Necessário em uma fase da vida que exige dedicação e muito carinho, o cuidador de idoso é especialista em assistência e amparo. Embora seja exercida por cerca de 10 mil profissionais com carteira assinada, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a profissão é reconhecida, mas nunca foi regulamentada. No entanto, isso deve mudar com o Projeto de Lei do Senado (PLS) n; 184, de autoria do senador Waldemir Moka (PMDB/MS), que estabelece regras que vão do limite de funções à necessidade de capacitação (veja o quadro). Aprovado pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado há duas semanas, o Projeto agora vai passar pela Câmara dos Deputados.
De acordo com o senador Waldemir Moka, a necessidade de regulamentação dessa profissão foi motivada pelo envelhecimento da população brasileira. Segundo o último Censo Demográfico de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o país conta com cerca de 20,6 milhões de idosos. Os dados também mostram que, em 2050, esse número deverá ser de 48,9 milhões. ;A pirâmide populacional está mudando e a tendência é que as pessoas vivam mais,; explica. ;A demanda pelo cuidador será maior e, uma vez estabelecida a profissão, vamos ter pessoas mais especializadas, com melhor remuneração.;
Mais direitos
O trabalho do cuidador consiste, basicamente, em auxiliar o idoso em rotinas de higiene e mobilidade, prestar apoio emocional e ser um acompanhante. O texto do PLS do senador Moka é bem rigoroso ao proibir que o profissional seja responsável por tarefas de natureza doméstica, como cozinhar e fazer faxina ; o que ocorre com frequência. Com a regulamentação, o cuidador também poderá trabalhar em outros locais além da casa do paciente, como hospitais, clínicas e até agências de turismo.
O presidente da Associação de Cuidadores de Idosos de Minas Gerais (Aciminas), Jorge de Souza, apoia a iniciativa. A Aciminas foi a primeira instituição do tipo a surgir no país. Para Souza, a regulamentação da profissão não só possibilitará direitos trabalhistas, como influenciará na criação de sindicatos e mais organizações. ;É preciso ver que não se trata de um profissional de luxo, mas necessário.;
Um dos pontos do PLS celebrado por Souza foi o aumento da pena jurídica para o cuidador que abusar de alguma forma de seus pacientes. Segundo o Estatuto do Idoso, estabelecido pela Lei n; 10.741, a punição para quem comete crimes contra o idoso pode chegar a cinco anos de prisão. Se o autor da infração for o profissional responsável pelos cuidados pessoais, a pena aumentará em um terço. ;É uma garantia a mais para que o cuidador não venha a cometer nenhum tipo de maus-tratos;, diz Jorge de Souza.
Se o projeto for aprovado, o curso de cuidador de idosos será obrigatório para o exercício da profissão. Com menor carga horária do que um módulo técnico de enfermagem, as aulas ministradas abordam os procedimentos que serão exigidos na prática. O aluno aprende sobre as doenças comuns que afligem os pacientes nessa fase da vida, como mal de Azheimer e Parkinson, e de que forma reagir em casos de Acidente Vascular Cerebral (AVC) ou infartos.
A coordenadora do curso de cuidador do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial do Distrito Federal (Senac-DF), Brenda de Paula, explica que o currículo vai além do simples cuidado no dia a dia. ;Antes, quem fazia esse serviço era o próprio secretário doméstico, que não sabia muito bem o que era correto. Hoje, o curso fornece noções da própria fisiologia do envelhecimento;, garante.
Exigência do mercado
O serviço de cuidador, que não era muito conhecido até então, começa a ser mais requisitado. O empresário Pedro Serrão, 41 anos, percebeu há um ano a demanda de profissionais capacitados no mercado de Brasília e abriu uma empresa que se dedica a recrutar e treinar cuidadores. Segundo Serrão, a natureza do trabalho requer pessoas confiáveis, de boa índole, sem antecedentes criminais. As exigências particulares de cada família variam de acordo com as necessidades do paciente. ;Há pessoas idosas que requerem cuidados maiores, que exigem mais conhecimento. Por outro lado, também existe o idoso que só precisa de um acompanhante;, explica o empresário.
A média salarial de um cuidador de idoso pode variar de R$ 850 a R$ 1,5 mil, conforme a carga horária. Serrão lembra que muitos profissionais atuam em regime de plantão, que pode render até R$ 120. O revezamento de turnos também é uma tendência muito comum. O mesmo cuidador pode trabalhar para duas ou mais famílias.
A cuidadora Neuracy de Sousa, 39 anos, sempre gostou de ajudar as pessoas e fez disso sua profissão. Ela é técnica de enfermagem, mas trabalha há dois meses na casa de uma senhora que precisou de seus serviços ao fraturar o quadril em uma queda. Neuracy passou por um processo de seleção como qualquer outro. A vocação ajudou na escolha e ela não pretende atuar em hospitais. ;Prefiro trabalhar nessa área, ter um contato mais direto com os outros. É uma profissão de muito amor;, afirma.
Levantamento feito pela Aciminas mostra que 95% dos cuidadores de idosos são mulheres. Dessas, pelo menos 60% estão acima de 40 anos e não terminou o ensino fundamental. Essa exigência está prevista no texto do PLS e é o único ponto que a associação rejeita. Segundo o presidente Jorge de Souza, foram justamente as mulheres sem escolaridade que ajudaram a estabelecer a profissão. Essa restrição trará dificuldades para muitas delas. ;Vamos punir essas pessoas duas vezes. Primeiro, porque o Estado não lhes deu oportunidade de ensino no passado. Segundo, porque, agora, elas não vão mais poder atuar em algo que fazem bem;, completa Souza.
Saiba mais
O que muda?
Com o Projeto de Lei n; 184, somente poderá exercer a profissão de cuidador de idoso quem tiver 18 anos completos, ensino fundamental e curso de formação em instituição de ensino reconhecida.
Além do trabalho domiciliar, o cuidador também poderá atuar em hospitais, centros de saúde, eventos culturais e onde mais houver necessidade.
O empregador não poderá exigir do cuidador qualquer atividade de cunho doméstico.
O poder público será obrigado a fornecer assistência a idosos de baixa renda que necessitem de apoio, seja por meio de cuidadores ou outros profissionais.
4 A administração de medicamentos e outros procedimentos, quando necessários, deverão ser orientados por um profissional de saúde responsável.
A pena para crimes cometidos contra idosos, que pode chegar até cinco anos segundo o Estatuto do Idoso, aumentará em um terço se quem cometer os maus tratos for um cuidador.