Ensino_EducacaoBasica

A cultura da guloseima

Pesquisa do IBGE mostra que 41% dos estudantes do país têm o costume de trocar comidas saudáveis por uma alimentação repleta de doces. Escolas contribuem para agravar o problema. O resultado é um elevado índice de obesidade e sobrepeso entre crianças e jovens

postado em 01/07/2013 18:00
Eduardo de Carvalho ,durante a refeição na escola: Acho que tomo refrigerante umas 15 vezes na semana.Confesso que gosto de besteiraEnquanto o avanço da obesidade infantil preocupa especialistas, a pesquisa PeNSE, elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que adolescentes de 13 a 15 anos, do 9; ano do Ensino Fundamental, não se alimentam bem. O estudo aponta que 41% dos estudantes consomem doces, balas e chocolates pelo menos cinco vezes na semana. A ingestão dessas guloseimas só perde para feijão, leite e hortaliças, à frente de frutas frescas, por exemplo. Membro do departamento de obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, Márcio Mancini diz que a quantidade de crianças e adolescentes fora do peso ideal vem crescendo no país. De acordo com o levantamento do IBGE Orçamento Familiar 2008-2009, 15% de crianças e adolescentes apresentavam obesidade ou sobrepeso em 2009. ;Em 1974, essa taxa era inferior a 5%;, destaca o estudo.

A PeNSE considerou 100 mil estudantes de 13 a 15 anos de 2.842 escolas e constatou que boa parte desse grupo também não se alimenta adequadamente na escola. Do total de adolescentes entrevistados, apenas 10,8 % tinham frutas frescas ou salada de frutas ao alcance no colégio, enquanto 39,2% deles tinham disponíveis salgados de forno. Diante da oferta, 35,1% dos estudantes comem salgados e 33,2% tomam refrigerante cinco ou mais vezes na semana.

A diretora da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), Maria Edna de Melo, considera a alimentação escolar um importante fator que contribui para o aumento da obesidade infantil que, segundo ela, tem crescido expressivamente. ;Se a gente imaginar que a criança deve ficar mais de 12 horas acordada, em um terço do dia, ela vai ficar na escola. Isso contribui decisivamente para o peso que a criança vai apresentar, principalmente porque é algo que a criança repete todos os dias;, diz.

Na casa da médica Maria Alice Reis Pacheco, a família passou por uma restruturação alimentar depois que o filho dela, Bruno, hoje com 15 anos, apresentou taxas elevadas de colesterol e triglicerídeos, ocasionadas pelo sobrepeso, aos nove anos. ;Não nos alimentávamos mal, mas procurei uma nutricionista que elaborou um cardápio. Hoje, só temos alimentos orgânicos em casa. Nada de bolachas ou refrigerante, por exemplo;, detalha.

O costume da família se refletiu nos hábitos de Bruno e da irmã Maria Carolina, 13 anos, longe dos pais. ;Na maioria das vezes, trazemos lanches para a escola, mas quando não, opto por um sanduíche natural;, conta Maria Carolina. Ela confessa que vez ou outra sucumbe aos desejos por chocolate, assim como o irmão faz com o ;enroladinho de salsicha;, mas ainda assim, mantém uma alimentação saudável. ;Tomo refrigerante uma, duas vezes na semana;, conta Bruno.

O colégio onde estudam não serve frituras nem refrigerante, mas tem guloseimas e salgados assados. A dona da cantina, Lurdinha Guilherm, conta que, embora façam um esforço para oferecer um cardápio equilibrado, sob supervisão do marido, que é nutricionista, os alunos preferem mesmo o que apetece as papilas gustativas. ;A maioria opta por salgado e refrigerentes no lugar da salada de frutas;, afirma. Eduardo de Carvalho, 14 anos, se encaixa nesse grupo de alunos. ;Acho que tomo refrigerante umas 15 vezes na semana. Meu pai conversa sobre a alimentação saudável, mas confesso que gosto de besteira;, admite.

Na avaliação de Márcio Mancini, as escolas deveriam investir em informação aos adolescentes e aos pais. ;Nas estantes das cantinas, é desproporcional a oferta de alimentos industrializados das coisas saudáveis. E, se o aluno estiver com dinheiro para comprar, ele vai pelos alimentos com mais sal, ricos em gordura, porque são mais palatáveis. Então, o certo é ensiná-los;, justifica.

Já na rede pública, o que deve ser trabalhado é a merenda. ;Nas escolas públicas, os alunos praticamente almoçam às 10h e comem macarrão, cachorro quente, comidas carregadas. A alimentação deixa a desejar do ponto de vista de equilíbrio nutricional, e as crianças acabam predispostas à obesidade;, avalia Mancini. ;Para muitas crianças, a merenda é a principal refeição do dia. Tem que ter o envolvimento de nutricionistas para dar um suporte ao que vai ser oferecido. E não adianta comprar um monte de legumes e verduras se não souber ajustar as proporções adequadas de cada alimento;, observa Maria Edna de Melo. Os especialistas defendem que na rede pública haja um empenho governamental para melhorar a alimentação, com a ajuda de nutricionistas.

IMC


A especialista da Abeso alerta para o fato de que, com adolescentes, não deve ser usado o método de Índice de Massa Corporal para avaliar se a pessoa está obesa ou com sobrepeso. O cálculo do IMC envolve uma divisão entre o peso do indivíduo pelo dobro da altura e, se der um resultado acima de 25, significa que o sujeito não está com o peso ideal. ;Nos mais novos, esse cálculo subestima o sobrepeso. Às vezes, uma criança com IMC abaixo de 25 está obesa, mas não tem como saber. É necessário jogar o valor em uma curva da Organização Mundial de Saúde.; Na página da Abeso na internet (abeso.org.br), é possível acessar a curva e descobrir a condição da criança ou do adolescente.

Alimentação infantil

Crianças e adolescentes obesos ou com sobrepeso:

  • ; Em 2009: 15%
  • ; Em 1974: 5%
  • ; Dos 100 mil estudantes de
  • 13 a 15 anos entrevistados na pesquisa PeNSE, do IBGE:
  • ; 70% - comem feijão cinco ou mais vezes na semana
  • ; 51,5% - consomem leite cinco ou mais vezes na semana
  • ; 43% - comem hortaliças cinco ou mais vezes na semana
  • ; 41% - consomem guloseimas cinco vezes
  • na semana
  • ; 35,1% - comem salgados de forno cinco ou mais vezes na semana
  • ; 33,2% - tomam refrigerante cinco ou mais vezes na semana
  • ; 30,2% - comem hortaliças cinco dias na semana
  • ; 21% - nunca comem frutas
  • ; 11% - nunca comem hortaliças

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação