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Alimentos protegidos

Pesquisadores brasileiros desenvolvem embalagens inteligentes que aumentam o prazo de validade de um produto ou avisam quando a comida se torna imprópria para consumo

Roberta Machado
postado em 22/04/2013 11:20

Consumidora em supermercado: enquanto embalagens inteligentes não se tornam realidade, data de validade deve ser seguida à riscaPesquisas brasileiras que buscam novas formas de conservar alimentos podem mudar, em poucos anos, o jeito de comprar e guardar comida. Os estudos trabalham com o conceito de embalagens ativas e inteligentes, invólucros que podem alertar o consumidor da existência de bactérias nocivas em um produto ou até mesmo adiar o processo de decomposição de carnes e vegetais. A ideia é nova no país, onde a forma mais popular de cuidar dos alimentos ainda é guardá-los na geladeira e manter um olho na data de validade.

Um projeto de mestrado da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) se inspirou na natureza para testar um filme biodegradável que serve como indicador de qualidade da comida. Se o conteúdo começa a estragar, o invólucro cor-de-rosa muda de cor, chegando ao cinza assim que o produto se torna impróprio para o consumo. O segredo está na antocianina, mesmo pigmento presente nas frutas e que as torna escuras com o apodrecimento.

A substância já era objeto de estudo no Laboratório de Engenharia de Alimentos (LEA) da Poli-USP, quando a então aluna de mestrado Ana Maria Zetty Arenas foi convidada pela professora Carmen Tadini a colaborar com o desenvolvimento de uma embalagem inteligente. Testada com pedaços de peixe cru guardados em jarros tampados com o filme, a cobertura rosada ficou cinza e escureceu entre o segundo e o terceiro dia, quando a carne apodreceu.

A transformação ocorre quando o pH da comida aumenta, passando do ácido para o básico. A variação é um sinal de que o material está sendo consumido por bactérias, que liberam substâncias ácidas, as mesmas responsáveis pelo cheiro típico de alimento podre. ;Há uma forma de controlar a tolerância da embalagem a um nível certo de pH. Um dos grandes resultados do trabalho foi encontrar uma correlação entre o pH do peixe com parâmetros analíticos de cor;, explica Arenas. Com a ajuda de uma paleta de cores demonstrativa na embalagem, qualquer consumidor poderia descobrir se a comida ainda estaria própria para consumo.

Mandioca

A embalagem é fabricada a partir da fécula de mandioca, um material biodegradável que é decomposto em até 12 semanas, mas que continua íntegro durante o uso. ;A embalagem não apodrece, apenas a molécula de antocianina sofre mudanças estruturais com a variação do pH;, esclarece Arenas. As autoras do estudo ainda acreditam que o filme tem resistência o suficiente para proteger alimentos de origem animal tão bem quanto o celofane, e para ser usado na fabricação de sacolas inteligentes.

A novidade promete melhorar a segurança dos compradores. Hoje, a data-limite para consumo impressa nas embalagens é estipulada pelos fabricantes, que realizam testes para prever quando o alimento começa a mudar de cor, textura ou sabor, ou quando a ingestão passa a ser nociva à saúde. Mas esse prazo depende do estado de condicionamento da comida, podendo, por exemplo, aumentar se ela for congelada, ou diminuir se a embalagem tiver fissuras.

O invólucro inteligente, no entanto, ainda está em fase de pesquisas, e especialistas alertam que a data de validade continua sendo a melhor forma de se deduzir o estado dos alimentos. ;O consumidor ainda não tem outras ferramentas para julgar se a informação (validade) é verdadeira ou não. Ele tem de segui-las. Não é recomendado que se use o produto após o vencimento;, aconselha Gustavo Peres, especialista em regulação e vigilância sanitária da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Xô, bactérias!

Enquanto o projeto da Poli-USP torna visível a ação das bactérias, outra tecnologia desenvolvida no Brasil promete eliminar os micro-organismos, mantendo a qualidade de perecíveis por mais tempo. A técnica nasceu em 2005 na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) como uma forma de evitar a proliferação de bactérias em eletrodomésticos e ferramentas. Com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), ganhou o mercado e foi exportada para países como México e China.

Agora, os inventores pretendem usar o mesmo princípio para a fabricação de potes e embalagens que multipliquem a vida dos alimentos. Trata-se de um antimicrobiano orgânico à base de prata, cujo nome comercial é NanoxClean. Nanopartículas do metal são misturadas com uma matriz cerâmica, formando um pó que elimina as bactérias responsáveis pela decomposição dos alimentos. ;A prata é um bactericida conhecido milenarmente. A nanotecnologia permite que usemos menos material e, com isso, a produção fique mais barata. Ele ainda é mais eficiente em relação a outros produtos;, explica Gustavo Simões, um dos criadores do produto.

O pó de prata cria um tipo de barreira com uma carga elétrica letal aos micro-organismos que tentam passar pelos poros da vasilha. O produto foi testado em potes comuns, onde uma maçã durou um mês fora da geladeira, e um tomate teve a validade multiplicada 12 vezes. ;Depende do alimento e da embalagem. Estamos fazendo testes com várias empresas de muitos segmentos, como iogurte, alimentos refrigerados, sanduíches e legumes;, enumera Simões.

O protetor já obteve a aprovação da Anvisa e acaba de conseguir o registro da Food and Drug Administration (FDA), a agência que regula alimentos e remédios nos Estados Unidos, mas ainda não tem previsão de chegar ao mercado. O produto não muda as características do alimento, apenas elimina as bactérias que entram em contato com a embalagem. Essa é uma das exigências da Anvisa, que se baseia em uma lista de substâncias que podem ser usadas com cada tipo de material, como plástico ou metal. ;O material não pode ocasionar alterações ao produto. As embalagens não podem ceder ao produto substâncias que levem riscos à saúde;, afirma Gustavo Peres, da Anvisa.


"As embalagens não podem ceder ao produto substâncias
que levem riscos à saúde;


Gustavo Peres,
especialista da Anvisa

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