Trabalho e Formacao

Entrevista: Tatau Godinho

Secretária Nacional de Avaliação de Políticas e Autonomia Econômica das Mulheres

postado em 28/03/2013 14:00

 (Carlos Moura/CB/D.A Press)

Há mais de um ano envolvida na PEC das Domésticas, aprovada anteontem, a cientista social Tatau Godinho minimiza as previsões de embates entre patrões e empregados. Na opinião dela, essa é uma avaliação alarmista. Integrante da equipe que ajudará a regulamentar os tópicos em aberto da emenda constitucional, Tatau prefere destacar a ;vitória para a sociedade brasileira; e defender que o Brasil deve se orgulhar de ter aprovado direitos para uma ;categoria invisível;.

Quando empregados e patrões terão
respondidas as dúvidas que surgiram com a PEC?
O que estiver ao alcance do governo federal será feito o mais rapidamente possível. Algumas questões dependerão de ajustes em normas administrativas. Mas vários direitos têm aplicação automática. A emenda constitucional estendeu aos trabalhadores domésticos muitos pontos já existentes.

Sem compensações, as mudanças não pesarão
demais no orçamento das famílias?
Para quem já cumpre a legislação, não. Pagamento de salário mínimo, férias, 13; salário, vale-transporte: tudo isso já existe. O pagamento do FGTS também, mas não era obrigatório. Além disso, o governo federal tem procurado contribuir para o aumento da formalização. Na contribuição patronal ao INSS, por exemplo, existe a isenção de 100% que pode ser feita por meio do abatimento do Imposto de Renda.

A PEC vai acabar com as distorções nessa
relação de trabalho ou pode aumentar
ainda mais a informalidade?
Com certeza, contribuirá para acabar com as distorções. A aprovação da emenda provocou uma importante discussão na sociedade brasileira, em que os empregadores, mesmo sabendo que as mudanças podem pesar mais no bolso, estão reconhecendo que os direitos adquiridos pelas domésticas são justos.

É um processo de conscientização?
Sim. E de mudanças nas relações sociais. O fato de existir uma legislação específica não implica automaticamente em correção de todas as desigualdades. Mas significa que a sociedade tomou consciência de que não pode conviver com elas. Ao contratar um empregado doméstico, as pessoas saberão que estão assumindo responsabilidades. Trata-se de um avanço civilizatório.

Como ficarão as horas extras?
Dependerão de organização da jornada de trabalho. Quem quiser uma empregada mais tempo terá de pagar por isso, como ocorre em qualquer outro emprego. Não há desajuste. Ninguém pensa a força de trabalho contando com as horas extras. Isso se resolve com compensações e acordos. Não digo necessariamente de um banco de horas, porque ele pressupõe um processo formal. Mas algo semelhante, sim.
Entrevista:
Delaíde Alves Miranda Arantes, ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST)

 (Viola Júnior/Esp. CB/D.A Press)

A doméstica que virou ministra do TST encara a aprovação da PEC das Domésticas como momento histórico para o país. Nascida em Pontalina (GO), onde começou a vida profissional, aos 16 anos, trabalhando em casa de famílias, Delaíde Alves Miranda Arantes não crê que as novas regras provoquem tantos impactos na relação entre patrão-empregado. Será necessário, no entanto, um período de adaptação, marcado sobretudo por mudanças culturais.

Como patrões e empregados
colocarão a PEC em prática?

De preferência, fazendo um contrato escrito, listando as obrigações de cada um. É momento de dialogar. Não é justo, por exemplo, que a empregada silencie agora e, daqui a cinco anos, acione a Justiça trabalhista. Toda mudança cultural é gradativa. E qualquer alteração legislativa não deixa de ser uma imposição. Por isso, tantas contestações. Mas não são muitos os direitos acrescidos. O mais polêmico será mesmo mensurar a jornada de trabalho.

O embate não será inevitável?

Eu diria que a relação de trabalho se tornará mais exigente. A empregada vai buscar mais direitos, porque está melhor informada. E o empregador, naturalmente, também terá motivos para fazer valer aquilo que a lei agora autoriza. Embates existirão, mas serão superados. O importante é que o Brasil está pagando uma dívida enorme com os trabalhadores domésticos.

Como conciliar as novas regras
com as peculariedades dessa relação?

A regulamentação vai cuidar disso. Não podemos conceber que a legislação imponha exigências impossíveis de serem cumpridas. Por conta da relação de confiança entre patrão e empregado, o grau de formalidade também não poderá ser muito grande, sob o risco de a dona de casa ter de contratar um contador. Da mesma forma, o registro da jornada não poderá ser tão rigoroso. Não se pode pensar em ponto eletrônico, por exemplo.

As duas partes estavam preparadas
para esta nova realidade?

O impacto não será tão grande assim. A PEC não está equiparando os lares a uma multinacional. O que está acontecendo é a implementação de uma série de direitos. Impacto grande seria se toda a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e a Constituição fossem aplicadas aos empregados domésticos, mas não é esse o caso.

Não haverá muitas demissões ou ao menos uma
migração significativa para a função de diarista?

Não acredito. As empregadas estão com medo de serem demitidas porque os patrões estão muito preocupados, sem saber direito o que está acontecendo. Acredito, sim, que a PEC vai é estimular uma melhor formação profissional dos empregados domésticos.

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