Correio Braziliense
postado em 12/06/2020 21:17
Mateus Salomão*
A polêmica Medida Provisória nº 979/2020, que autorizava o ministro da Educação a nomear reitores para instituições federais de ensino sem eleição durante o período de emergência de saúde da covid-19, foi devolvida pelo presidente do Congresso Nacional, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e posteriormente anulada pelo presidente Jair Bolsonaro nesta sexta-feira (12/6).
Mesmo sem chance de valer, a proposta gera receio entre estudantes e professores. Afinal, esta não é a primeira vez que o presidente da República tenta dar a Abraham Weintraub, ministro da Educação, essas prerrogativas. A Medida Provisória MP nº 914/2019, que alterava a forma de escolha de reitores das universidades e institutos federais e do colégio Dom Pedro II, caducou em 2 de junho.
Essa medida permitia que Weintraub desrespeitasse o resultado das eleições para reitores, sendo desobrigado de nomear como reitor o candidato mais votado. Professores, estudantes e servidores de universidades e institutos federais seguem com medo de que a gestão Bolsonaro tente interferir na escolha de reitores no futuro.
Entidades estudantis se posicionam
Em nota, a União Nacional dos Estudantes (UNE), a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) e a Associação Nacional de Pós-graduandos (ANGP) pedem mudanças na gestão do Ministério da Educação (MEC). As entidades afirmam que “a saída de Abraham Weintraub é urgente para que o MEC volte a atuar pela Educação e deixe de ser apenas uma ferramenta ideológica para manobras autoritárias do governo Bolsonaro”.
Saiba Mais
As associações estudantis comemoraram a devolutiva do Senado, que demonstra que “as arbitrariedades do governo Bolsonaro não serão aceitas”. Consideram a rejeição da proposta “uma vitória para o povo brasileiro, em defesa da democracia e da liberdade de cátedra das nossas universidades”. As entidades defendem que tentar interferir nas instituições federais pode ser, além de autoritário, perigoso.
“Em um momento de crise sanitária, no qual as universidades brasileiras têm um papel essencial para combater a pandemia e diminuir os impactos na saúde, sociedade e economia, ele (Weintraub) não apresenta qualquer plano condizente com a conjuntura. Ao contrário, tenta retirar a autonomia das instituições, que estão atuando fortemente no combate à crise com iniciativas e projetos que impactam diversas áreas”, diz o texto.
Preocupação continua
Mesmo após anulada, a medida que exaltou ânimos dentro e fora da comunidade acadêmica ainda repercute nos meios discentes e docentes. “Isso pegou todos de surpresa e teve uma repercussão bem negativa, pois, para nós, a participação na política por meio da escolha de nossos representantes, gestores, governantes é importante”, afirma Guibson Miranda estudante de letras da Universidade de Brasília (UnB). “Ao meu ver, essa medida não é nada democrática”, analisa o membro da União da Juventude Socialista (UJS).
As MPs nº 914/2019 e nº 979/2020 se somam a uma série de outras ações do governo federal condenadas pela comunidade acadêmica. Em retrospecto, o contingenciamento de gastos, o programa Future-se e a resistência em adiar o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) estão entre outras atitudes criticadas.
Vice-presidente regional da UNE no DF, Artur Nogueira, também aluno da UnB, considera que o ministro da educação, “durante o período da epidemia, não anunciou nenhuma proposta concreta para auxiliar a educação, principalmente no que se refere aos estudantes da assistência estudantil, que foram os principais atingidos pela epidemia e continuarão sendo caso o governo federal não apresente nenhum plano emergencial para a volta às aulas”.
Professora da Faculdade de Comunicação da UnB, Rafiza Varão, lamenta que o governo tente implementar medidas que limitam a autonomia das universidades e dos institutos federais. “Como professora de uma universidade federal, vejo com tristeza a série de ataques que essas instituições vêm sofrendo, pois deveriam ser vistas como um dos mais importantes tesouros de nosso país. Devem ser lugares onde, apesar de todos os nossos problemas, estejamos em pé de igualdade com o mundo”, afirma.
*Estudante de jornalismo da Universidade de Brasília (UnB), sob supervisão da subeditora Ana Paula Lisboa
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