O uso de ferramentas para otimizar a administração de recursos humanos não é novidade. Porém, avaliar os funcionários em questões que vão além da carga horária e dos resultados ainda não é algo largamente difundido fora de grandes empresas e multinacionais. Aos poucos, órgãos públicos e privados aderem à chamada gestão por competências, que propõe uma visão mais complexa sobre o gerenciamento de pessoas.
A preocupação quanto à seleção e à retenção de bons funcionários é global. Uma pesquisa da PwC, rede de companhias de assessoria empresarial, realizada entre 1,3 mil CEOs de todo o mundo, revela que 93% dos entrevistados acham que precisam mudar as estratégias adotadas para atrair e para reter talentos. Desses, três em cada cinco ainda não tomaram medidas para fazer isso. Além disso, 63% consideram a ausência de competências-chave como a maior ameaça para o crescimento dos negócios de sua organização (veja quadro).
Sucesso em números
Foi a partir da necessidade de reconhecer os funcionários que a Clínica de Doenças Renais de Brasília (CDRB) alterou os processos de gestão de pessoas no ano passado. ;Trabalhar com meritocracia era o que precisávamos para valorizar os colaboradores, além de atrair pessoas para a empresa e reter talentos;, diz a diretora de qualidade, Maria Fernanda de Azevedo Reis, 29 anos.
Agora, todos os empregados da clínica passam por avaliações anuais que geram notas individuais e coletivas. Assim, são definidas as necessidades de treinamento e de orientação. Como resultado da primeira avaliação, profissionais que se destacaram devem ser promovidos a partir deste mês.
O técnico administrativo Luiz Emanuel, 31 anos, trabalha na clínica há dois anos e considera a mudança positiva. ;Todo mundo teve receio no início, mas, depois que o processo foi aplicado em gestores e em colaboradores, a gente vê que o objetivo é melhorar;, afirma.
O analista de qualidade Railson Pereira, 18 anos, concorda. ;A gente tem a oportunidade de avaliar metas, ver pontos positivos e negativos no trabalho e melhorar a comunicação por meio das avaliações;, diz. Já a técnica administrativa Camila Aquino, 25, afirma que o resultado da avaliação fez com que ela repensasse a maneira de manter a ordem no ambiente de trabalho. ;A avaliação dos colegas me ajudou a notar que eu precisava de mais organização;, diz.
Serviço público
A busca por mais eficiência não fica restrita aos setores de recursos humanos de empresas privadas. Um exemplo é o Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal (TRE-DF), que adotou o sistema de gestão por competências há seis anos. De acordo com Fernando Velloso Filho, secretário de gestão de pessoas do TRE, o processo trouxe benefícios. ;As principais mudanças se deram na capacitação dos gestores, que agora é mais eficiente, no treinamento e no aperfeiçoamento de carências e na distribuição de pessoas entre os setores.;
Diferentemente do método empregado por empresas privadas, que entrevistam e selecionam candidatos que mais se encaixam para cada vaga, a distribuição de funções após um concurso público pode representar um desafio, segundo Velloso. ;Você já conta com uma pessoa selecionada pelo concurso e deve ajustá-la posteriormente, o que pode ser uma grande dificuldade;, avalia.
Mudança estruturada
O momento de transição para um novo modelo de gerência pode ser delicado, e é preciso definir bem quais são os novos critérios de avaliação para que colaboradores e gestores entendam as alterações. Não há uma receita pronta que se aplique a todos os tipos de negócio, mas é necessário analisar aspectos qualitativos e quantitativos do trabalho dos funcionários.
;O ideal é que haja equilíbrio entre a valorização das competências, que são conhecimentos, habilidades e atitudes de uma pessoa, e a cobrança por resultados concretos. É a combinação desses dois fatores que leva ao desenvolvimento profissional;, diz André Freitas, consultor em gestão por competências e professor do Instituto de Desenvolvimento Empresarial (Idemp).
Bruno Goytisolo, sócio-diretor da Véli Soluções em RH e vice-presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-DF), diz que a transparência é fundamental para o processo. ;Para que o modelo funcione, é necessário aplicar uma análise ampla, incluindo autoavaliação, avaliação entre pares, avaliação de superior para subordinado e vice-versa;, diz. Segundo ele, o ideal é que a implantação de um modelo de gerência seja feita por meio de consultoria externa para não gerar desconfiança. ;Quando alguém de fora faz esse trabalho, supõe-se que há mais isenção ou transparência na hora de avaliar o desempenho de todos.;
A atuação dos gestores é fundamental para o sucesso da adoção desse modelo de funcionamento como política de uma empresa. A disponibilidade para orientar e acompanhar os resultados cotidianos da organização é uma dificuldade para muitos chefes. ;O desempenho de uma equipe depende de esforços individuais, coletivos e do gestor. É ele quem vai incentivar a equipe a ter metas e objetivos definidos e a buscar o autodesenvolvimento;, explica Freitas.
Com adaptações, é possível implantar princípios da gestão por competências em negócios de todos os tamanhos. ;Se eu tenho um pequeno restaurante, por exemplo, e a minha estratégia é me diferenciar dos concorrentes pelo serviço, posso treinar a minha equipe para que ela tenha a competência necessária para atingir o objetivo;, exemplifica João Lins, sócio da PwC e especialista em gestão de capital humano.
Na visão de Lins, esse tipo de gestão facilita a geração de resultados. De acordo com uma pesquisa conduzida por ele junto de 51 empresas de grande porte que utilizam o modelo de gerenciamento, 59% dos gestores notaram melhoria no desempenho das pessoas. Além disso, metade acredita que o modelo contribui para os resultados da empresa como um todo (veja gráfico).
Pela meritocracia
Esse modelo de gerenciamento pode ser definido como um conjunto de atividades que compreendem a definição do desempenho esperado, o acompanhamento e a orientação contínua de equipes e de indivíduos, a avaliação do desempenho e o feedback para as pessoas e o estabelecimento de planos de ação e de desenvolvimento.
Fonte: PwC
;As principais mudanças se deram na capacitação dos gestores, que agora é mais eficiente, no treinamento e no aperfeiçoamento de carências e na distribuição de pessoas entre os setores;
Fernando Velloso, secretário de gestão de pessoas do TRE-DF
Prós x contras
Confira o que os especialistas têm a dizer sobre as vantagens e as desvantagens desse modelo
Bem conduzida, a adoção da gestão de desempenho pode...
; Motivar empregados
; Aumentar o conhecimento do colaborador quanto às verdadeiras expectativas do empregador
; Proporcionar feedback constante aos funcionários, dando a eles oportunidades para melhorar
; Identificar as necessidades de treinamento e reciclagem
Já um processo mal
aplicado pode...
; Amedrontar colaboradores
; Gerar ansiedade e competitividade excessiva entre funcionários, sobretudo quando há cobrança apenas por resultados
; Provocar clima de desconforto e desconfiança, caso não haja critérios claros para a avaliação de desempenho