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Debate corporativo no Conselho de Medicina

Com direito a brigas em redes sociais e corredores de hospitais, eliminação de chapa e pautas voltadas para os próprios médicos, órgão regional do Distrito Federal faz eleições para escolher representantes da entidade nos próximos cinco anos

postado em 01/08/2013 16:00

Com direito a brigas em redes sociais e corredores de hospitais, eliminação de chapa e pautas voltadas para os próprios médicos, órgão regional do Distrito Federal faz eleições para escolher representantes da entidade nos próximos cinco anos

A entidade responsável pela fiscalização do exercício profissional da categoria e pelo zelo à ética, que envolve o julgamento e aplicação de penalidades aos erros médicos cometidos, vai escolher seus integrantes. Na próxima semana, o Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF) vai eleger os 40 novos conselheiros para atuar na gestão do órgão até 2018. Mas em vez de discutirem avanços na área da saúde para a sociedade, candidatos focam o debate nas melhorias para a própria classe. Às vésperas do pleito, os ânimos dos profissionais estão acirrados a ponto de ocorrerem discussões entre os médicos em redes sociais e até em corredores dos hospitais públicos.

Duas chapas disputam o controle da mais importante instituição representativa, e não faltam denúncias de que uma delas estaria descumprindo as normas sobre a propaganda eleitoral, ao utilizar o cadastro dos médicos de outras duas entidades da categoria para enviar material de divulgação, o que é proibido pela resolução normativa 1993/2012 (leia Para saber mais).
A Chapa 1, intitulada de Aliança Médica, conta com apoio da Associação Médica Brasileira (AMB) e o Sindicato dos Médicos (Sindmédico). Seus integrantes defendem o resgate da ética e da credibilidade do CRM junto à sociedade, à mídia e população, além da melhoria salarial da categoria. ;Esperamos que essa situação seja resolvida com a implantação de um plano de cargos e salários na rede pública do DF;, afirma Lairson Rabelo, considerado o cabeça da chapa e, caso eleito, quem poderá se tornar o novo presidente da entidade. Lairson nega qualquer envolvimento político, mas, nos bastidores, o secretário de Saúde do DF, Rafael Barbosa, é apontado como um dos grandes articuladores da candidatura dele.

A Chapa 2, Pró-ética, busca desvencilhar a imagem do CRM de outras entidades e também do governo. ;Nossa parceria é com a ética e não com o governo ou outras entidades da categoria. Não abrimos mão de ser uma chapa apartidária, em que nenhum dos candidatos tem filiação a um partido político. Nosso objetivo é o resgate da ética profissional, maior atenção aos pacientes e o investimento nos jovens estudantes;, explica Martha Zapallá, principal candidata a presidência do CRM, caso o grupo seja eleito.

Sem estrangeiros

Apesar do debate entre as chapas, um assunto é unânime entre os candidatos: a não contratação de médicos estrangeiros. ;O DF não necessita de mais médicos, mas de hospitais com estrutura adequada para o desempenho de nossas atividades. Além de um piso salarial adequado ao nosso trabalho. Por conta disso, muitos profissionais abandonam as vagas da rede pública;, opina Rabelo. ;Precisamos de mais investimento na carreira. Nada de promessas milagrosas: temos noção das dificuldades da nossa área. Não vamos mudar o sistema de saúde, mas desejamos mudanças no perfil dos profissionais;, diz Zapallá.
Os 11 mil médicos inscritos no CRM devem votar nas próximas terça e quarta-feira, pois a eleição tem caráter obrigatório. As urnas estarão na sede do Conselho Federal de Medicina (CFM), na 915 Sul. A escolha pelo local de votação veio depois que o processo eleitoral sofreu intervenção. Pelo menos três conselheiros federais nomeados pelo CFM devem acompanhar o pleito. Isso ocorreu após o atual presidente do CRM, Iran Augusto Cardoso, ser alvo de denúncias por elaborar uma nova norma para o próprio CRM, a fim de criar brechas para a reeleição. Ele recebeu uma punição ética em 2010 (leia Memória). De acordo com a resolução 1993/2012, candidatos considerados ;fichas sujas; não podem concorrer.

Exclusão

Na última segunda-feira, o CFM excluiu a Chapa 2, chamada da Chapa do Médico, cujo principal candidato era Iran Cardoso. A decisão final não cabe mais recurso no órgão administrativo e, de acordo com advogados do Conselho Federal, não haverá tempo hábil para que os candidatos da chapa recorram no judiciário. Procurado pela reportagem, o profissional não quis comentar a decisão.

Perfis dos cabeças de chapa

Martha Zapalá,
52 anos

 (Chapa 2/Divulgação)

Pediatra, especialista em terapia intensiva pediátrica. Atuava no Hospital de Base e hoje é servidora aposentada da Secretaria de Saúde do DF (SES-DF). É considerada a principal candidata da Chapa 3, intitulada Pró-Ética. Caso vença a eleição, poderá se tornar presidente do CRM.


Lairson Rabelo,
69 anos
 (Iano Andrade/CB/D.A Press - 13/9/11)

Cardiologista. É servidor aposentado da SES-DF e do Ministério da Saúde. É vice-presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), região centro-oeste. É o principal nome da Chapa 1, chamada de Aliança Médica, se eleito vai ocupar o posto de presidente do Conselho.

Memória

Fevereiro de 2002

Renata Vieira Gonçalves Lopes foi vítima de um erro médico e, desde então, vive em estado vegetativo. A jovem tinha 32 anos e fazia tratamento para engravidar. Teve uma parada cardíaca depois de realizar um exame de videolaparoscopia em uma clínica de fertilização artificial. O médico saiu da sala de cirurgia antes de a paciente acordar, ela ficou 15 minutos sem socorro. O caso de Renata é o mais emblemático exemplo de erro médico no DF. O médico Joaquim Roberto Costa Lopes foi absolvido pelo CRM-DF.

Agosto de 2003

O menino Emmanuel Lopes Pereira, 12 anos, faleceu intoxicado pelo uso de medicamento homeopático utilizado para auxiliar no tratamento para crescimento. O remédio foi receitado por Iran Augusto Gonçalves Cardoso, à época, vice-presidente do Conselho Regional de Medicina do DF. O CRM aplicou censura pública ao profissional, em março de 2010, por infringir cinco artigos do Código de Ética Médica. Foi duramente criticado pelos colegas por receitar a clonidina, já que não havia nada na literatura médica que comprovasse sua utilização.

Janeiro de 2010
A jornalista Lanusse Martins Barbosa, 27 anos, perdeu a vida durante cirurgia de lipoaspiração no Centro Clínico Pacini, na Asa Sul. Investigações policiais concluíram que houve erro do médico Haeckel Cabral Moraes, denunciado por homicídio qualificado. A autópsia revelou perfuração da veia renal direita da paciente. O CRM não deu informações sobre o caso.

Fevereiro de 2012
O estudante Marcelo Dino, 13 anos, sofreu uma crise de asma na escola, enquanto praticava exercícios físicos. A família do jovem o encaminhou ao Hospital Santa Lúcia, na Asa Sul, por volta das 12h. Às 6h do dia seguinte, o garoto teve uma nova complicação respiratória, e os médicos aplicaram broncodilatadores. Marcelo morreu às 7h. Uma médica e uma técnica de enfermagem foram indiciadas por homicídio culposo. O caso foi arquivado.

Janeiro de 2013

A menina Rafaela Luiza Formiga Morais, de 1 ano e 7 meses, deu entrada no Hospital Materno Infantil de Brasília, com manchas vermelhas pelo corpo. Segundo Jane Formiga, mãe da criança, Rafaela estava com urticária e o quadro não era grave. Rafaela passou mal cinco minutos após receber 3,5 mil de adrenalina, recomendado pela pediatra Fernanda Sousa Cardoso, filha de Iran Cardoso. Foi transferida para o Hospital de Santa Maria, mas morreu após cinco paradas cardíacas. O caso segue sob análise do CRM e a médica continua na Secretaria de Saúde.

Para saber mais

Norma federal

O mandato dos membros dos Conselhos Regionais de Medicina (CRM) tem duração de cinco anos. As eleições devem ser realizadas por voto direto e secreto, sendo obrigatório para o médico que esteja em pleno gozo de seus direitos políticos e profissionais, e inscrito no CRM. Aquele que não votar será obrigado a pagar multa, fixada pelo órgão competente. O voto é facultativo para os profissionais que têm mais de 70 anos. Só podem concorrer ao pleito os médicos com ficha limpa, ou seja, que não tenha condenação transitada em julgado em processos ético-profissionais no Conselho de Medicina ou ordem profissional que tiver inscrito. A norma proíbe a propaganda eleitoral, com uso de alto-falantes ou amplificadores, próximo a escolas e hospitais públicos. É vedada também a campanha distribuição de brindes, tais como bonés e camisetas, para os eleitores, assim como a divulgação de mensagens eletrônicas por meio do cadastro de endereços eletrônicos de pessoa jurídica, que inclui entidades, associações e sindicatos.

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