Trabalho e Formacao

A xerife do Conic

Maranhense levou escritório de arquitetura para o Setor de Diversões Sul. Como prefeita há 10 anos, vem revitalizando o espaço e tem o sonho de transformar o local na maior galeria aberta do país

Ana Paula Lisboa
postado em 08/09/2014 10:06
 (Antonio Cunha/CB/D.A Press)


;Além de ser um território de resistência, não é o primo feio do Conjunto Nacional;

A atuação de uma década como prefeita do Conic se traduz em planos ambiciosos de transformá-lo na maior galeria aberta do país e em paixão pelo lugar ; considerado malcuidado e abandonado por muitos brasilienses. Natural de São Luís e dona de um escritório de arquitetura há 24 anos, depois de empossada no cargo, trouxe o negócio para o Conic e se divide entre as funções. ;O Conic é uma área rejeitada, e não é fácil quebrar esse estigma;, diz Flávia Portela, 52 anos.

A Praça do Conic, que demorou anos para sair do papel, é de sua autoria. Entre os projetos a serem executados, está a criação do Memorial Dulcina. A arquiteta também assina as reformas de vários prédios dentro do Conic, como Boulevard, Eldorado, Baracat e Venâncio.

Ela admite que há muito a melhorar, mas lembra que o centro do Setor de Diversões Sul avançou bastante. ;Eu não concordo em dizer que é largado. Há 10 anos, prédios daqui não tinham elevadores, tinha muita poluição visual, não havia painéis publicitários nem antenas iluminadas. Eu fui atrás de tudo isso;, defende. ;De lá para cá, vários edifícios foram reformados e vários negócios foram atraídos. Há 10 anos, as pessoas nem andavam aqui por falta de segurança e tinham medo de investir. Hoje, os comandantes da polícia dizem que é um lugar seguro;, compara. As principais mudanças necessárias estão no andar térreo. ;Se você olhar da sobreloja para cima, o Conic não deixa a dever para qualquer shopping. O problema é que o comércio térreo não atrai muitos olhares.;

As modificações no Conic podem parecer espontâneas, mas são fruto do trabalho duro de Flávia Portela. ;Vou atrás das pessoas para abrirem estabelecimentos aqui. Fico no pé de administradores e lojistas para fazerem reformas. É um trabalho de formiguinha, quase de catequese, que exige paciência;, diz.

A comunidade interna do Conic é grande: ali há cerca de 2 mil unidades ; entre salas e lojas ; e cerca de 10 mil trabalhadores. Entre os estabelecimentos estão igrejas, lojas de skate e de camisetas, cafés, óticas, ourives, 84 sindicatos, cinco partidos políticos e muitos outros tipos de comércio. Além da prefeita, o local conta com 13 síndicos. Ela lamenta que a convivência não seja a ideal. ;Eu comprei muitas brigas aqui dentro para que as coisas fossem cumpridas. Acho que os mais jovens aqui entendem o meu trabalho;, acredita.

;As tribos do skate e do rock chegaram com as lojas de camiseta, que são geniais; Se não fosse pelas lojas de camiseta, de skate e das óticas, ninguém viria aqui. Ninguém vem bater perna no Conic, mas eu acredito que ele tem potencial. Cerca de 25 mil pessoas entram aqui todos os dias e 400 mil passam na porta;, diz.

Projetos
Para o futuro do Conic, Flávia sonha atrair uma academia e bons restaurantes e bares. ;Eu queria bons cafés, música tocando e o local funcionando 24h. Vemos tantas quadras que brigam por problemas de som alto à noite. Esse centro poderia ser mais explorado. O pulo do gato é a gastronomia, que tem o poder de mudar as coisas aqui. Quero trazer bons restaurantes para cá;, sonha.

Além da arquitetura, a prefeita desenvolve projetos culturais que, segundo ela, convergem para o Festival Cara e Cultura Negra, idealizado por ela. ;Estamos chegando à 10; edição e, dentro do festival, temos um projeto de teatralidade que é de ressocialização de jovens. Realizamos oficinas de capacitação. Além desses, também tenho projetos de artesanato e de atenção à mulher. Os outros projetos são esporádicos. O que organizo o ano inteiro é o Cara e Cultura Negra;, diz.

O início
Antes de assumir como prefeita do Conic, Flávia acompanhou o antigo prefeito por dois anos. ;Fui chamada para fazer um projeto macro de arquitetura e urbanismo, um plano de requalificação. Eu acabei me encantando com o setor por causa dos vários universos presentes. Tem o Teatro Dulcina, tem artesãos, tem as lojas de camiseta, tem as tribos do skate. É um local muito democrático, algo que eu não vejo em nenhum outro espaço. Outros centros perderam suas características culturais, mas o Conic continua a ter, sempre recebendo eventos independentes;, orgulha-se.

As comparações com o Conjunto Nacional não fazem sentido para ela. ;O sonho do antigo prefeito era transformar o Conic no Conjunto Nacional, mas o Conic tem várias características diferentes. É diferente e especial. Além de ser um território de resistência, não é o primo feio do Conjunto. Falta inteligência política e apoio para transformá-lo num polo dinamizador e um celeiro cultural.; Flávia pretende se candidatar nas eleições para prefeita do local, a cada quatro anos, até quando achar que ainda pode contribuir. ;Quando achar que já dei minha contribuição, eu paro.;

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