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O apelo eleitoral do Mais Médicos

Especialistas acreditam que o programa do governo tem potencial para se transformar em uma espécie de Bolsa Família no quesito popularidade e, consequentemente, angariar votos em 2014

postado em 26/08/2013 08:00
Cubanos no aeroporto de Brasília: 206 médicos do país caribenho desembarcaram no Brasil ontem. Curso de adaptação começa amanhãO Programa Mais Médicos, a grande aposta da presidente Dilma Rousseff para imprimir uma marca à gestão e recuperar a popularidade perdida nos últimos meses, estará no centro do debate eleitoral durante a campanha presidencial em 2014. Cientistas políticos ouvidos pelo Correio apontam que a iniciativa ; com previsão de investimento de R$ 26 bilhões até 2026 ; pode ter o mesmo efeito eleitoral do Bolsa Família, programa de transferência de renda turbinado no governo Lula, se as barreiras jurídicas que ameaçam o andamento do plano forem derrubadas. A capilaridade do Mais Médicos, que englobará 3.511 municípios de todas as regiões do país, é apontada como o principal combustível para alavancar votos.

Por enquanto, os presidenciáveis Marina Silva (sem partido) e Eduardo Campos (PSB-PE) adotaram uma postura de cautela em relação ao tema. A avaliação é de que críticas, neste momento, podem não ser compreendidas pela população que sofre com a falta de médicos no país. O Correio tentou ouvir a opinião dos pré-candidatos, mas nenhum deles foi localizado pelas respectivas assessorias para falar sobre o assunto. Já o senador Aécio Neves (PSDB-MG) criticou ontem a contratação de médicos estrangeiros. Segundo ele, a importação ;é tapar o sol com a peneira;. ;Temos um governo paliativo, que promove soluções midiáticas. Não tenho preconceito quanto à origem dos médicos, o que me causa estranheza é remunerar um governo autoritário (Cuba) e não saber quanto recebem os médicos;, disse.

Cientista político e professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), Celso Melo classifica como uma ;grande coincidência; o fato de o Programa Mais Médicos ter sido lançado recentemente. ;Olha o momento: depois das grandes manifestações nas quais o tema da saúde apareceu fortemente, às vésperas das eleições de 2014 e com um ministro da Saúde potencialmente candidato ao estado de São Paulo. É muita coincidência;, destaca Melo.

Segundo ele, o programa em questão carrega um componente eleitoreiro forte não somente devido ao momento em que é lançado, mas também por centrar em um aspecto de muito apelo para a população carente: a presença de um médico. ;Não importa se vai continuar não tendo laboratório, máquina de exames, sala de cirurgia. O indivíduo vai ver que há um médico. Isso tem um forte impacto, e o governo sabe disso. É mais fácil que investir em saneamento, infraestrutura, segurança e educação, aspectos intimamente ligados com a saúde;, avalia Melo.

Já o cientista político e historiador Francisco Fonseca, professor da Fundação Getulio Vargas em São Paulo, observa o uso político do programa também por parte de quem o ataca. ;A classe médica tem sido motivada por interesses corporativistas e setores da oposição como forma de desqualificar o governo. Só que há dados sistemáticos mostrando a carência desses profissionais nos rincões do país, de forma que, se o programa for bem-sucedido, ficará difícil argumentar contra;, analisa Fonseca.

Para a população-alvo do programa, destaca o especialista, pouco importa se o governo usará de forma eleitoreira o programa. ;O sujeito que vive no interior, onde, de fato, não há médicos, vai se beneficiar da assistência. Então, é claro que (o programa) poderá resultar em votos, pois os governos são avaliados pelo que fazem e pelo que não fazem;, diz Fonseca. O cientista político e professor da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer avalia que há um risco eleitoral para quem critica o Mais Médicos. ;As associações de médicos, por exemplo, não correm esse risco. Elas não precisam de votos. É claro que o programa pode ser uma marca forte do governo. No próximo horário gratuito do PT, acredito que eles já vão falar sobre o assunto.;

Segurança jurídica
O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, falou ontem sobre os entraves judiciais do programa. ;Temos muita segurança jurídica do que nós estamos fazendo. Acho que quem tem críticas ao programa, pode fazer sugestões para o aprimorar, mas não venham ameaçar a saúde da nossa população, que não tem médico.; A declaração foi feita no Posto de Saúde n; 1 da Estrutural, durante o lançamento do Dia D de mobilização para a vacinação infantil (leia mais na página 24).

Padilha ainda assegurou que o foco do programa é exclusivamente o atendimento à população sem acesso a esse tipo de serviço. ;Nós sabemos que estamos tendo uma atitude corajosa e que precisava ser feita;, afirmou, negando qualquer caráter eleitoreiro ao programa. ;Faremos aquilo que outros países do mundo já fazem há muito tempo, que é trazer médicos estrangeiros quando não se tem número suficiente de brasileiros para atender a população;, acrescentou.

Nos últimos dias, começaram a desembarcar médicos para os 701 municípios sem atendimento profissional em todo o país. A maioria vem de Cuba e deve atender as cidades do interior do Brasil, principalmente na Região Norte.

;O sujeito que vive no interior, onde, de fato, não há médicos, vai se beneficiar da assistência. Então, é claro que (o programa) poderá resultar em votos, pois os governos são avaliados pelo que fazem e pelo que não fazem;

Francisco Fonseca, professor da Fundação Getulio Vargas

Radiografia
15.460
Número de médicos que o governo brasileiro tentará importar

3.511
Quantidade de cidades previstas para serem atendidas

63%
Proporção dos municípios brasileiros que devem receber médicos estrangeiros

1.740
Número de profissionais que começarão a trabalhar em setembro

516
Quantidade de municípios que receberão os primeiros profissionais

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