O reitor da Universidade de Brasília (UnB), José Geraldo Sousa Junior, entregará o cargo ao novo gestor em novembro. Depois de dois dias de consulta entre a comunidade acadêmica, o nome de quem vai ocupar o cargo máximo nos próximos quatro anos será conhecido hoje. Em entrevista ao Correio, José Geraldo fez um balanço do período em que esteve à frente da instituição, falou do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidade Federais (Reuni), tratou de temas polêmicos como o deficit e a segurança, além de apontar quais os principais desafios do próximo reitor.
José Geraldo disse que se propôs a realizar um mandato de transição ao assumir a reitoria. ;A universidade viveu uma crise em 2008 e, desde o início, atendi a um chamado, queria virar a página e colocar a universidade na linha;, analisa. Ele destacou a implantação de uma gestão participativa, apoiada nas decisões dos conselhos da UnB e pediu ao novo gestor que mantenha essa postura. ;O reitor ou reitora tem o desafio de consolidar o resultado da transição, o resgate da decisão colegiada, além de consolidar a expansão;, completou.
Entrevista José Geraldo de Souza Junior
Qual balanço da sua gestão?
Primeiramente, foi o apaziguamento da universidade, era uma característica do mandato levando em conta as condições de sua instalação. A instituição vivenciou uma crise.Do ponto de vista da gestão, houve uma nova perspectiva de poder integrar a universidade e recuperar um protagonismo interno que normalizasse o cotidiano. Esse foi o principal elemento político que se traduziu em mecanismos de natureza participativa e dialogada, notadamente com a revitalização deliberativa e republicana nos colegiados. Entre 1997 e 2008, o Conselho Universitário se reuniu 82 vezes.Na minha gestão, até setembro, foram46. Fortalecemos as grandes decisões tomadas nesse período, que vão desde a redefinição do marco regulatório das fundações ao debate sobre a paridade. Esse balanço de natureza política é relevante para uma administração que tentava tirar a UnB da crise. A outra atividade é de natureza gestora, caracterizada por lidar com uma universidade que atingiu o máximo da complexidade no período. A implantação dos novos câmpus, a duplicação do número de matrículas e de alunos da graduação, a ampliação da pós-graduação;passamos de 118 para 146 cursos ;, criamos 36 outras graduações e um programa de fortalecimento da infraestrutura. São 28% a mais de área edificada em relação ao que encontrei.
Como avalia a posição da UnB nos rankings de classificação das universidades?
Esse é outro elemento importante: o fortalecimento da dimensão acadêmica da instituição. Nesse período, pudemos pensar a dimensão do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), não só a expansão, que é de infraestrutura, mas a reestruturação acadêmica e, com isso, fazer a revisão do projeto político pedagógico. Isso representa fortalecer a base acadêmica epistemológica da universidade para os desafios do desenvolvimento científico, cultural e tecnológico. Trata-se de planejar a área de expansão do nosso parque tecnológico que está em curso e, ao mesmo tempo, qualificar o processo nas áreas de ensino, de pesquisa e de extensão.De umlado, temos a percepção nítida da criação de novos modos de classificação de universidade. O novo ranking da Folha de S.Paulo nos deixou numa posição excelente do ponto de vista de indicadores. Tivemos o oitavo lugar geral e o quinto entre as federais. O progresso é constante, contínuo e ascendente. Claro que, emcada um deles, vamos perceber variações. E esse desenvolvimento é confirmado pelo nível de aquisição que a universidade passou a ter nesses quatro anos em relação ao sistema de fomento nacional e internacional. A nossa participação nos editais externos das grandes agências bateu marcas históricas.
A UnB cumpriu as metas do Reuni?
Essa é outra dimensão que caracteriza o mandato. Nossas metas estabelecidas foram plenamente alcançadas e, em contrapartida, tivemos financiamentos. Foram criados 36 cursos, desenvolvemos os novos programas dos
câmpus. Passamos de 4 mil para 8mil vagas oferecidas e, incluindo a educação a distância, temos hoje 35 mil alunos. Não há uma obra parada, algumas estão para ser iniciadas, em fase de projeto ou licitação. Até omomento, em termos de Reuni, gastamos R$ 66 milhões em obras. A Casa do Estudante (CEU) nunca havia sido objeto de intervenção. Temos mais R$ 30 milhões para outros serviços. Além de contratarmos mais mil professores;depois de décadas de estagnação sem investimentos nessa área;e de quase 600 servidores altamente qualificados.
As medidas adotadas na sua gestão para melhorar a segurança levarammais tranquilidade à comunidade acadêmica?
Mudamos toda a iluminação do câmpus sob o fundamento de que esse é umitem de segurança, de conforto para o trabalho. Implantamos um sistema de vigilância eletrônica. Os dados do Centro de Proteção ao Patrimônio indicam que, em2007, houve 603 ocorrências; em 2008, 584; em 2009, 256; em 2010, 184 e, em 2011, 176. Paradoxalmente, há uma expansão em número de pessoas e da circulação da comunidade. Tomamos medidas de conscientização, definimos estratégias e mapeamos as trilhas para criar áreas de maior intensidade de fluxo. Há estudos, políticas, programas, investimentos e medidas que estão sendo adotadas. Algumas são difíceis por se oporem à cultura acadêmica. É complicado, por exemplo, colocar catracas ou fechar espaços na medida em que a universidade é vista como um espaço libertário e livre.
Quais são os principais problemas da universidade?
A UnB foi um espaço preservado para a elite social, e a elite intelectual não tinha acesso. A instituição precisa lidar com isso e não pode ser reservada a uma aristocracia social. Ainda hoje, por exemplo, os números são gritante se compararmos a comunidade de 35 mil alunos, na qual apenas 2 mil estão no programa de assistência estudantil. A universidade continua branca e de classe média alta. É preciso se adaptar ao desafio atual de ser lugar de excelência para a elite intelectual da cidade, do país. Num país que dá saltos de desenvolvimento, a academia será ampliada. Precisa se adequar a isso tecnologicamente e pedagogicamente. Hoje, já não é lugar exclusivo da produção de conhecimento, mas é espaço exclusivo da possibilidade de integração e circulação dos modos de conhecer.
Que desafios terá o (a) novo (a) reitor(a)?
Desde o início atendi a umchamado, queria virar a página e colocar a UnB na linha. Tenho convicção de que a reeleição não é adequada para o sistema universitário porque provoca duas alienações: burocratismo e deslumbramento. Apaziguada a instituição, revista nos seus diagnósticos, renovada na infraestrutura, o principal desafio, hoje, é manter essa dimensão dialogada, da construção negociada, mediada e dialogada dos processos diretivos. Mas o novo reitor ou reitora terá de consolidar o resgate da decisão colegiada, deliberativa, participativa e compartilhada da gestão. Também será necessário assumir a infraestrutura expandida e consolidá-la, além de manter o nível de gestão, sobretudo com os órgãos governamentais. Quem vai vigiar, dar mobilidade, fazer a manutenção de tudo isso, ajustar a condição de financiamento? Considero que estamos subfinanciados. É preciso remontar estratégias de manutenção desse sistema. Construímos, fizemos reformas, mas ainda temos uma universidade antiga, que precisa ser refeita. E um desafio extraordinário que se coloca para o reitor ou a reitora é o de não perder o diálogo com a sociedade. A UnB é autônoma, mas não é uma autarquia, no sentido semântico, que se isole, autossuficiente e autista em relação ao que se dá no entorno do ambiente que atua.