Roberta Machado
postado em 14/07/2014 14:00
;Coloque um pouco de café em uma xícara. Adicione o sorvete que preferir. Finalmente, adicione xarope de framboesa à mistura.; Um homem dita as instruções de preparação de um affogato para um grande robô, que as ouve atentamente e depois se dedica a misturar os ingredientes com suas mãos de garra. Em menos de um minuto, está pronta a sobremesa feita pelo cozinheiro mecânico de primeira viagem. A receita pode parecer simples para qualquer criança que já esteve em uma cozinha, mas é um desafio para os seres de cérebro eletrônico: poucas são as máquinas que podem interpretar ordens novas, recebidas por qualquer outra forma que não a linguagem computacional.
O robô que prepara sobremesas foi desenvolvido por uma equipe de cientistas da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos. A experiência com o affogato é uma demonstração das tarefas escolhidas pelos pesquisadores para testar a capacidade de Tell me Dave, como é chamado o robô, para compreender instruções verbais. A intenção é ensinar o dispositivo a seguir ordens sem tropeçar em palavras ambíguas ou na falta de informações que são óbvias para um humano, como os diferentes formatos que uma xícara pode ter ou a necessidade de apanhar o sorvete com o auxílio de uma colher. Além do doce italiano, macarrão instantâneo e chá adoçado também fazem parte do cardápio que a máquina sabe preparar.
Um software criado pelos cientistas traduz frases humanas para a linguagem do robô, que antes foi treinado para compreender o que é cada objeto e para quê eles servem. Dessa forma, não seria necessário dar instruções detalhadas como ;coloque a água na panela à sua frente, ligue o fogo do fogão e coloque a panela sobre a chama;. Bastaria dizer ;esquente a água;, e a máquina seria capaz de interpretar a ordem e encontrar a melhor forma de cumpri-la. O dispositivo também é equipado com uma câmera tridimensional, que identifica os utensílios com a ajuda de um programa de visão computacional.
;Começamos coletando um conjunto de dados de descrições de tarefas na forma da linguagem natural e os registros correspondentes das tarefas realizadas em um simulador on-line do robô. Então, montamos uma biblioteca que representa as possíveis instruções para cada verbo naquele ambiente;, explica o trabalho que descreve a pesquisa. ;Nosso modelo também lida com instruções de linguagem natural incompletas ou confusas;, ressalta o artigo.
Instrutores
Tell me Dave fica mais hábil conforme recebe novos ensinamentos. As ;aulas; são transmitidas por meio de simulações geradas por pessoas que cumprem no computador as mesmas tarefas que serão pedidas à máquina. A observação virtual ajuda o robô a compreender diferentes palavras e a evitar erros tolos. A máquina cozinheira foi colocada à prova em diferentes ambientes e, seguindo ordens que variavam na forma e até mesmo omitiam alguns passos da receita, obteve taxa de sucesso de 64%.
Se, em uma sala de aula, um professor dá conta de dezenas de alunos, no aprendizado robótico a situação é bem diferente, e podem ser necessárias até centenas de instrutores para uma só máquina. A cada demonstração, o sistema é capaz de preencher lacunas de lógica para evitar erros na execução do trabalho. E, quanto mais variada for a coleção de referências, mais facilidade a máquina vai ter para cumprir uma tarefa. O problema é que gerar essa grande quantidade de dados pode ser complicado quando o investimento necessário é o tempo de pessoas de verdade.
Pesquisadores da Universidade de Washington recorreram à internet para convocar esse exército de professores necessário para ensinar um outro robô a reconhecer e reproduzir formas. Por meio de um site, os cientistas pediram que voluntários de carne e osso enviassem desenhos simples de formas como um carro, uma casa ou um tartaruga. ;Ensinar requer inteligência humana de verdade, e isso é algo que não podemos programar um computador para automatizar. Então, a questão era como poderíamos fornecer uma grande quantidade de dados humanos em um robô sem ter humanos gastando horas nisso;, conta Maxwell Forbes, pesquisador da Universidade de Washington e participante do estudo.
As centenas de designs foram mostradas à máquina, que foi então incumbida de criar os mesmos ícones com a ajuda de blocos de montar. Graças às referências, o robô sabia que tipo de desenho era reconhecido por humanos como um pássaro, por exemplo. As diversas combinações também possibilitaram o construtor mecânico a escolher que formas achava mais fáceis de reproduzir.
Os pesquisadores acreditam que, no futuro, as máquinas possam usar dinâmicas similares para aprender a colocar mesas ou encontrar objetos. ;Podemos programar robôs para fazer um número impressionante de coisas. Mas e se você quiser que ele faça algo novo? Ou mudar a forma como eles fizeram determinada tarefa superficialmente? Você precisa de alguém que saiba como programar o robô, e ele precisa criar e testar novas funções. Se você tiver um robô programado para aprender, você permite que pessoas que não são programadores modifiquem o comportamento da máquina e ensine novas coisas a ela. Você também permite que os robôs mudem e se adaptem ao longo do tempo;, acredita Forbes.
Demonstração
Um pesquisador da Universidade da Califórnia em Berkeley também está interessado em ensinar robôs a adquirirem habilidades úteis no dia a dia das pessoas. A máquina programada por Pieter Abbeel cuidadosamente examina várias meias deixadas sobre uma mesa, vira as peças do avesso e junta os pares, deixando-os prontos para serem levados à gaveta. Em outro cenário, o dispositivo habilidoso pega toalhas de diferentes tamanhos e as dobra em uma bela pilha sobre o balcão. Mas ensinar o robô a cumprir essa simples tarefa levou mais de dois anos de muito trabalho e de programação ; um cenário longe do ideal para o aprendizado robótico.
Para resolver esse problema, o cientista deixou de lado os afazeres domésticos e escolheu um voluntário pouco convencional: um helicóptero. O equipamento voador é instável e precisa lidar com complicadas dinâmicas, como o vento ou a orientação para realizar uma manobra. Esse cenário caótico seria o ideal para testar a capacidade de um sistema reproduzir ordens em situações variadas. ;É difícil especificar a trajetória que o helicóptero vai seguir. É necessário muito controle para se manter no caminho;, ressalta Abbeel.
A equipe do programador colocou o piloto para repetir a manobra várias vezes com o brinquedo, enquanto o objeto levava um sensor. O feito sempre tinha algumas variações, gerando um banco de dados com referências que poderiam ser usadas pelo robô. A partir de um algoritmo, o sistema estima o custo de cada uma das sequências estudadas e cria um novo modelo para cumprir a tarefa. A técnica de aprendizagem desenvolvida pelos pesquisadores também foi usada para ensinar máquinas a andar por terrenos acidentados e está sendo testada para que equipamentos cirúrgicos se aprimorem a partir do trabalho de médicos de verdade.
;Se você tiver um robô programado para aprender, você permite que pessoas que não são programadores modifiquem o comportamento da máquina e ensinem novas coisas a ela;
Maxwell Forbes, pesquisador da Universidade de Washington