Trabalho e Formacao

Busca da estabilidade começa pela escola

Avanço da tecnologia, maior acesso à universidade e demanda por atendimento qualificado à população aumentam níveis de exigência nas seleções para cargos públicos e reduzem chances de candidatos com escolaridade menor

Rodolfo Costa
postado em 13/07/2015 10:11

A nova era do serviço público chegou com foco na qualificação, e as pessoas com menos escolaridade terão oportunidades cada vez menores de ingressar no setor. Com a necessidade de manter um quadro de pessoal bem preparado para atender as demandas da população, a tendência é que as autorizações de aberturas de concursos públicos contemplem maior número de cargos de nível superior.

O processo vai acompanhar a evolução educacional da sociedade, explica o secretário da Gestão Pública (Segep) do Ministério do Planejamento, Genildo Lins. ;Até a década de 1980, a União fazia concurso para nível básico. Hoje, a tendência é precisarmos cada vez mais de servidores de nível superior;, afirma.

No primeiro semestre deste ano, o Ministério do Planejamento liberou 5.054 vagas para nomeações de excedentes em concursos vigentes e aberturas de certames, sendo 2,8 mil para nível superior ; cerca de 55% do total. Se forem somadas as oportunidades no início de julho para as carreiras de advogado da União e procurador da Fazenda Nacional, o percentual passa de 56%.

Desafios
Os poucos cargos de nível médio a serem abertos vão aumentar a concorrência e o desafio para os candidatos que não têm nível superior. Com a crise econômica e o aumento do desemprego, a disputa por esses cargos tem atraído cada vez mais pessoas com escolaridade maior.

Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2013, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram 15,7 milhões de pessoas com nível superior, o equivalente a 11,3% da população com 20 anos ou mais, quase o dobro do resultado obtido na pesquisa de 2001.

Estudo do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) revela que, entre 2010 e 2013, cerca de 1 milhão de pessoas concluiu curso de graduação, por ano. Para Roberto Piscitelli, professor de economia da Universidade de Brasília (UnB), o cenário que se traça é favorável à administração pública, que começa a se equiparar à de países desenvolvidos como Estados Unidos, Inglaterra e França.

;No momento em que a gestão revela uma preocupação em valorizar o setor público com mais postos de nível superior e ser mais exigente para o ingresso nos cargos, isso é algo extremamente positivo;, comemora. Com a reposição e o fortalecimento de cargos de nível superior em áreas de atendimento e de infraestrutura, consideradas prioritárias para o Planejamento em 2015, o governo conseguirá atender às necessidades da população e da economia. ;Em 12 anos, a proporção de servidores civis do Executivo Federal com nível fundamental e médio, que era de 45,8%, caiu para 29,4%, e a de doutorados quase triplicou;, compara Piscitelli.

Outros rumos para a investidura no serviço público também estão previstos nas reivindicações de servidores de carreiras técnicas. Representantes dos servidores técnicos do Banco Central (BC), Ministério Público da União (MPU), do Legislativo,Judiciário e órgãos e agências reguladoras defendem que as atividades exercidas por eles não correspondem à competência de um cargo que exige nível médio para seleção.

;As atividades evoluíram muito ao longo dos anos. Nos próprios concursos são cobradas disciplinas como direito, que nem são lecionadas no ensino médio;, defende Alexandre Galvão, diretor do Sindicato Nacional dos Técnicos do Banco Central (Sintbacen).

A mudança de exigência de nível médio para superior na concorrência ao cargo não alteraria o trabalho dessas carreiras técnicas, reduziria os altos índices de insatisfação e combateria os desvios de função, defende Galvão. ;Hoje, há muitos analistas do Banco Central desempenhando funções de técnicos. Há estudos estimando que 76% dos que tomaram posse no concurso de 2010 estão frustrados. Não apenas analistas, mas muitos técnicos estão abandonando a autoridade monetária para tentar emprego em órgão que valorize mais o servidor;, diz ele.

Evolução
O presidente da Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac), Marco Antônio Araújo, questiona a tendência de priorizar os cargos com exigência de nível superior e a possibilidade de o Planejamento autorizar as mudanças de exigências de nível superior para postos de técnicos, o que ele considera ;grosseiro;. ;O que me preocupa é a extinção de cargos que exigem nível médio. Extinguir esses cargos ou transformar cargos de técnicos para superior tiraria a possibilidade de pessoas sem a graduação superior entrarem na máquina pública;, avalia.

As prioridades por graduados em cursos superiores não significarão a extinção dos cargos de nível médio, admite o secretário da Segep, Genildo Lins. ;A administração mudou nas últimas duas décadas. Tinha muito papel e muita atividade meio, exigindo um corpo de servidores com formação intermediária. Hoje, com a evolução tecnológica, essa necessidade vai diminuindo e a máquina passa a ter uma exigência de servidores com melhor formação;, argumenta.


"Em 12 anos, a proporção de servidores civis do Executivo Federal com nível fundamental e médio, que era de 45,8%, caiu para 29,4%, e a de doutorados quase triplicou"
Roberto Piscitelli, professor

Avanço da tecnologia, maior acesso à universidade e demanda por atendimento qualificado à população aumentam níveis de exigência nas seleções para cargos públicos e reduzem chances de candidatos com escolaridade menor

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