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Dilema ético no combate ao ebola

OMS cogita usar em larga escala remédio experimental aplicado em médico e enfermeira dos EUA infectados na Libéria. Antes disso, a droga só havia sido testada em animais

postado em 07/08/2014 10:12
Na Libéria, mulheres rezam pelo fim da epidemia: o país africano concentra a maioria dos casos de infecção e morte  (Zoom Dosso/AFP)
Na Libéria, mulheres rezam pelo fim da epidemia: o país africano concentra a maioria dos casos de infecção e morte


O rápido avanço do ebola no continente africano trouxe um impasse à Organização Mundial da Saúde (OMS). A agência ligada à ONU considera usar em larga escala a droga ZMapp, utilizada para tratar um médico e uma enfermeira norte-americanos infectados pelo vírus na Libéria. A droga, porém, é experimental. Até então, a empresa Mapp Biopharmaceutical só havia feito testes com animais. Faltam os experimentos clínicos que atestem a segurança e a eficácia da substância em humanos.

;Estamos em uma situação incomum diante deste surto. Temos uma doença de alto índice de letalidade, sem nenhum medicamento ou vacina para combatê-la. Precisamos perguntar aos especialistas em ética médica o que é a coisa mais responsável a fazer;, disse, em nota, a diretora adjunta da OMS, Marie-Paule Kieny. A entidade iniciou ontem uma reunião de dois dias para decidir se a epidemia representa uma ;emergência de saúde pública de alcance mundial;, o que poderia levar a medidas em escala internacional.

A hipótese de usar a droga experimental foi levantada em um momento de críticas à postura dos EUA. Especialistas em doenças infecciosas indagam por que a substância com efeito ;milagroso;, segundo a emissora norte-americana CNN, não pode ser oferecida às vítimas africanas.

O presidente Barack Obama disse ontem ser prematuro usar o medicamento para tratar infectados na África. ;Acredito que devemos deixar que a ciência nos guie e não creio que tenhamos todas as informações para determinar se esse remédio é eficaz.;

A OMS também foi alvo de questionamentos. Na última terça-feira, três dos maiores especialistas em ebola do mundo ; Peter Piot, que descobriu a doença em 1976, David Heymann e Jeremy Farrar ; disseram ser necessária uma resposta mais forte da agência da ONU, ;a única instância com autoridade internacional; para permitir o uso de tratamentos experimentais. ;Os governos africanos devem ser autorizados a tomar decisões sobre se devem ou não usar esses produtos para, por exemplo, proteger e tratar trabalhadores de saúde que atuam diante de um alto risco de infecção;, escreveram em um comunicado.

De acordo com a rede NBC, um dos agentes da droga é o MB-003. Trata-se, segundo documento da Mapp, de um coquetel de anticorpos. Ainda conforme o relatório, dos animais tratados, incluindo primatas não humanos, 43% sobreviveram após a intervenção. Diretor do Instituto Americano de Alergias e Doenças Infecciosas, Anthony Fauci vê com ressalvas o uso da substância em larga escala, pois o soro demonstrou ;certa eficiência apenas em dois pacientes.; O especialista também ressaltou que pode haver uma ;enorme dificuldade; em produzir uma quantidade significativa de doses.

Precaução

Independentemente da recomendação a ser adotada pela OMS, grandes centros, como Reino Unido e França, preparam espaços para um possível atendimento a cidadãos infectados. A Arábia Saudita anunciou, ontem, a morte de uma pessoa com sintomas de ebola em um hospital de Jidá. A Espanha deve receber hoje o sacerdote Miguel Pajares, infectado pelo vírus na Libéria, e a religiosa Juliana Bohi. Mesmo não tendo apresentado os sintomas da doença, Bohi teve contato com o sacerdote. O transporte deles da capital de Libéria, Monróvia, estava previsto para a meia-noite de ontem.

Novo relatório da OMS indica que, entre 2 e 4 de agosto, 108 novos casos de ebola foram confirmados na África Ocidental. Nesses dois dias, 45 pessoas morreram, subindo o número de óbitos para 932. Os casos suspeitos, prováveis ou confirmados da doença somam 1.711 em quatro países: Guiné, Libéria, Serra Leoa e Nigéria.

A Libéria é a nação mais atingida. De 2 a 4 de agosto, contabilizou 45 casos e 13 mortes. Em meio à epidemia, mulheres do movimento liberiano pela paz se reuniram ontem, perto da residência do presidente Ellen Johnson Sirleaf, para rezar pelo fim dos contágios no país. O grupo foi criado pela Nobel da paz Leymah Roberta Gbowe, ativista que ajudou a pôr fim à segunda guerra civil da Libéria em 2003.


932
Total de mortes em decorrência do novo surto de ebola na
África Ocidental, segundo a Organização Mundial da Saúde

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