Trabalho e Formacao

Cotas abrem polêmica

Projeto que reserva 20% das vagas de concursos do Executivo para negros divide opiniões, inclusive entre os servidores

postado em 07/11/2013 14:00
O projeto de lei anunciado pela presidente Dilma Rousseff, que prevê reserva de 20% das vagas de concursos públicos para negros, ressuscitou o debate sobre o sistema de cotas. Se, para parte dos especialistas, a separação de postos para afrodescendentes no mercado de trabalho é um ganho natural após a garantia desse direito nas universidades públicas, outros tantos acreditam que, caso seja aprovada no Congresso Nacional, a proposta pode acabar com o sistema de meritocracia que deve reger os certames para a Administração Pública.

A professora Carmen Migueles, da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas na Fundação Getulio Vargas (FGV), concorda que, com a exclusão histórica dos negros, devem ser adotadas políticas afirmativas. Ela acredita, contudo, que o sistema de cotas pode representar um problema de gestão para o governo federal. ;O concurso nunca discriminou por cor. O que estão fazendo é criar uma seleção adversa, dando direito a quem não conseguiu passar por nota. O governo fere os princípios da gestão do Estado, ao priorizar a entrada, na máquina pública, de pessoas menos preparadas para exercer funções importantes;, afirmou. Na opinião dela, as cotas podem provocar um inchaço no governo, que vai ficar mais caro e, possivelmente, mais incompetente para a prestação de serviços a uma sociedade que paga impostos pesadíssimos.

Criador do sistema de cotas na Universidade de Brasília (UnB), o professor José Jorge de Carvalho discorda e acredita que, além de bem-vinda, a notícia é uma consequência natural da luta pelos direitos dos negros. ;Assim que se formasse, a primeira geração do programa de cotas das universidades encontraria a mesma dificuldade no mercado de trabalho. Eles não conseguiriam transplantar a inclusão para o serviço público, porque continua havendo um contingente muito maior de concorrência branca;, explicou.

Segundo o professor, atualmente, a presença dos negros não chega a 1% entre os cargos mais importantes dos Três Poderes. Entre os 620 procuradores da república, por exemplo, apenas sete são negros. Entre os ministros, só uma, a titular da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Luiza Bairros.

Para Marcelo Paixão, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a decisão da presidente foi acertada, mas talvez seja necessário criar algum tipo de restrição, já que, diferentemente do vestibular, o concurso não tem uma nota mínima de corte. ;Talvez o Congresso estipule alguma exigência que elimine candidatos que não têm o mínimo de conhecimento necessário;, ressaltou. ;A questão das cotas pode gerar muita polêmica, mas tem um objetivo correto, que é o de aumentar a diversidade;, completou.

Cautela

Na Esplanada dos Ministérios, a discussão está aquecida. ;Para mim, isso é racismo. Um candidato não é menos capaz por ser negro. O certo é que haja cotas sociais, para pessoas com menos condições financeiras;, opinou a servidora Suely de Jesus, 46 anos. Graduada em administração desde 2006, ela lembrou que, mesmo sendo negra, recusou-se a concorrer no vestibular por cotas em 2000. ;Um professor me perguntou o porquê de eu estudar em uma faculdade particular, se podia concorrer pela Universidade de Brasília (UnB);, contou. ;Trabalhava em dois estágios para pagar a mensalidade. Nunca aceitei a ideia de entrar na universidade pública por ser negra;, afirmou.

Servidor do Executivo, Joselito Gomes, 46, acredita que a tramitação deve ocorrer com cautela no Congresso. ;É importante que os parlamentares promovam amplos debates com a sociedade, porque esse não é um tema simples a ser abordado;, avaliou.

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