Bruna Sensêve
postado em 20/02/2013 10:39
Ainda este ano, será transplantada a primeira mão biônica capaz de devolver parte da sensação de tato a pessoas amputadas. O anúncio foi feito pelo pesquisador Silvestro Micera, da Escola Politécnica Federal de Lausanne, na Suíça. O experimento terá duração de um mês e, se tudo correr como planejado, um implante permanente será feito em 2015. A operação pioneira deve tornar realidade uma nova geração de próteses que, além de permitir movimentos muito semelhantes aos membros do corpo humano, fornecem ao paciente a percepção do toque. Segundo Micera, entre 30% e 50% dos amputados não usam as próteses regularmente devido à baixa funcionalidade, ao controle deficiente e à má aparência.A iniciativa dá continuidade a um projeto que vem sendo realizado há alguns anos. Em 2009, um primeiro modelo do equipamento foi testado pelo brasileiro de pais italianos Pierpaolo Petruzziello, então com 26 anos (leia Depoimento). Ele havia perdido o antebraço esquerdo em um acidente três anos antes. O dispositivo se conecta por eletrodos aos nervos do braço do paciente, que consegue controlar a mão biônica com impulsos vindos do cérebro. O grande diferencial da prótese desenvolvida por Micera é a transmissão bidirecional de estímulos por meio dos nervos ulnar e mediano localizados no braço. Assim como o cérebro envia sinais aos nervos que conseguem estimular o movimento da mão robótica, estímulos exteriores recebidos no equipamento também são transmitidos ao cérebro pelas terminações nervosas presentes na parte superior do braço.
A tecnologia permitiu que Pierpaolo sentisse picadas de agulha na mão artificial conectada ao membro amputado. O controle motor era altamente aprimorado e movimentos, como segurar uma garrafa de água, foram executados com precisão e cuidado. Na época, a mão biônica pesava cerca de 16kg e, por isso, não podia permanecer muito tempo conectada ao braço. No experimento com o brasileiro, a prótese permaneceu apoiada em uma mesa e foi ligada ao braço do participante por longos cabos.
Desde então, o modelo tem sido aprimorado. Os pesquisadores querem deixá-lo com apenas 3kg e encontrar uma forma de esconder a fiação sob a pele do paciente. Outro avanço buscado é a ampliação dos pontos sensíveis. Enquanto a versão testada por Pierpaolo só tinha duas zonas sensoriais, o novo protótipo, vai enviar sinais de todas as pontas dos dedos, da palma da mão e dos pulsos. ;A ideia é que o dispositivo possa entregar duas ou mais sensações de uma vez;, detalhou Micera, que apresentou seus objetivos no Encontro Anual da Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS, na sigla em inglês), que terminou na segunda-feira, em Boston.
Como em qualquer implante, existe o risco de rejeição pelo corpo, mas, quanto mais real a sensação, melhor deverá ser a aceitação. ;Está claro que quanto mais sensações um amputado tiver, mais provável será a plena aceitação do membro. Nós refinamos a interface, então esperamos ver um movimento de mão muito mais detalhado e controlado;, afirmou o pesquisador.
Testes permanentes
O implante a ser realizado este ano ainda não será completo. A prótese será usada por um novo voluntário durante um mês para que seja observada a reação do corpo e a manipulação pelo paciente. A previsão é que um modelo completamente funcional esteja pronto para testes permanentes dentro de dois anos. Os pesquisadores ainda precisam descobrir quanto tempo o membro pode permanecer ligado aos pacientes e se ele pode ficar conectado permanentemente ou precisa ser removido para descanso. ;Esperamos que um dia a prótese seja incorporada no braço, e o usuário se esqueça de que ela está lá;, disse Micera.
O coordenador do Laboratório de Bioengenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Marcos Pinotti, enxerga o trabalho de Micera como um grande avanço, mas que ainda precisa de estabilidade para a implantação permanente. Segundo Pinotti, a bidirecionalidade de transmissão de estímulos é importante porque, com a perda de um membro, ocorre uma mudança na rede neural do indivíduo, diretamente no sistema nervoso central. ;E quanto mais o tempo passa, mais o organismo desaprende que existia aquele membro;, explica o especialista.
Depoimento
Dor e emoção
;Fiquei 83 dias em Roma como voluntário do projeto. É muito difícil fazer esse teste da mão biônica. É muita dor, e ele demanda muito de você, por ser muito agressivo ao corpo humano. Às vezes, dava vontade de desistir, mas não fiz. Eu, como amputado, tenho esse dever de ajudar. Foi realmente emocionante, porque não acreditava que isso fosse acontecer. Sou um cidadão normal, que não entende muito de ciência, e me sinto orgulhoso por ter ajudado. Faria novamente se fosse para ajudar a ciência e as pessoas. Foi gratificante, apesar da grande dor que senti.;
Pierpaolo Petruzziello, 30 anos, brasileiro que testou o primeiro
modelo da mão biônica, em 2009