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Portas abertas ao cidadão

Por meio da extensão, a UnB busca formas de devolver à sociedade o investimento feito nos estudantes. O custo por aluno é de R$ 15 mil ao ano e chega a R$ 47 mil na medicina. Em janeiro, foi lançada uma carta de serviços para promover a aproximação com a comunidade

postado em 05/03/2015 10:41

Os integrantes do projeto Universitários Vão à Escola (UVE) ajudam a promover a autonomia de estudantes de 6 a 14 anos que moram no ItapoãNo Veredicto, voluntários despertam o senso crítico de estudantesProfessores do Vestibular Cidadão dão aulas gratuitas para seleções da UnBAs ações de extensão são a principal maneira de os estudantes de universidades públicas darem um retorno à sociedade do investimento feito neles. No entanto, esse tem sido o braço mais fraco do tripé da educação superior no país ; composto ainda por ensino e pesquisa. Para avançar na aproximação entre a comunidade e a academia, a Universidade de Brasília (UnB) lançou, em janeiro, a Carta de serviços da UnB ao cidadão, que informa sobre as formas de acesso, os cursos oferecidos e como a população pode participar dos projetos.

Na UnB, o custo médio por aluno de graduação é de R$ 15 mil ao ano. Esse valor sobe para mais de R$ 47 mil na Faculdade de Medicina. O mais baixo é o da Faculdade de Ciência da Informação, de menos de R$ 5 mil. As ações de extensão da universidade, por sua vez, envolvem aproximadamente 158 mil pessoas das comunidades interna e externa.

Para o reitor da UnB, Ivan Camargo, a publicação da carta é apenas uma parcela do esforço para ampliar e divulgar a extensão na universidade. ;Sempre precisamos tentar estar em sintonia com a sociedade, porque temos essa tendência quase natural ao corporativismo;, afirma. A transparência e a precisão dos dados divulgados são formas de melhorar até mesmo a posição da UnB em rankings de educação superior. ;Esse cuidado com as informações corretas, na minha maneira de ver, é uma forma de atender a sociedade.;

Obrigação
No início do ano, o reitor da Universidade de São Paulo (USP), Marco Antonio Zago, causou polêmica ao sugerir que os estudantes da instituição prestassem serviços à sociedade depois de formados, como contrapartida do investimento feito neles. A proposta foi apresentada na reunião do Conselho Universitário da USP em novembro de 2014, mas a ata só foi divulgada meses mais tarde. Contatada pelo Correio, e assessoria da USP informou que o reitor prefere não se pronunciar, por enquanto, porque ainda não há um projeto específico da instituição sobre o tema.

Segundo o professor Reginaldo Moraes, do programa de pós-graduação em ciência política da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), qualquer resolução nesse sentido seria revogada pela Justiça. ;A Constituição Brasileira diz que o ensino é gratuito. Não se pode cobrar em dinheiro e não se pode cobrar em serviços. Isso é tão problemático do ponto de vista legal quanto cobrar mensalidade;, afirma.

Ivan Camargo, da UnB, acredita que a normatização não seja a melhor saída. ;Seria muito bom ter esse retorno, que não precisa ser à universidade, mas, sim, à sociedade. O que eu acho difícil é conseguir regulamentar isso. Se você faz uma lei, aí obriga e prende muito o aluno;, diz.

Longe de serem obrigados a prestar serviços à comunidade, muitos estudantes da UnB mostram que é possível devolver à sociedade, ainda durante a graduação, as expectativas depositadas neles. O projeto de extensão Universitários Vão à Escola (UVE) foi criado em 2005 e, hoje, tem como foco promover a autonomia de estudantes de 6 a 14 anos do Itapoã. Com jogos, teatro e filmes, eles tratam de temas como homofobia e racismo. Os resultados são a melhora no desempenho escolar e menos agressividade em casa.

A estudante do 7; semestre de direito Laís Dutra, 20 anos, participa do projeto desde 2012. ;Decidi entrar porque tinha vontade de trabalhar com crianças e com adolescentes. Também gostava da proposta do UVE, de tentar despertar o conhecimento de uma forma prazerosa;, conta.

Um projeto mais recente e também criado por alunos de direito da UnB é o Veredicto, que promove simulações jurídicas com alunos do Centro de Ensino Médio 1 de Sobradinho. Durante um semestre, são apresentados aos estudantes temas relacionados ao direito e, no fim, eles participam do Tribunal Especial (TE). ;Mais do que o senso crítico, queremos levar à emancipação social;, afirma Maria Paula Borges, 20 anos, cocoordenadora da área social do projeto.

Também são feitas simulações de cortes como o Supremo Tribunal Federal (STF) e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (IDH), que contam com a participação de alunos de graduação.

Já o Vestibular Cidadão é uma iniciativa própria de um grupo de estudantes de relações internacionais, criado em 2003. Eles conseguiram expandir o número de alunos matriculados de 30 para 120 por semestre. A iniciativa funciona como curso preparatório para o vestibular da UnB e para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). O pré-requisito para se candidatar a uma vaga é ser aluno de escola pública ou bolsista integral na rede privada.

;Queremos dar uma chance para alunos da rede pública de competirem em pé de igualdade com os da rede privada;, afirma Ana Luísa Cazetta, presidente do projeto.

Benefícios
A extensão costuma ser menos valorizada na universidade do que a pesquisa, por trazer menos resultados práticos para a ascensão na carreira acadêmica. No entanto, o contato com a comunidade ainda durante a graduação é uma maneira de preparar o estudante para o mercado de trabalho e também serve como apoio ao professor nas atividades de pesquisa. ;Hoje, não dá para ficar apenas no mundo da pesquisa, porque tudo tem aplicação real. A extensão permite isso;, avalia o professor do câmpus do Gama Rudi van Els, diretor de Desenvolvimento e Integração Regional do Decanato de Extensão (DEX).

A decana de Extensão da UnB, Thér;se Hofmann, explica que as atividades de extensão são propostas por departamento e envolvem projetos, cursos, seminários e outros eventos. ;Os alunos devem procurar os coordenadores de extensão em cada unidade acadêmica e se informarem sobre os projetos vigentes e sobre como eles podem participar. É uma complementação importante da formação profissional;, incentiva.

O que a UnB oferece
Vestibular Cidadão

A turma do primeiro semestre de 2015 já foi selecionado. A próxima edição do curso preparatório será no segundo semestre. Informações: www.vestibularcidadao.com.br.

Veredicto
As inscrições para a 2; Simulação Jurídica vão até 13 de março, para alunos do ensino superior. Informações: www.veredictounb.com.br.

Experimentoteca
Mantém uma exposição permanente de experimentos e de fenômenos físicos para dar suporte a pesquisas escolares. Atendimento com agendamento de visita guiada, pelo telefone
3107-7749. Site: www.fis.unb.br/exper.

Núcleo de Prática Jurídica (NPJ)
Presta consultoria, assessoria e assistência jurídica a pessoas com renda mensal de até três salários mínimos. Atendimento de segunda a sexta-feira, das 8h às 12h e das 14h às 18h. Contato: 3581-1433.

Serviço de Apoio Linguístico (SAL)
Tira dúvidas de português e oferece sugestões para melhorar textos. Atendimento de segunda a sexta-feira, das 8h às 12h e das 14h às 18h. Contato: 9972-7131.

UnB-Idiomas
Oferece curso de 14 idiomas com preço mais acessível. Tem unidades em todos os câmpus. Site: www.unbidiomas.unb.br.

Centro de Atendimento e Estudos Psicológicos
Oferece serviços de atendimento psicológico. Contato: asscaep@unb.br.

Hospital Veterinário (HVET)
Atende animais de pequeno (no câmpus Darcy Ribeiro) e grande porte (na Granlja do Torto). A triagem é realizada por ordem de chegada, de segunda a sexta-feira, das 8h às 13h. Contato: 3107-2801.

Outros serviços e contatos estão disponíveis na Carta de serviços da UnB ao cidadão, no link bit.ly/1wI6MOJ.

Desafio na Europa

Na Europa, as universidades públicas também enfrentam o desafio de aprimorar e de valorizar a extensão. ;É verdade que os licenciados contribuem para o desenvolvimento econômico e cultural, mas o retorno social é ainda muito limitado;, avalia a professora Dulce Esteves, diretora do curso de licenciatura em ciência do desporto da Universidade da Beira Interior (UBI), em Portugal.

A pressão para apresentar resultados científicos ; como artigos, patentes e inovações ; é cada vez maior, em detrimento de programas que se relacionem com a sociedade. O continente europeu já definiu, no entanto, regras que mostram o que a comunidade espera da formação universitária. Os ministros da Educação de 29 países assinaram, em 1999, o Tratado de Bolonha, que determina a adoção de um sistema único para sintonizar e comparar o ensino superior na comunidade europeia.

Apesar disso, os estudantes têm mostrado desconhecimento e desinteresse pela adoção de uma cidadania interventiva, na visão da professora Dulce. ;Deve haver a clara noção de que a sociedade investe na formação universitária: ;investe;, não ;doa;, pois investir pressupõe um retorno;, atesta. ;Ao estudante é exigido um papel muito mais ativo, o que só é possível se houver uma consciência de que, na sociedade atual, não basta ;saber;, é necessário ;saber fazer;.;

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