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Para desviar como os gafanhotos

Cientistas desenvolvem mecanismo anticolisão baseado no sistema nervoso dos insetos. O método poderá ser aplicado em automóveis

Roberta Machado
postado em 04/03/2013 18:00
Os sistemas de navegação usados em carros para evitar acidentes consistem basicamente de um sensor que avisa o motorista ou aciona os freios quando um obstáculo está perto. A ideia chegou às fábricas há poucos anos, mas está longe de ser original. Milhões de anos antes de os homens sequer existirem ; e, um dia, criarem os automóveis ;, os gafanhotos já contavam com um aparato anticolisão extremamente eficiente. Basta tentar capturar um deles para testemunhar a rápida reação desses insetos, que parecem prever os movimentos do predador. Cientes desse talento excepcional, um grupo de cientistas do Reino Unido estudou a visão do bicho para reproduzir a habilidade em máquinas e, no futuro, melhorar a segurança ao volante.

O processo de pesquisa e replicação do complexo sistema criado pela natureza foi descrito no International Journal of Advanced Mechatronic Systems por cientistas das universidades de Lincoln e de Newcastle. A ideia de transferir os reflexos do gafanhoto para robôs entrou em prática em 2011, mas o estudo do inseto teve início há 25 anos, o que permitiu a compreensão detalhada do funcionamento de seu sistema nervoso.

;Gafanhotos têm reações comportamentais rápidas e um sistema nervoso compacto, com muito menos células que o dos vertebrados. Então, podemos compreender seus circuitos mais facilmente;, explica Claire Rind, pesquisadora do Instituto de Neurociência da Universidade de Newcastle. O segredo do bicho está numa célula chamada detector lobular gigante de movimento, que fica localizada sob os olhos e transmite informações às células nervosas. O conhecimento desse mecanismo foi fundamental para criar o novo sistema, que mistura biologia com robótica e computação. ;As interações com os neurônios dão origem à detecção de colisão. Quando conhecidas, podem ser copiadas num código de computador ou em silício;, resume Rind.

Na etapa atual da pesquisa, o sistema é testado em um minirrobô automatizado. Uma câmera panorâmica registra o cenário à frente da máquina, e a imagem gerada é refletida numa pequena câmera, que divide a imagem em duas partes (as porções esquerda e direita do vídeo). Esses dados são enviados em tempo real para dois sistemas que imitam o detector do gafanhoto. Por meio de diferentes camadas de processamento, a visão do robô é traduzida em ordens de movimento. Se as imagens dos dois lados forem parecidas, o veículo anda em linha reta. Mas se uma mudança for detectada por uma das células artificiais, a interferência é vista como um obstáculo, resultando numa ordem imediata para que o robô vire para o outro lado. A máquina bioinspirada foi testada em pistas curvas e com obstáculos e conseguiu se mover, sozinha, sem esbarrar em nenhum objeto. Até mesmo quando foi direcionada a uma parede, ela conseguia realizar uma meia-volta bem a tempo de evitar a colisão.

Variedade


O mercado de veículos já oferece algumas opções para alertar ou até mesmo ajudar o motorista a se proteger de colisões. A mais comum delas é o sistema de ultrassom, que traduz em sons a distância entre um carro e um obstáculo, como o veículo de trás durante uma manobra de baliza. Outros dispositivos calculam o tamanho da vaga com sensores laterais e controlam o volante enquanto o condutor acelera suavemente para uma manobra perfeita. Os mais avançados ajudam a manter o carro dentro da faixa de rolagem e até mesmo freiam automaticamente se a distância entre o radar e o carro da frente ficar muito curta.

Embora ainda sejam relativamente caros ; alguns desses equipamentos chegam a custar metade do valor de um carro popular ;, os acessórios se baseiam em tecnologias relativamente simples, que foram criadas para localizar alvos parados, e não veículos em alta velocidade. ;O sistema de ultrassom foi inventado pela Polaroid. O mesmo princípio era usado antigamente para o automático em máquinas fotográficas;, comenta Guilherme Pereira, professor de engenharia elétrica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). ;O outro usa um radar, um sensor usado para detecção de navios em profundidade, bem mais sofisticado.;

Um dos sensores automobilísticos mais discutidos atualmente é o sistema infravermelho, que levou o carro do Google por diversas estradas do mundo para a produção do Street View do Google Maps. O feixe de luz emitido pelo sensor do carro faz uma varredura completa da rua, criando um mapa em três dimensões e em tempo real da rua e dos veículos próximos. O método, apontam especialistas, é muito eficiente, mas também tem suas falhas. ;Existem problemas no âmbito de pesquisa que têm de ser resolvidos. Esse tipo de sistema emite um sinal e fica esperando resposta. Em situações com múltiplos veículos com o mesmo sinal, há um problema, pois um interfere no outro;, avalia Eros Comunello, pesquisador do Instituto Nacional para Convergência Digital (INCoD).

Iluminação

Mesmo o sistema criado pelos pesquisadores do Reino Unido, ressalta Eros, teria problemas em ruas de verdade. Como ele depende da resposta visual, a segurança só seria garantida em estradas bem iluminadas. Por isso, o sistema de controle motor por estímulo visual não pretende ser um solução única para a segurança automotiva, e sim uma tecnologia que, combinada a outras, pode aperfeiçoar a navegação nas estradas e até mesmo contribuir para o desenvolvimento de um carro totalmente automatizado. ;O que temos visto atualmente são soluções híbridas. Múltiplos sensores capturando várias informações e, com base nelas, tomando decisões;, explica Eros Comunello.

O dispositivo inspirado nos gafanhotos, que ainda está em fase de testes, deve continuar em desenvolvimento até 2015. Depois de pronto, poderá ser aplicado em automóveis, em tecnologias de vigilância e até mesmo em videogames. Os cri

Gafanhotos têm reações comportamentais rápidas e um sistema nervoso compacto, com muito menos células que o dos vertebrados. Então, podemos compreender seus circuitos mais facilmente;

Claire Rind, pesquisadora do Instituto
de Neurociência da Universidade de Newcastle

Aprendendo com as baratas

Enquanto britânicos olham para os gafanhotos, norte-americanos investem em baratas para aperfeiçoar a robótica. Depois de observar a forma como esses insetos andam, os cientistas da Universidade de Michigan concluíram que os movimentos dos bichos podem ter grande valor para a mecânica. As baratas foram colocadas em plataformas por onde caminhavam normalmente até que um impulso puxava o suporte de lugar, derrubando as cobaias. Os pesquisadores compararam as atividades no sistema nervoso do inseto com a velocidade que ele levava para se recuperar do susto e viram que ele é capaz de se levantar e correr antes de os nervos alertarem do perigo, o que significa que ele reage ao susto de forma totalmente mecânica. Esse princípio pode ser aplicado em robôs para economizar energia e acelerar a resposta a obstáculos e impactos.

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