da família e negociar antecipadamente com a instituição, propondo um parcelamento do valor;, observa Keiko. Além disso, algumas instituições de ensino dispõem de políticas de concessão de bolsas.

A secretária Meire Vasconcelos da Silva, 47 anos, tinha dois filhos matriculados em uma escola particular quando perdeu o emprego e teve dificuldades para pagar a mensalidade da instituição. Apesar de ter desconto porque os irmãos estavam matriculados no mesmo colégio, o valor mensal investido era muito alto. ;Eu e meu marido estávamos trabalhando, mas o meu salário era todo para a escola dos meninos. As despesas de casa ficavam por conta dele. Por isso, nunca passamos por dificuldades financeiras, mesmo com o valor alto;, conta.

Entretanto, Meire foi surpreendida quando a empresa em que trabalhava precisou fazer uma redução do quadro de funcionários e ela ficou desempregada. Se tivesse feito um planejamento sabendo que teria o orçamento reduzido, poderia ter evitado o débito com a escola. ;Trabalhei muito tempo na mesma empresa e recebi muito dinheiro referente aos meus direitos. Com o valor, investi em uma reforma para a casa, em vez de ter reservado para pagar as futuras mensalidades enquanto não encontrava outro trabalho.;

Com o fim do seguro-desemprego, a mineira não encontrou uma alternativa para pagar as mensalidades e o valor acumulou. ;Chegou a um ponto em que, a meu ver, a dívida era impagável.; No fim do ano letivo, procurada pela escola, Meire conseguiu negociar a dívida para que seus filhos fossem rematriculados. ;Fiquei com medo de os proibirem de frequentar as aulas, mas respeitaram a situação e ofereceram ótimas condições de pagamento. Precisei vender o carro para pagar tudo à vista, mas me senti aliviada ao tirar esse peso dos ombros;, comemora.

Obrigações

O advogado do Sindicato das Escolas particulares do DF (Sinepe-DF) Valério Castro explica que, após o período de 90 dias de inadimplência por parte do responsável legal, a escola pode pedir que o nome do devedor seja negativado. ;Também é direito da instituição adotar medidas judiciais cabíveis e, caso a inadimplência perdure até a renovação da matrícula do aluno, a escola tem direito a não renovar.; Além disso, a instituição de ensino não é obrigada a negociar o valor.

Em alguns casos, quando a escola entra com ação judiciária, medidas como bloqueio de cartões de crédito e suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) do inadimplente podem ser determinadas pelo juiz. A advogada Amanda Caetano explica que isso acontece quando há um esgotamento das medidas convencionais de cobrança, como penhora, expropriação de bens, entre outros.

;Hoje, a suspensão do cartão de crédito é bastante efetiva, porque, além da restrição, essa medida dificulta que o devedor realize novos débitos. Nesse caso, acredito que pode ser benéfico até para o consumidor, que evitará novas dívidas com o cartão;, avalia. Ela acrescenta que essas atitudes não devem ser tomadas de forma desproporcional e apenas ser cogitadas pela escola após o esgotamento de todas as medidas convencionais.

; O que diz a lei

; De acordo com a Lei n; 9.870, de 23 de dezembro de 1999, que dispõe sobre as mensalidades escolares, a instituição de ensino não pode impedir que o estudante tenha acesso a todos os seus direitos acadêmicos, no semestre ou ano letivos, sob a alegação de inadimplência. Entretanto, o aluno inadimplente não poderá renovar sua matrícula e poderá perder o vínculo com a instituição, garantia essa dada ao estabelecimento de ensino para recorrer judicialmente no intuito de executar o contrato e exigir o pagamento das mensalidades e o adimplemento das cláusulas estabelecidas, bem como a inclusão nos serviços de proteção de crédito do devedor. A unidade não é obrigada a ofertar novas condições de pagamento para os alunos inadimplentes.
*Estagiária sob supervisão de Mariana Niederauer

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