Trabalho e Formacao

Os desafios de quem é mãe e executiva

Encontrar o equilíbrio entre trabalho e família ainda é uma das dificuldades enfrentadas pelas mulheres para chegar a cargos de chefia. Mas a divisão de tarefas em casa está ajudando a mudar esse quadro

postado em 04/03/2013 10:47

Patrícia deixou um posto de liderança para cuidar dos filhos. Depois de um ano afastada, ela voltou a ocupar posição semelhante na mesma empresaConciliar o trabalho com as tarefas de casa e a maternidade ainda é um dos principais desafios das executivas. Quando esse momento chegou para Patrícia Klein Vital, 37 anos, ela decidiu se afastar da empresa e se dedicar aos filhos gêmeos, hoje, com três anos de idade. Essa mudança, no entanto, só foi possível porque houve planejamento. ;Tive filhos um pouco mais velha porque priorizei a carreira. Porém, como tudo foi bem planejado, não hesitei em deixar a Brasal na época, por achar importante estar com eles naquele momento;, explica ela, que é coordenadora de asseguração da qualidade na fabricante de bebidas.

Depois de aproximadamente um ano fora da empresa, ela voltou e reassumiu uma posição de liderança. O apoio do marido, que ocupa um posto semelhante em outra organização, foi fundamental. ;Como conhece a responsabilidade do cargo, ele entende quando preciso atender um telefonema ou ficar na empresa à noite;, relata Patrícia.

A especialista da Sociedade Brasileira de Coaching Celiane Gonçalves ressalta que essa divisão de tarefas é mais comum atualmente. ;Os homens, que antes assumiam função patriarcal, hoje assumem tranquilamente o controle do lar;, assegura. Para a especialista em economia do gênero Regina Madalozzo, a mudança da posição da mulher na sociedade também influencia as novas gerações. ;Hoje em dia, a questão transcende o papel da mulher. O excesso de responsabilidades, seja para ele ou para ela, pode atrapalhar o desenvolvimento da carreira.;

A especialista Celiane Gonçalves acredita que, assim como Patrícia, as mulheres estão fazendo um planejamento cada vez mais detalhado para aliar os objetivos profissionais ao sonho de ser mãe. ;Ela vem decidindo por uma gestação mais tardia, quando a ausência no ambiente de trabalho não representa mais tanta vulnerabilidade para a carreira. Se demora mais para ser mãe, adquire maturidade, ocupa cargos estratégicos, se fortalece no mercado, tem mais poder, resolve-se financeiramente e consegue se sustentar melhor;, explica.

Estigma

Mesmo que a relação entre família e trabalho esteja cada vez mais equilibrada, as mulheres ainda enfrentam barreiras para chegar a cargos de chefia. ;Ainda existe o estigma da mulher mãe e isso continua sendo um dilema para elas, principalmente quando chega essa etapa gerencial. Nesse período, as mulheres costumam estar com cerca de 30 anos e também é o momento em que começam a pensar em ser mães. É nessa época que as empresas tendem a evitar a contratação de mulheres;, explica Helena Camila Magalhães, diretora da empresa de recrutamento de altos executivos Fesa no Rio de Janeiro. Ela relata ainda que, após essa etapa, quando as mulheres já têm filhos e uma estrutura familiar mais estabilizada, a resistência à contratação delas para cargos no nível de diretoria diminui.

Em certos casos, porém, essa característica mais maternal da mulher pode contribuir para o relacionamento com a equipe. ;Ela tende a lidar um pouco melhor com alguns conflitos do que o homem;, afirma Helena. Enquanto eles são mais pragmáticos, elas trazem a sensibilidade para o ambiente organizacional. Algumas empresas estão adotando posturas mais flexíveis para facilitar a divisão de tarefas. Há aquelas que oferecem creches, flexibilizam horários ou permitem o trabalho em casa após a licença maternidade.

Segurança
Exigente com a qualidade do trabalho, Patrícia Klein Vital assumiu um posto de liderança na Brasal em Brasília aos 20 anos, como chefe do antes chamado setor de xaroparia. ;Eles entendem que ser mãe não é uma tarefa fácil, mas que, obviamente, eu sabia separar bem a maternidade e vida profissional. É importante ter o respaldo da empresa;, reforça. Após o período em que ficou longe do trabalho, Patrícia se sentiu segura para deixar as crianças em casa, prontas para lidarem com a ausência dela por um tempo maior. ;Os meus filhos comentam tudo o que acontece com eles, por isso, eu posso ficar despreocupada. Até brincam que querem trabalhar na Coca-Cola também;, conta.

Hoje, ela é responsável por assegurar a qualidade dos produtos e procura ter uma equipe equilibrada entre homens e mulheres. ;Sempre gostei muito de trabalhar com homens, porque eles são mais práticos e a mulher, na média, é muito crítica e organizada. Repassar a segurança da qualidade para o consumidor final, no meu setor, é primordial;, explica a executiva.

Três perguntas para


Eleonora Menicucci, ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres


Como vem sendo a evolução das mulheres na sociedade,principalmente no trabalho?

As mulheres romperam diferentes barreiras no mercado de trabalho e chegaram a carreiras profissionais até então concentradas no público masculino. Hoje, são técnicas, gestoras, executivas, presidentes de empresas e empreendedoras. Mas ainda é grande a concentração em profissões ligadas aos cuidados. Para alterar esse quadro, é preciso não somente formação e qualificação em áreas científicas e tecnológicas mas também mudança nas relações cotidianas. Isso quer dizer que homens e mulheres devem compartilhar responsabilidades, para que elas não continuem sobrecarregadas com os cuidados com a família. Esse é um obstáculo real que deve ser derrubado para que tenham condições de aproveitar as oportunidades de mercado e de ascensão profissional.

A mulher precisa superar obstáculos maiores para chegar à mesma posição que um homem?
Homens e mulheres têm a mesma possibilidade de desenvolver trabalhos semelhantes. O que difere são as condições para que isso realmente possa acontecer, porque a sociedade ainda vê as mulheres cumprindo o duplo papel, a conhecida dupla jornada de trabalho: profissionais e responsáveis pela administração das casas e da família.

O que é preciso para que mais mulheres ocupem os cargos tradicionalmente assumidos por homens?
É preciso que a sociedade divida o trabalho diário que está concentrado nas mulheres, isto é, a quebra da divisão sexual do trabalho. Ou seja, isso requer ação das políticas públicas e das pessoas sobre a forma como organizam suas rotinas diárias, em especial a divisão das tarefas dentro de casa. As mulheres têm escolaridade, qualificação profissional e competência para chegar a postos de poder dentro das empresas e das instituições. O que falta é que os fatores que impedem essa chegada, tais como administração da família e tempo dedicado aos cuidados da casa, sejam eliminados, para que elas possam exercer a liderança a que estão preparadas a colocar em prática no mercado de trabalho.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação