A decisão de dar novos rumos à carreira vem acompanhada de dúvidas e riscos. Garantir o retorno financeiro e pessoal ao se trocar de ramo de atuação profissional exige reflexão e autoconhecimento. Porém, é a ideia de satisfação com o novo trabalho que motiva os profissionais a mudarem, seja para áreas distintas dentro do mesmo setor ou para formações completamente diferentes.
Que o diga Ingrid Bauer, 30 anos, formada em relações internacionais pela Universidade de Brasília (UnB) e que hoje é terapeuta médica. Quem a vê debruçada sobre uma maca, cuidando de pacientes em terapias alternativas, nem imagina que ela tenha atuado em negociações empresariais. ;Eu até gostava dessa área, mas nunca foi algo que me encantou;, conta. Ingrid sempre se interessou por terapias complementares e uma viagem a Vancouver, no Canadá, em 2010, a motivou a se dedicar ao assunto. O que era apenas uma área de interesse virou oportunidade de crescimento financeiro e pessoal no momento em que ela descobriu as possibilidades dos profissionais daquele país. ;Lá, existe um mercado muito grande para essa especialidade e notei que havia maneiras de eu me dedicar a ela profissionalmente;, diz.
A mudança foi brusca, o que gerou questionamentos por parte dos familiares e de colegas de profissão. ;Todos estranharam minha decisão no começo, mas provei que estava de cabeça feita e, então, logo todo mundo me apoiou;, relembra Ingrid. Hoje, ela se dedica à carreira de terapeuta com a técnica Body Talk, que investe na comunicação entre as próprias partes do corpo para acelerar processos de cura. ;Estudei o assunto e decidi que era com isso que trabalharia por toda a minha vida;, comenta. Além da satisfação pessoal, o retorno financeiro foi positivo. ;Meu rendimento com terapias é maior que aquele com comércio exterior. Provei a mim mesma que é possível unir o trabalho do qual a gente gosta com resultados profissionais e no orçamento.;
Planejamento
Para o consultor em gestão de pessoas Eduardo Ferraz, mudanças abruptas como a de Ingrid são arriscadas quando o profissional pouco conhece sobre a área na qual pretende entrar. ;Por pior que esteja a profissão, o plano B precisa ser desenhado aos poucos, pois pode-se cometer um erro novamente na decisão pela carreira;, explica. Buscar cursos de formação e tentar praticar a nova atividade como um hobby são táticas que ajudam o trabalhador a ter uma noção do que virá pela frente. ;A mudança deve ser planejada com antecedência;, ressalta Ferraz.
Planejamento é a palavra-chave da mudança de carreira, segundo o diretor administrativo e financeiro do Conselho Federal de Administração, Ramiro Carbalhal. ;Primeiramente, é preciso que o profissional faça uma avaliação pessoal do próprio conhecimento e de suas habilidades. Depois, é necessário constatar se a profissão almejada é realmente o que se imagina;, sugere. Para Carbalhal, a chefia tem papel importante ao perceber que um funcionário quer mudar de carreira. Com apoio do gestor, o colaborador se sente motivado a terminar bem o trabalho na empresa antes de partir para próximas experiências. ;O chefe pode alertar para a capacitação do empregado e até mesmo incentivá-lo para que o ambiente de trabalho seja o melhor possível;, diz.
Mesmo domínio
Há situações em que o profissional gosta da carreira que escolheu, mas decide trocar de área de atuação dentro de um mesmo domínio de conhecimento. É o caso do advogado Antonio Alberto Cerqueira, 38 anos. Ele começou a vida jurídica em 1997 e seu trabalho era mais concentrado em causas trabalhistas para empresas. Depois que começou a lecionar direito penal em faculdades, quatro anos mais tarde, Antonio decidiu se especializar na área. ;Além de fazer os cursos que me levaram à sala de aula, comecei a defender causas na esfera criminal;, conta ele.
Hoje, Antonio dedica-se exclusivamente à advocacia criminalista, mas seu escritório ainda atua na área trabalhista, de responsabilidade de outro advogado. ;Não houve rompimento, foi um processo de transição normal para mim;, explica. Porém, a decisão trouxe ônus para o profissional. Clientes que exigiam que Antonio advogasse nos processos trabalhistas não aceitaram que outro associado atuasse nos casos e preferiram buscar outros escritórios. ;É natural, não tive traumas nem choques ou consequências que fossem me trazer grandes dificuldades;, relata. Para Ramiro Carbalhal, é importante o profissional que busca trocar de carreira saber que a mudança não trará somente ganhos. ;É preciso obter uma nova qualificação e ter em mente que o rendimento ao fim do mês pode ser menor;, alerta o especialista.
Por outro lado, o consultor em gestão de pessoas Eduardo Ferraz acredita que transitar entre ocupações dentro de uma mesma profissão é positivo e deve ser estimulado quando desejado. ;Faz bem ao talento. Se o profissional se sentiu atraído por outra área, mesmo gostando de onde está, ele não só pode como deve experimentar a mudança;, atesta. Para a qualificação do trabalhador, o consultor recomenda a procura por trabalhos extras relacionados à área que pretende seguir, mesmo que não se ganhe com isso. ;Ajudar o pessoal do setor para o qual se deseja entrar em horário diferente ao do expediente faz bem. Não há outra maneira de crescer na nova carreira a não ser ganhando experiência.;
Novas opções
De acordo com o professor de sociologia do trabalho da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) Luís Fernando Correa, são vários os motivos da transição ocupacional. ;Podem ser tanto aspectos estruturais e modificações do mercado de trabalho quanto aspectos subjetivos, como a própria mudança no gosto do profissional;, afirma. Segundo ele, novas funções que surgem ou desaparecem podem tornar algumas ocupações mais ou menos atraentes. ;Surgem novos filões no mercado que chamam a atenção de quem busca mudar de carreira;, explica.
Correa também afirma que a formação profissional mudou nas últimas décadas. Para ele, há 30 anos, havia a ideia de que a carreira seria a mesma durante toda a vida e que começaria com o término do ensino superior ; o que significaria também o fim dos estudos. ;Hoje, o profissional busca várias qualificações e isso traz mais possibilidades de mudança;, coloca.
Já Eduardo Ferraz acredita que a idade de entrada dos jovens nas universidades é um dos fatores que levam à desistência na carreira. ;Os alunos precisam decidir o que vão fazer da vida cada vez mais cedo. Ainda não há um questionamento dos paradigmas da profissão quando se está saindo do ensino médio;, afirma o especialista. De acordo com ele, é com a maturidade que o profissional reconhece seu verdadeiro talento. ;Esse autoconhecimento vem entre os 25 e os 35 anos, geralmente, que é quando a pessoa descobre mais a fundo os dons que possui;, explica.
Leia
Business Model You: o modelo de negócios pessoal
Autor: Tim Clark
Editora: Alta Books
Edição: 1;
Número de páginas: 262
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O livro Business Model You tem como objetivo auxiliar as pessoas a refletirem sobre suas vidas e sugere um método prático e fácil para descrever, analisar e reinventar qualquer carreira. Assim como as empresas são afetadas por fatores ambientais, econômicos e tecnológicos além do seu controle, profissionais também são atingidos e devem reavaliar os planos para se adaptar às mudanças de mercado e alcançar mais satisfação e sucesso.