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Alunos da UnB debatem ascensão do fascismo

Estudantes participaram de protesto e debate no Ceubinho na tarde desta sexta-feira (26)

Darcianne Diogo*
postado em 26/10/2018 15:01
Estudantes da Universidade de Brasília (UnB) participaram de debate nesta sexta-feira (26) em apoio à Universidade Federal Fluminense (UFF), umas das mais de 30 instituições de ensino e associações de professores em nove unidades da Federação que foram alvo de ações conduzidas pela Justiça Eleitoral e pela Polícia Federal. O debate, ocorrido no período da tarde, foi promovido pela organização socialista Brigadas Populares e pelo Centro Acadêmico dos Estudantes de Filosofia (Cafil) da UnB. Os estudantes discutiram a ascensão do fascismo no Brasil e os desafios da resistência democrática. O evento contou com a participação do filósofo e professor Vladimir Safatle e ocorre no Ceubinho (ICC Norte).
Estudantes da UnB discutem sobre ascensão do fascismo no Brasil e os desafios da resistência democrática

O patrulhamento ideológico, como descrevem os membros da comunidade acadêmica, foi bastante marcado na UFF, onde uma faixa com os dizeres ;Direito UFF Antifascista; foi retirada por fiscais do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Rio de Janeiro, escoltados pela Polícia Militar. Neste momento, estudantes de direito da UFRJ estão caminhando em direção ao TRE, no centro do Rio de Janeiro, para ato organizado pela União Nacional dos Estudantes (UNE).
[SAIBAMAIS]Os agentes alegaram que o material era propaganda eleitoral indevida. Nesta sexta-feira (26), alunos e professores da UFF fizeram um protesto contra a retirada da bandeira. As ;batidas policiais; se repetiram em muitas outras unidades da Federação entre quarta (24) e quinta-feira (25) com o objetivo de identificar e recolher materiais e atividades supostamente de campanha eleitoral. Segundo relatos de estudantes, agentes entraram nas faculdades, retiraram faixas (até sem relação com a eleição) e interromperam debates. Alunos, professores e outros integrantes das comunidades acadêmicas reclamam que as ações ferem a democracia, a autonomia universitária e a liberdade de expressão.
Faixa com a palavra
O Tribunal Superior Eleitoral se manifestou ao final da tarde pela presidente, a ministra Rosa Weber. "O TSE, diante de fatos noticiados pela imprensa no dia de hoje", diz a nota, "está adotando todas as providências cabíveis, por meio da Corregedoria Geral da Justiça Eleitoral, para esclarecer as circunstâncias e coibir eventuais excessos no exercício do poder de polícia eleitoral no âmbito das universidades de diversos estados da federação". Clique aqui e saiba mais.
A Justiça Eleitoral não emitiu posicionamento unificado sobre a questão, mas o teor semelhante de mandados de busca e apreensão emitidos por Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) de unidades da Federação diferentes, levam a crer que as atividades foram coordenadas, tendo como alvo aulas, manifestos, panfletos e outros materiais que, no entendimento da Justiça Eleitoral, fariam campanha irregular para Fernando Haddad, candidato à Presidência da República pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), policiais federais apreenderam um manifesto em defesa da democracia e da universidade elaborado por professores.
Prédio da Uerj com faixasNa Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), o TRE teria fiscalizado salas de aula, o que foi repudiado pela Reitoria. Na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), faixas (em homenagem à vereadora Marielle Franco, assassinada em março deste ano; e outras com mensagens como ;Direito Uerj Antifascismo;) foram retiradas por policiais federais. Por causa disso, docentes e alunos promoveram, na manhã desta sexta-feira (26), aula aberta e gratuita sobre direitos sociais e trabalhistas na estação de metrô Maracanã. A atividade foi uma resposta à ação de policiais na quinta, no câmpus Maracanã da Uerj que, segundo alunos, teria acontecido sem mandado e sem conhecimento da reitoria da universidade.

Posição da UNE e Faculdade de Comunicação da UnB

Segundo a presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Marianna Dias, estudante de pedagogia da Universidade Paulista (Unip), a UFF sofreu alto nível de censura e autoritarismo. ;Estamos preocupados com esses costumes que estão sendo estabelecidos, pois a universidade sempre foi um lugar de manifestar e expressar direitos.; A presidente da organização destaca ainda a importância dos jovens em movimentos em prol da democracia. ;Quando os estudantes se posicionam, estão garantindo o poder de lutar a favor dos direitos humanos;, diz. A UNE é a entidade máxima dos estudantes brasileiros e representa cerca de 6 milhões de universitários de todos os estados e do Distrito Federal.
Integrantes da UNE também estariam sendo ameaçados por eleitores do candidato à presidência pelo Partido Social Liberal (PSL), Jair Bolsonar. É o que afirma Marianna Dias. ;Estamos recebendo uma série de ameaças no nosso e-mail institucional, dizendo que, se Bolsonaro ganhar as eleições, a UNE vai morrer e que vão agir com violência.; Uma das mensagens, enviadas por remetente anônimo, continha frases como ;apenas a supremacia branca prevalecerá;, ;nordestino vai morrer; e ;viado vai morrer;. A UNE denunciou as ameaças à Polícia Militar nesta sexta-feira (26) e organizou um ato em frente ao TRE do Rio de Janeiro no mesmo dia, a partir das 14h.
A Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (FAC/UnB) também se pronunciou a respeito. Em nota (confira na íntegra ao final), a diretoria afirmou sua posição: "Levando em conta o registro das referidas ameaças e diante das inúmeras manifestações públicas de intolerância, incitação à violência e desrespeito a princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos e da Constituição Federal (art. 5o.), a Direção da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (FAC-UnB) une-se ao Conselho Universitário da UnB na defesa da democracia e da garantia dos direitos constitucionais, especialmente do direito às liberdades de expressão e de imprensa."

Outras reprimendas

Nota elaborada por entidades acadêmicas do Rio de Janeiro foi postada na página do Facebook da Universidade Católica de Petrópolis (UCP), dizendo que estudantes da UCP foram retirados da universidade pelo TRE-RJ na quarta-feira (24), pela realização de uma plenária em defesa da democracia. A nota descreve que agentes do TRE-RJ ;diziam que defender a democracia seria defender o candidato Fernando Haddad, o que prejudicaria o candidato contrário, que era chamado de fascista;.
O documento continua: ;Não devemos ter dúvida que a parcialidade do TRE mostra que, cada vez mais, devemos construir a frente democrática em favor de todos no nosso país. Tivemos companheiros ameaçados, com seus dados divulgados de maneira arbitrária, mostrando claramente uma perseguição aberta àqueles que lutam pela democracia;. Em nota enviada pela assessoria de imprensa da UCP, a entidade reconhece a importância da democracia, do atual sistema de governança do Brasil e da liberdade de pensamento e de expressão em conformidade com a legislação vigente.
O ex-ministro Tarso Genro se manifestou no twitterNa quinta-feira (25), a palestra organizada pelo candidato que concorreu à presidência pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), Guilherme Boulos, ;Contra o fascismo. Pela democracia! Boulos na UFRGS;, que seria promovida na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), precisou trocar a sede do seminário e passar a acontecer fora da universidade, no Viaduto Imperatriz, em Porto Alegre, nas proximidades do câmpus Centro. A proibição partiu da própria universidade. O evento, sobre ditadura e fascismo, contou com a participação de Guilherme Boulos, da deputada federal eleita Fernanda Melchionna (PSOL) e da deputada federal Maria do Rosário (PT). Em face da troca do lugar do evento, o ex-ministro Tarso Genro se manifestou no Twitter.
;Dei aulas, proferi conferências em universidades de França, Inglaterra, Portugal, Espanha, Alemanha, Argentina e aqui, mesmo na ditadura. Respeitei sempre os protocolos legais dessas casas de ensino. Hoje, censurado para falar na UFRGS, no RS que governei. Fascismo cresce;, escreveu. Em nota, a UFRGS explicou que a troca de lugar se baseou no documento ;Condutas Vedadas aos Agentes Públicos Federais em eleições 2018;, da Advocacia-Geral da União (AGU), item 9.2.1, que versa sobre cessão e utilização dos bens públicos. O referido artigo define que ;é vedada a cessão de bens móveis pertencentes à administração Direta ou Indireta da União para atividades de campanha eleitoral. Portanto, a solenidade foi transferida para o local externo da instituição.;
Segundo a UNE, mais de 30 universidades tiveram atividades interrompidas, material apreendido, foram notificadas ou receberam a visita da polícia. Confira algumas das instituições:
  • UFRRJ
  • UFPB
  • Uerj
  • UFU
  • Ufam
  • UCP
  • UniRio
  • UEPB
  • UFMG
  • UFG
  • Uneb
  • UCP
  • UFMS
  • UFRJ
  • Ufersa
  • Unilab
  • UFF
  • Unifei
  • UFBA
  • UFCG
  • UENF
  • UEPA
  • UFGD
  • Unesp Bauru
  • UFSJ
  • UFRGS
  • UFFS
  • IFB
  • UNESP BOTUCATU

Nota da FAC/UnB na íntegra

Nota da Direção da Faculdade de Comunicação da UnB em repúdio às ameaças à liberdade de expressão


Graves notícias de ameaças e perseguição à atuação de jornalistas e demais profissionais da Comunicação nesta Campanha Eleitoral de 2018 têm sido notificadas publicamente por entidades representativas como a Federação Nacional de Jornalistas (FENAJ), a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e outras instituições.

Levando em conta o registro das referidas ameaças e diante das inúmeras manifestações públicas de intolerância, incitação à violência e desrespeito a princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos e da Constituição Federal (art. 5o.), a Direção da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (FAC-UnB) une-se ao Conselho Universitário da UnB na defesa da democracia e da garantia dos direitos constitucionais, especialmente do direito às liberdades de expressão e de imprensa.

A Direção da FAC-UnB se solidariza às(aos) profissionais que, mesmo diante de um ambiente hostil à prática de um jornalismo ético e de qualidade, mantiveram seus princípios em defesa da democracia e das liberdades. Também nos solidarizamos aos docentes, técnicos e discentes das Universidades públicas que recentemente foram cerceados de exercer seus direitos à liberdade de cátedra, à liberdade de expressão e de pensamento, à reflexão e ao debate sobre a situação política nacional.

A Faculdade de Comunicação da UnB tem, em sua história, a memória institucional da repressão imposta pela ditadura militar entre 1964 e 1985, que demitiu professores, assim como suscitou o exílio e perseguiu estudantes, técnicos e docentes dentro do próprio campus universitário, fatos históricos amplamente documentados e disponíveis

Por isso, neste momento tão importante da vida nacional, em que a disputa eleitoral tem sido marcada pelo uso intensivo e deliberado de desinformação para influenciar a decisão do voto dos cidadãos e cidadãs, situação já identificada publicamente em 25 de outubro de 2018, pela Organização dos Estados Americanos (OEA, organização da qual o Brasil é país fundador e membro), manifestamos nosso compromisso com o respeito à liberdade de expressão. Consideramos a liberdade de expressão um princípio fundamental para assegurar os Direitos Humanos no que abarca os direitos à pluralidade, à diversidade e à justiça social, valores estes norteadores de nossa história e de nossa instituição.


Atenciosamente,


Liziane Guazina e Fernando Oliveira Paulino

Vice-Diretora e Diretor

Faculdade de Comunicação

Universidade de Brasília

*Estagiária sob supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa

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