Entregue-se à preguiça. Basta um simples aceno de mão para ligar a televisão, aumentar o volume do aparelho de som ou diminuir a temperatura do ar condicionado ; e tudo sem precisar ir até o cômodo onde estão os equipamentos. Um novo sistema de reconhecimento de movimentos desenvolvido nos Estados Unidos promete tornar real o sonho de uma casa controlada por gestos, usando uma tecnologia que já está presente na maioria das residências: o wi-fi. Além de dispensar sensores sofisticados, o método, desenvolvido pela Universidade de Washington, permite o controle de equipamentos através de portas e paredes, de acordo com o alcance do sinal da internet sem fio. Assim, se você se esqueceu de desligar a luz da sala, mas já está deitado na cama, pronto para dormir, não precisa se chatear. O sistema atende seu comando mesmo com você no quarto.
Batizada de WiSee, a tecnologia usa o wi-fi como um radar, que monitora os movimentos das pessoas. Quando alguém se move, a frequência do sinal wireless sofre uma pequena mudança, quase imperceptível. Os pesquisadores norte-americanos desenvolveram um algoritmo capaz de detectar essas variações e interpretar gestos pré-programados. Segundo os autores do projeto, para que gestos a distância passem a controlar os equipamentos, basta adaptar o roteador da casa e instalar o programa de reconhecimento. Os sinais podem partir de um computador ou smartphone comuns, deixados em algum canto da casa. ;Isso redefine sinais wireless que já existem de novas formas. Você pode realmente usar o sistema sem fiopara reconhecimento de gestos sem necessidade de instalar novos sensores;, descreve Shyam Gollokota, professor de ciências da computação e um dos criadores do WiSee.
;A grande vantagem é a facilidade de instalação da tecnologia nos dispositivos móveis sem a necessidade de câmeras, como, por exemplo, em pontos de acesso e roteadores sem fio;, aponta Luiz Henrique Andrade Correia, do Grupo de Redes de Computação Ubíqua (GRUBi) na Universidade Federal de Lavras (UFLA). ;(O sistema) ainda possui maior usabilidade, já que não é necessário apontar um controle remoto para o dispositivo a ser manipulado;, ressalta o especialista.
Para Correia, a diversidade de aplicações do invento ainda é imprevisível. Mas a tecnologia parece ser mais uma solução em direção à computação ubíqua, aquela que dispensa botões ou controles. ;Somente no futuro é que teremos a real dimensão do uso desse tipo de tecnologia. Ela pode nos proporcionar uma interação com dispositivos em vários ambientes da casa e contribuir muito com a popularização de ambientes inteligentes;, aponta o professor.
Testes
O modelo foi testado por cinco usuários em um escritório e em um apartamento de dois quartos, com uma precisão de 94%. Os pesquisadores testaram nove diferentes gestos que são facilmente reconhecidos pelo sistema wi-fi, que vão desde um simples empurrão ao movimento que simula uma jogada de boliche. O usuário poderia programar as posições de sua preferência para cada aparelho e para ativar o próprio sistema. Um giro com o braço, por exemplo, acionaria o programa, e um soco seria o comando para desligar o televisor.
O gesto adicional é necessário para evitar falsos comandos. Sem essa combinação específica de movimentos, qualquer passo em falso seria o suficiente para desligar a luz ou acionar a cafeteira por acidente, o que poderia ser perigoso. Portanto, a combinação de posições não deve ser natural ; no vídeo que mostra como a tecnologia funciona, algumas das escolhas chegam a ser cômicas, com pessoas girando o braço e espalmando o ar de uma forma despojada. O movimento de acionamento pode ainda servir como um tipo de senha, que protege os eletrônicos das caminhadas do vizinho e até mesmo da ação de hackers.
Outro cuidado para evitar a confusão do roteador é instalar mais de uma antena na máquina. Cada dispositivo sintoniza os movimentos de uma pessoa, permitindo que todo mundo possa usar os comandos de movimento ao mesmo tempo sem interferências. O limite para o equipamento é de cinco antenas funcionando simultaneamente. Os pesquisadores estudam agora a possibilidade de comandar vários dispositivos de uma só vez, além da fabricação de um roteador, que já venha equipado com a tecnologia.
A invenção, contudo, está sujeita aos mesmos problemas que interferem no funcionamento de dispositivos sem fio, como a poluição do espectro em áreas com muitas outras redes. Outro problema é que ela exige algum treinamento para lidar com os gestos programados, além de ao menos uma mão livre para os comandos, o que não acontece com os comandos de voz.
Kinect
A ideia tenta simplificar uma tecnologia surgida há três anos com o sensor de movimentos Kinect, da Microsoft. Em pouco tempo, notou-se que o acessório teria grande utilidade fora dos jogos Xbox, e hoje o aparelho é usado como modelo para pesquisas de automação em todo o mundo. ;O Kinect tem um sistema altamente complexo que consegue identificar uma ou mais pessoas em um ambiente e também os seus movimentos de corpo;, explica Regina Borges de Araújo, professora do Centro de Ciências Exatas e de Tecnologia do Departamento de Computação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
;Muitas aplicações têm sido desenvolvidas por programadores, desde jogos de tênis até aplicações mais sérias, como fisioterapia para reabilitação de movimentos;, enumera a especialista. O número de usos deve crescer ainda mais a partir do fim do ano, quando a Microsoft lança o novo sensor de movimentos que vai acompanhar a última geração do console Xbox.
O aparelho foi aperfeiçoado para detectar com mais precisão a força, o equilíbrio e a profundidade do jogador, além de agora funcionar em ambientes escuros, detectar o simples girar de um pulso e até mesmo monitorar batimentos cardíacos. Mas a versão de fábrica do Kinect deve funcionar apenas como controle para televisores e videogames. O sensor da Microsof também não funciona com comandos vindos de outros cômodos, e exige que o usuário esteja posicionado em frente à câmera.
Isso redefine sinais wireless que já existem de novas formas. Você pode realmente usar o sistema sem fio para reconhecimento de gestos sem necessidade de instalar novos sensores;
Shyam Gollokota, coautor do WiSee
Somente no futuro é que teremos a real dimensão do uso desse tipo de tecnologia. Ela pode nos proporcionar uma interação com dispositivos em vários ambientes da casa e contribuir muito com a popularização de ambientes inteligentes;
Luiz Henrique Andrade Correia, pesquisador da Universidade Federal de Lavras (UFLA)