Trabalho e Formacao

Uma carreira na internet

Mais que diários virtuais, blogs são vitrines para pessoas comuns mostrarem a própria personalidade e ganharem seguidores - e dinheiro também. Veja como jovens transformaram um passatempo em trabalho e inspire-se. Profissão ainda não é regulamentada

postado em 16/03/2015 10:37

A brasiliense Denise Gebrim conquistou 40 mil leitores diários com o blog Diário de acessóriosEngana-se quem ainda acha que blogs não são assunto sério. Existe até curso superior de olho na nova carreira. Buscando profissionalizar quem atua no ramo e suprir necessidades do mercado, o Centro Universitário Belas Artes, de São Paulo, iniciou, neste semestre, a primeira turma do curso de mídias digitais sociais. Apesar de não ser exclusivo para a profissão de blogueiro, os graduados estarão aptos a produzir qualquer tipo de conteúdo para internet, inclusive sites pessoais.

A blogueira mais influente do Brasil e a quinta do mundo, segundo o site Signature9, é a recifense Camila Coutinho, 26 anos, que emprega cinco pessoas e tem, inclusive, assessoria de imprensa no exterior. Há sete anos, ela criou o Garotas Estúpidas numa madrugada de insônia para falar sobre estilo, beleza e celebridades e, hoje, recebe 6 milhões de acessos por mês. Quem acompanha pode até pensar que é apenas diversão e glamour, mas Camila se graduou em design de moda antes de falar sobre o tema na internet. ;Era um hobby, mas começou a dar o mesmo retorno financeiro que meu trabalho como assistente de estilista, então larguei o emprego.;

A carreira ainda não é regulamentada, mas Camila não tem dúvidas: ;Está mais do que claro que blogueira é uma profissão. Tenho uma empresa, contrato pessoas e pago impostos como todo mundo.; Ela não revela quanto lucra com a página, mas diz que, após dois anos, ;começou a dar um retorno legal;. A jovem encara a influência na web com responsabilidade. ;Não criei o blog para ser influente, mas atinjo muita gente, inclusive meninas novas. Tento não incentivar o consumo desenfreado e mostro que, para ter estilo, não é preciso gastar muito.;

[SAIBAMAIS]Com 40 mil leitores por dia no Diário de acessórios (www.diariodeacessorios.com.br), criado em 2008, a brasiliense Denise Gebrim, 31 anos, exibe looks do dia, dá pitaco no visual das famosas e compartilha detalhes glamorosos de sua rotina, como ida a salões de beleza e restaurantes, comparecimento a eventos e viagens ; a última foi a Semana de Moda de Milão, que terminou em 2 de março. Antes de começar a escrever para a internet, ela se graduou em marketing de moda em Milão e fez um curso de design de moda em Brasília. ;A profissão de blogueira está sendo reconhecida, é algo sério. Conheço minha leitora; existe uma abordagem específica para meu público;, diz. As postagens patrocinadas trazem rendimentos ao blog, mas Denise garante ser criteriosa. ;Para falar de um produto, tem que ser algo que eu realmente usaria. Quando uma postagem é paga, prefiro dizer logo e ser transparente;, observa.

Para Jorge Adriano, gestor de Processo de Inovação e Tecnologia do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), o profissional digital é uma figura ainda pouco conhecida e estudada, mas que precisa demonstrar experiência e conhecimento. Blogueiras que se especializam na área de atuação e têm domínio do assunto escolhido para o blog, como Camila e Denise, estão no caminho certo. ;Embora seja um profissional novo, ele precisa se especializar. As pessoas não percebem que, assim como você pode se tornar famoso da noite para o dia, pode fazer o contrário e jogar sua reputação no lixo;, alerta. A fama pode ser altamente rentável. Apesar de a maioria não divulgar os rendimentos, é um ramo lucrativo, e muitos fazem do site a única fonte de renda por meio de parcerias comerciais e propagandas. Um post patrocinado pode chegar a custar R$ 15 mil entre blogs da plataforma F*Hits, a primeira entre páginas de moda e beleza, por exemplo (veja quadro).


Camila Coutinho: a blogueira mais influente do Brasil em moda e belezaRegularização
A facilidade de começar uma página on-line e o crescimento de blogueiros têm atraído aspirantes para a área. A brasiliense Luísa Ferrari Tomé, 23 anos, criou o La Luisité (laluisite.com) há apenas um mês, mas percebe resultados. Com receitas vegetarianas e criações DIY (Do It Yourself ; faça você mesmo), a página conquistou mais de 500 seguidores no Facebook. ;Após terminar a faculdade de psicologia, senti que era a hora de criar o blog. Tem muita coisa que eu fazia, receitas, criações no cabelo. As pessoas me pediam dicas e me incentivavam a criá-lo.; Ela tem investido em novos equipamentos para melhorar a qualidade técnica dos vídeos que publica, espera que os números aumentem e diz que poderia até viver da nova profissão caso alcance sucesso. A empresária e consultora de marketing digital Julia Morales, CEO do portal Brazilian Blogs, avalia que investir seriamente no site desde o início é um dos passos para o sucesso. ;Como em qualquer novo negócio, é preciso investir e se dedicar.;

A profissionalização trouxe burocracias para o empreendedor digital. ;É interessante procurar um contador, alguém que auxilie nos procedimentos: é necessário se regularizar. O blogueiro é um microempreendedor, deve emitir nota fiscal, ter reservas financeiras e pensar em contribuir para a previdência social;, aconselha. Segundo Roberto Lemos, apesar de a profissão ainda não ser reconhecida regularmente, as perspectivas são otimistas. ;Os investimentos crescem cada vez mais, e os profissionais estão procurando entender esse universo para criar conteúdos adequados. A tendência é continuar crescendo;, acredita.

A designer Sabrina Olivetti, 36 anos, e as jornalistas Marina Fabri e Thais Marques, 29, criaram o blog Coisas de diva como um passatempo para falar sobre moda e beleza e hoje comandam o nono blog mais influente do Brasil segundo o site Signature9. Elas não esperavam tanto crescimento e encontraram na formalização do negócio o maior desafio. ;Tivemos que aprender sozinhas a montar uma empresa e passar por todos os processos burocráticos envolvidos;, conta Sabrina, que lista como os maiores benefícios da profissão poder trabalhar em casa, fazer o próprio horário, não ter chefe e poder mexer com uma paixão: os cosméticos.

Independência
Além de se capacitar e se dedicar, focar mais na qualidade do que em lucros comerciais é uma das chaves para conquistar leitoras e manter uma postura bem-vista nas redes. É nisso que aposta a jornalista paulistana Juliana Romano, 25 anos. Ela poderia viver apenas do faturamento do Entre topetes e vinis (www.juromano.com) ; criado em 2009 para muheres plus-size ; que recebe 500 mil visitas mensais, mas prefere manter um emprego como repórter para ter liberdade editorial. ;Trabalhando, posso negar qualquer publicidade em que eu não acredite.; Seguindo o mesmo caminho de independência, o mineiro Ique Carvalho, 32 anos, é dono de uma agência de publicidade e criou o The Bro Code (www.thebrocode.com.br) há dois anos, onde fala sobre o amor. Em menos de três meses, vendeu 15 mil exemplares do livro Faça amor, não faça jogo, baseado nas publicações da página. Apesar de ter sido procurado por anunciantes, negou os pedidos. ;Escrevo para as pessoas conhecerem umas às outras internamente, para isso não há produto;, conclui.


Rendimentos

  • Presença em eventos com vídeo ; R$ 2.500 a R$ 25.000
  • Presença em eventos com post ; R$ 2.500 a R$ 25.000
  • Post ; R$ 1.000 a R$ 15.000
  • Vídeo ; R$ 1.500 a R$ 40.000
  • Menção ; R$ 500 a R$ 25.000

Referência de valores usados pela plataforma F*Hits

Palavra de especialista Ética na internet

Não há exigências para assegurar um comportamento ético no espaço virtual. É perigoso confiar em tudo que se fala na internet, e o público precisa ter discernimento. Toda blogueira é formadora de opinião, e o maior interesse de manter a credibilidade deve partir dela. Ela tem que merecer a confiança das pessoas para não sofrer represália dos próprios leitores. Não é crime fazer merchandising, mas uma blogueira honesta vai procurar anunciar produtos confiáveis. O público dos blogs ainda é limitado, não chega a 30% da população, mas a tendência é que, daqui a uma geração e meia, alcance 50% ou 70%. A amplificação dessas páginas é um processo irredutível.

Luiz Carlos Iasbeck, professor da Universidade Católica de Brasília, pós-doutor em comunicação e cultura

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