Trabalho e Formacao

O valor de ingressar na UnB

Estudantes que passaram no vestibular antes de concluírem o ensino médio recorrem à Justiça para se matricular na universidade. Alguns gastam até R$ 9 mil, entre supletivo e honorários de advogado. A Defensoria Pública atende gratuitamente

postado em 24/07/2014 10:23
  • Aluno da rede pública, Pedro (C) se uniu a outros colegas que passaram no vestibular e entrou na Justiça (Arquivo Pessoal)
    Aluno da rede pública, Pedro (C) se uniu a outros colegas que passaram no vestibular e entrou na Justiça
    Passar no vestibular da Universidade de Brasília (UnB) se tornou a prioridade de Bruna*, 17 anos, desde o ano passado. Aluna de escola pública, ela reforçava o ensino em casa e ainda contou com o esforço dos pais para frequentar um cursinho preparatório. Mesmo no 3; ano do ensino médio, decidiu tentar o certame para o curso de gestão de agronegócios. Passou. Ao ver o nome na lista, emocionou-se. Mas, em menos de 24 horas, foi do céu ao inferno. Precisava de um advogado para entrar com uma liminar e conseguir o diploma. ;Procuramos vários profissionais. Eles cobravam R$ 6 mil, R$ 4 mil. Não tínhamos a menor condição de pagar. Fiquei desesperada;, lamenta.

    A Resolução n;1/2012 do Conselho de Educação do DF veda a aceleração dos estudos no último ano da educação básica. Por isso, os aprovados só conseguem a certificação por meio da Justiça. O gasto final pode chegar a R$ 9 mil. Soma-se o valor dos honorários advocatícios ao preço dos supletivos. Para não perder a vaga, quem passou recorre à Educação de Jovens e Adultos (EJA), autorizada somente a partir de 18 anos. Como os selecionados têm entre 16 e 17, precisam de liminares para fazer as provas e conquistarem o diploma antes do encerramento do prazo concedido pela UnB.

    A saga de Bruna teve um final feliz. Ela recorreu à Promotoria de Justiça e não precisou pagar advogado. Mas sofreu. O juiz negou duas liminares e, no último dia para a matrícula da 1; chamada, ela recebeu a boa notícia. ;O promotor foi maravilhoso. Veio à minha casa dizer que não ia desistir. Fui a última a fazer a matrícula, mas consegui;, festeja a universitária. Ela não precisou de supletivo porque conseguiu uma liminar para que o conselho de classe antecipasse o diploma com o nome da escola onde estudou, em Planaltina.

    Só na primeira chamada dos aprovados, divulgada em 14 de julho, a Defensoria Pública do DF atendeu 147 selecionados que não concluíram o 3; ano. Algumas famílias não tiveram a mesma sorte de Bruna. Elas precisariam pagar o supletivo e não tiveram dinheiro suficiente. Em Brasília, alguns cursos chegam a custar R$ 3 mil.

    A defensora pública e coordenadora do Núcleo de Iniciais de Brasília, Emanuela Saboya, lembra que existem diferenças nos casos. ;Quem vai ingressar pelas cotas de escolas públicas não pode fazer supletivo, de forma alguma. O certificado precisa ser da própria instituição ou o aluno pode perder a vaga;, ressalta.

    Além dos processos na Defensoria Pública, a Associação dos Familiares e Alunos do Ensino Médio aprovados na UnB (AFA-UnB) estima que 600 pessoas tenham entrado com ações judiciais para conseguir o certificado. Ontem, os estudantes que receberam a notícia de aprovação na segunda chamada da UnB começavam a procurar a AFA para saber como proceder (veja quadro). ;Mais de 90% das pessoas que procuram a Justiça conseguem, pois o Tribunal de Justiça do DF já tem um entendimento sobre o assunto;, afirma a assessora jurídica da associação, Ana Esperança da Maia Pinheiro.

    ; Nome fictício a pedido da entrevistada

    Programe-se

    O registro acadêmico para os aprovados em segunda chamada começa hoje e vai até amanhã nos postos avançados da Secretaria de Administração Acadêmica (SAA) da UnB.

    ; O estudante deverá apresentar dois questionários descritos na Agenda do Calouro, disponibilizada no endereço: www.cespe.unb.br/vestibular/VESTUNB_14_2/

    ; Para efetuar o registro, é necessário ter a cópia autenticada dos seguintes documentos:
    ; Carteira de identidade

    ; Comprovante de conclusão e histórico escolar do Ensino Médio

    ; Título de eleitor

    ; CPF

    ; Certificado de reservista para candidatos do sexo masculino.

    ; Os que foram selecionados para cursos que exigem Certificação de Habilidade Específica deverão apresentar o documento, dentro do período de validade, emitido pelo CespeUnB.

    Preços

    Quanto é gasto para que um estudante que ainda não concluiu o 3; ano do ensino médio consiga o avanço de estudos

    Supletivo
    O preço varia entre R$ 1 mil e R$ 3 mil. Os alunos precisam se desvincular da escola onde estudam, fazer a matrícula na Educação para Jovens e Adultos e ser aprovados em mais de 12 provas. Todas concluídas em poucas horas.

    Advogado
    Os honorários advocatícios variam entre R$1,5 mil e R$ 6 mil. Não é uma causa fácil, e o profissional precisa ficar atento aos prazos. Escritórios especializados cobram
    de R$ 5 mil a R$ 6 mil.

    Defensoria Pública do DF
    Atende as pessoas de baixa renda que não podem pagar por um advogado. Isso não inclui somente os estudantes da rede pública de ensino. Engloba também alunos bolsistas das escolas particulares ou que estão matriculados em instituições com mensalidades baixas e comprovem não ter a renda necessária para contratar o serviço. Na primeira chamada do vestibular, 147 pessoas foram atendidas.

Vaquinha de aprovados


A semana em que Pedro Henrique Aires Rocha, 17 anos, descobriu a aprovação em engenharia foi mais de tensão do que de felicidade. A família não tinha condições de pagar pelo processo. Ele conseguiu forças ao se unir com outros amigos aprovados. ;Entramos com uma ação conjunta. Dividimos o valor de R$ 9 mil. Só assim conseguimos;, relata.

O presidente da Associação de Pais e Alunos das Instituições de Ensino do DF (Aspa-DF), Luis Claudio Megiorin, destaca a falta de isonomia entre estudantes da rede pública e da particular. ;Se o aluno se inscreve como cotista e faz supletivo, perde a vaga. A Justiça é morosa para que ele consiga o diploma na própria escola. Muitos não podem pagar advogados;, lembra. O Correio tentou contato com o Conselho de Educação do DF, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.

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