"O profissional poderá trabalhar em planejamento, análise, construção e implementação de políticas públicas que envolvam desde a aplicação adequada de recursos a questões de níveis mais subjetivos"
Ailton Bispo, coordenador da graduação tecnológica em gestão pública do IFB
De um lado, Lucas Martins, 17 anos, vestibulando que ficou entre os cinco primeiros aprovados para o curso mais disputado do Brasil pelo Sistema Único de Seleção (Sisu). Do outro, Ailton Bispo, 32, coordenador da graduação tecnológica em gestão pública do Instituto Federal de Brasília (IFB). Futuros professor e aluno se encontram antes do início do semestre para uma conversa sobre a formação profissional desejada por 12.221 estudantes que fizeram o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) em todo o país: desses, apenas 45 conseguiram a tão sonhada vaga.
Gestão pública é um termo que designa uma área de trabalho presente em organizações e instituições ligadas ao interesse público. A carreira está associada à administração, mas tem o objetivo de oferecer ao mercado profissionais com formação específica para atuar no serviço público. A estabilidade profissional e a boa remuneração em empregos do Estado ajudam a explicar o grande interesse dos jovens por essa formação que desbancou a concorrência de cursos tradicionais, como medicina e direito. No IFB, o curso de gestão pública existe há um semestre e, no ano passado, teve alto índice de evasão: dos 30 alunos egressos, apenas 12 concluíram o período. Mas isso não desanima o calouro Lucas, que aproveitou o encontro para tirar todas as dúvidas sobre a área.
Lucas: O que é o curso de gestão pública e como uma pessoa graduada nessa área pode atuar?
Ailton: Ao conlcuir o curso, o estudante se tornará tecnólogo em gestão pública. Essa é uma graduação de nível superior e, portando o diploma, ele poderá trabalhar em planejamento, análise, construção e implementação de políticas públicas que envolvam desde a aplicação adequada de recursos a questões de níveis mais subjetivos, como gerência de equipes para obtenção de metas específicas.
Lucas: Qual a diferença desse curso para os de administração?
Ailton: A graduação tecnológica é voltada para o mercado. O curso do IFB foi pensado para profissionais que atuam ou pretendem atuar no setor público. Os conteúdos oferecidos aqui incluem a formação indispensável para todo administrador, mas com o foco na gestão pública. Os princípios são os mesmos, mas conhecer as particularidades de como o governo funciona é o que diferencia o nosso profissional dos outros.
Lucas: Que órgãos e empresas demandam funcionários com esse perfil?
Ailton: Uma pessoa com essa formação pode fazer concurso para muitas carreiras do governo federal, distrital, nos governos de outros estados e até no âmbito municipal. As empresas públicas, as fundações, as sociedades de economia mista, os departamentos de administração ; como ministérios e secretarias ; precisam de alguém pensando em como o dinheiro público deve ser investido e quais são as formas de fazer isso com eficiência. Esse é o papel do gestor público que, além de tudo, pode atuar em organizações não governamentais (ONGs) ou da sociedade civil de interesse público (Oscips), partidos políticos, entre outros organismos.
Lucas: O tecnólogo em gestão pública pode também trabalhar na iniciativa privada?
Ailton: Claro! No Distrito Federal, por exemplo, o maior cliente das empresas privadas é o governo. Se, por um lado, os cursos de administração não exigem que seus alunos conheçam sobre a estrutura governamental, por outro, a burocracia, os processos de licitações, formatação de convênios e contratos são assuntos obrigatórios para o gestor público. Ao mesmo tempo, uma empresa que tem o governo como principal parceiro precisa de um gerente de contas antenado nessa estrutura complexa da administração pública.
Lucas: Como essa é uma área de formação acadêmica muito nova, quem cumpre essas funções no mercado de trabalho atualmente?
Ailton: As pessoas com outras formações acadêmicas, como contabilidade, economia, direito e administração. Mas, como elas não precisam passar por uma formação muito específica, acabam adquirindo as competências obrigatórias para a gestão pública no dia a dia, e precisarão ser treinadas, recapacitadas, e isso tudo gera um gasto novo. Esse não é o quadro ideal.
Lucas: Para quem tem foco em concurso público, esse é o curso ideal?
Ailton: Não somos um cursinho para concurseiros. A nossa grade não serve para preparar aluno para concurso. Mas, para quem quer seguir uma carreira pública na área de gestão, essa é a formação mais adequada.
Lucas: Qual é o piso salarial para um recém-formado?
Ailton: No setor privado, esse valor é mais baixo, e deve girar em torno de R$ 3 mil nos cargos iniciais. Mas varia muito de empresa para empresa. Executivos do alto escalão chegam a ganhar dez vezes mais. Já no setor público, a remuneração fica em torno de R$ 12 mil para os níveis mais básicos.
Lucas: Eu vou poder estagiar durante a formação?
Ailton: Não só pode como deve. O currículo prevê um momento em que o estudante fará um estágio supervisionado. Como o curso é noturno, a vivência no mercado é uma das expectativas para o aluno que escolhe estudar conosco. Há, hoje, uma demanda muito grande para estagiários com essa formação em diversas instituições públicas, órgãos e empresas. A nossa meta é que as empresas interessadas venham buscar o profissional desejado dentro da nossa instituição.
Lucas: Qual o perfil ideal de um estudante de gestão pública?
Ailton : O aluno precisa ter um raciocínio lógico, e, ao mesmo tempo, ser bem articulado. Por isso, no Enem, demos peso quatro à prova de matemática e cinco à de redação. Ele precisa gostar de ler, estar atento ao noticiário, acompanhar os meandros da política no Brasil, o funcionamento do país, os bastidores da burocracia, e ter uma mentalidade crítica sobre tudo isso.
Lucas: Quais são as principais preocupações desse profissional?
Ailton: Ele precisa ter em mente que a função dele é obter bons resultados. O gestor público precisa se apoderar de instrumentos da burocracia para conseguir atingir o principal objetivo. Por causa disso é que o trabalho é desafiador. A gente vê com muita frequência projetos do governo que não saem do papel, políticas públicas que morrem no meio do caminho e tudo parece estagnado. O papel do gestor é reverter esse quadro com planejamento, conhecimento do funcionamento do país e estabelecimento de metas precisas.
Lucas: Por que a evasão no primeiro semestre do curso foi tão alta?
Ailton: Esse é um curso novo, e teve um primeiro semestre muito atípico. Nós tínhamos muitos alunos que já cursavam outra graduação no período contrário em uma instituição privada e, com a greve que enfrentamos, alguns desanimaram. Outros imaginavam que seria apenas um curso complementar, e se assustaram com o nível de exigência. Deu para ver que, aqui, não tem moleza.
Perfil
Nome
Lucas Martins Carvalho
Idade
17 anos
O que faz
Recém-formado no ensino médio pela Escola Integral Sesi, em Taguatinga, o aluno acaba de ser selecionado pelo Sisu para o curso de gestão pública do IFB. As boas médias no Enem lhe garantiram a aprovação em 4; lugar para o curso mais disputado do Brasil nesta edição.
O que pretende
Ser aprovado em um concurso público e investir numa carreira em que possa aliar a paixão por informática a uma boa remuneração, à estabilidade e aos conhecimentos que vai adquirir na faculdade na área de gestão pública.
Nome
Ailton Bispo
Idade
32 anos
O que faz
Mestre em administração pela Universidade de Brasília (UnB), especialista em políticas públicas e gestão governamental e coordenador do curso de gestão pública do IFB.
O que pretende
Continuar dando aulas na área em que é especialista e fazer um doutorado em administração.