Recado
"Não gosto de escrever. Gosto de ter escrito."
Armando Nogueira
Festa do livro e da leitura
A Bienal de Brasília está a toda. Celebridades nacionais e estrangeiras viraram gente de casa. Não só romancistas e poetas, mas músicos, palhaços e contadores de histórias enchem auditórios e fazem a festa. O verbo ler, claro, entrou em cartaz. Gente grande e gente pequena o conjugam com desenvoltura.
Mas, na hora de escrever, pinta a dúvida. O responsável pelo nó nos miolos é o presente do indicativo. A questão: a reforma ortográfica alterou a grafia de pessoas do verbinho sabido? A resposta: alterou. A 3; do plural do presente do indicativo perdeu o acento. Ficou assim: eu leio, ele lê, nós lemos, eles leem.
Companhia
Sem o chapéu, ler ficou mais leve. Outros verbos lhe fizeram companhia. É o caso de ver, crer e dar. O quarteto joga no mesmo time. Quanto aparece o hiato eem, o acento não tem vez. Xô! Assim: eu vejo, ele vê, nós vemos, eles veem; eu creio ele crê, nós cremos, eles creem; que eu dê, ele dê, nós demos, eles deem.
Filhotes
Os derivados não têm alternativa. Seguem os paizões sem pestanejar: eles reveem, preveem, releem, descreem.
Sem confusão
Atenção, marinheiros de poucas viagens. Parecido não é igual. Mas confunde. O tumulto tem tudo a ver com a semelhança. São todos verbos pequeninos, com uma só sílaba. Mas eles se dividem em dois grupos. O primeiro tem quatro membros (ler, ver, crer e dar). O segundo, dois (ter e vir).
O primeiro está no papo e na ponta da língua. A 3; pessoa do plural termina com o hiato -eem (eles veem, creem, leem, deem). O segundo dispensa a dose dupla. Tem só um e. Mas mantém o chapeuzinho: eu tenho, ele tem, nós temos, eles têm; eu venho, ele vem, nós vimos, eles vêm.
Ler e ler
;Os homens não sabem ler. Aplicam a um poema o mesmo processo que aplicam a anúncios de jornal ou a notícias de propaganda política: contentam-se com o sentido superficial das palavras, sem explorar a intenção de quem fala. Confundem duas coisas que estão juntas em cada palavra falada ou escrita: a expressão e a intenção.; (Otto Maria Carpeaux)
Leitor pergunta
Sei que a coluna já tratou do assunto. Mas a dúvida assaltou meus filhos. Tentei bancar o professor. Não deu. Pode repetir a história do porquê dos porquês?
Camélia Araújo, Araxá
Leitor manda. Não pede. A dúvida da moçada é de jornalistas, advogados & cia. Não há quem não hesite na hora de escrever uma forma ou outra. Muitos chutam. Mas, como a língua não é loteria, a Lei de Murphy entra em vigor. O que pode dar errado dá. Melhor não correr riscos. Eis as manhas da caprichosa criatura. Use:
Por que
1. nas perguntas: Por que os professores estimulam a leitura? Por que a evasão escolar é alta no Brasil?
2. nos enunciados em que é substituível por ;a razão pela qual;: É bom saber por que (a razão pela qual) os professores estimulam a leitura. Explique por que (a razão pela qual) a evasão escolar é alta no Brasil.
Por quê
A dupla com chapéu só tem vez quando o quezinho for a última ; a última mesmo ; palavra da frase. Por quê? Ele é átono. No fim do enunciado, torna-se tônico. O acento lhe dá a força: Os professores estimulam a leitura por quê? A evasão escolar continua alta, mas poucos sabem por quê. Que tal descobrir por quê?
Porque
Com essa cara, juntinho, sem lenço nem documento, porque é conjunção causal ou explicativa: Os professores estimulam a leitura porque bons textos enriquecem o vocabulário. A evasão escolar é alta porque muitas crianças trabalham em vez de ir à aula.
Porquê
Assim, coladinho e com chapéu, o porquê torna-se substantivo. Para mudar de classe, precisa da companhia do artigo ou de pronome: Explicou o porquê da evasão escolar. Certos porquês quebram a cabeça da gente. Esse porquê se inspira em outro porquê.
Resumo da ópera: não há por que temer os porquês. Quem entendeu a lição sabe por quê.