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A web com regras mais claras

Para especialistas consultados pelo Correio, o marco civil da internet, em discussão na Câmara, ajudará a proteger os direitos dos usuários

Roberta Machado
postado em 10/07/2013 18:00

Centro de dados do Google: a presidente Dilma quer que informações de brasileiros sejam armazenados no país (Google/Divulgação)
Centro de dados do Google: a presidente Dilma quer que informações de brasileiros sejam armazenados no país


A denúncia de que órgãos de inteligência do governo norte-americano teriam mantido um esquema de monitoramento não autorizado da internet brasileira levantou dúvidas sobre o poder da legislação do país contra violações à privacidade na rede. A suspeita de que e-mails e dados pessoais tenham sido acessados sem autorização dos usuários colocou em pauta a discussão sobre a segurança cibernética em um âmbito civil. Uma ferramenta que poderia resguardar melhor os direitos dos internautas espera aprovação na Câmara há mais de um ano: o Projeto de Lei n; 2.126, de 2011, conhecido como marco civil da internet. Depois de ter a votação adiada seis vezes, o texto foi ressuscitado e pode finalmente se tornar realidade.

O projeto teve início em uma consulta na web, que contou com mais de 2 mil contribuições. Desde então, o texto sofreu várias modificações, sugeridas por especialistas e representantes do segmento, até resultar em uma proposta que se apoia em três pilares: liberdade de expressão, proteção da privacidade e neutralidade da rede (veja quadro). ;Infelizmente, foi necessário o vazamento de informações para todo mundo descobrir o que era o marco civil. A aprovação desse projeto tornaria ilegal uma série de práticas que estão nas denúncias divulgadas, e hoje a lei não define (medidas contra elas);, aponta o deputado Alessandro Molon (PT-RJ), relator do projeto.

O texto é considerado concluído, mas as denúncias de espionagem cibernética podem levar a mais mudanças para reforçar a segurança de dados pessoais na rede. Uma exigência apontada pela presidente Dilma Rousseff é a armazenagem obrigatória de dados brasileiros em servidores do país, o que exigiria uma adaptação física incalculável em empresas com grandes volumes de usuários, como o Google ou o Facebook. O projeto de lei voltou a passar por estudos técnicos e alguns parlamentares ainda questionam a questão da neutralidade da rede. O ponto garante aos usuários um uso democrático da internet, sem discriminação por tipo de serviço ou de pacote de dados.

Pronto
Especialistas acreditam que o marco civil está maduro para ser votado do jeito que está, sem novas determinações sobre a nacionalidade dos servidores ou mudanças no que diz respeito à neutralidade. ;Futuras condições sobre a armazenagem desses dados podem ser feitas numa regulação posterior;, defende Carlos Affonso Pereira de Souza, professor da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (leia entrevista abaixo).

Para Marcelo Branco, ativista e coordenador do projeto Software Livre Brasil, a versão atual do marco é a legislação do tipo mais moderna já proposta em qualquer país. ;A minha dúvida é que texto vai à votação. Se for um texto em que a neutralidade seja diminuída ou até ameaçada, é um problema;, afirma o especialista, que acompanha desde o início a discussão do projeto. ;Ficou revelado pelo Edward Snowden (ex-prestador de serviços da CIA que denunciou programas de espionagem dos Estados Unidos) que as operadoras contribuíram de alguma forma pelo grampeamento pela NSA (Agência Nacional de Segurança norte-america), então essas operadoras de telecomunicações perderam a legitimidade de se opor à cláusula da neutralidade;, acrescenta.

Uma legislação clara também determinaria parâmetros para as empresas de conteúdo on-line, que costumam basear suas políticas de uso nas leis dos países de origem. Os contratos de aceitação obrigatória hoje colocam o internauta em uma posição constrangedora, em que acaba fornecendo dados pessoais sem a certeza do destino das informações. Para o advogado especializado em direito digital Alexandre Atheniense, a lei brasileira tornaria qualquer cláusula contrária nula. ;Se o cidadão é brasileiro, e as informações se aplicam no Brasil, consequentemente o caso se aplica à legislação brasileira. Já existe decisão no STJ à respeito;, aponta. E a medida valeria para qualquer país em que estivessem localizados os servidores. ;Não basta dizer que a conta está nos Estados Unidos. O termo de uso só vale para cidadãos que usam (o serviço) nos EUA.;

Como fica

O marco civil da internet, ou Projeto de Lei n; 2.126 de 2011, foi colocado sob discussão pública há quatro anos. A última versão do projeto foi definida no ano passado e tem como principais pontos:

Garantia à liberdade de expressão
; O provedor de conexão à internet não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros, a não ser que desobedeça a uma ordem judicial de retirar o conteúdo infringente da rede.

Proteção da privacidade e dos dados pessoais
; O texto garante a inviolabilidade e o sigilo das comunicações pela internet, que só podem ser fornecidas mediante ordem judicial. Os registros de conexão devem ser guardados por um ano e só podem ser passados a terceiros por consentimento livre e expresso. A empresa prestadora do serviço fica obrigada a dar informações claras sobre a coleta, o uso, o tratamento e a proteção de dados pessoais dos usuários.

Garantia da neutralidade da rede
; Os pacotes de dados têm de ser tratados de forma isonômica, sem distinção de conteúdo, origem, destino ou aplicativo. Os provedores não podem bloquear, monitorar, filtrar, analisar ou fiscalizar o conteúdo dos pacotes de dados. O indivíduo também tem garantido o direito à manutenção da qualidade de conexão contratada.

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