Trabalho e Formacao

Drible na crise

Profissionais formados apelam para atividades alternativas para complementar a renda e não ficar no vermelho ao fim do mês. No entanto, é preciso cautela na hora de investir no novo negócio para não se endividar ainda mais

Paula Braga
postado em 02/08/2015 12:18

Profissionais formados apelam para atividades alternativas para complementar a renda e não ficar no vermelho ao fim do mês. No entanto, é preciso cautela na hora de investir no novo negócio para não se endividar ainda mais

Eles se viram como pode

Reduzir despesas e cortar gastos desnecessários é a regra da vez para os brasileiros. Segundo pesquisa realizada pela Fundação Getulio Vargas (FGV) em sete capitais (incluindo Brasília), as pessoas estão mais insatisfeitas e confiam menos na economia. Entre os 2.116 entrevistados, 82,7% consideraram a situação econômica insatisfatória. Para driblar o momento de crise, alguns buscam atividades alternativas para ganhar dinheiro extra e evitar ficar no vermelho no fim do mês. ;É natural, diante de uma redução do poder de compra, procurar uma atividade para complementar a renda. Diferentemente de outros países, no caso brasileiro, temos um mercado informal bastante amplo, que possibilita que atividades à parte ; como vender salgados, doces e outros artigos ; tragam ajuda ao orçamento;, explica o professor doutor em economia da Universidade de Brasília (UnB) Flávio Basílio.

O enxugamento nas contas da família vem acompanhado também do receio de perder a fonte de renda: em junho, a taxa de desemprego no país subiu para 6,9%, segundo a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). ;O desemprego é uma realidade que, se ainda não apareceu, pode surgir no cotidiano das famílias. Mas quem perdeu um emprego recentemente e tem um valor de restituição precisa ter cautela antes de investir em um negócio com o objetivo de alcançar lucro. Isso envolve risco e é preciso tomar muito cuidado para que não incorra em ainda mais perda no orçamento;, recomenda Flávio Basílio. Outra pesquisa ; realizada pela Secretaria de Estado de Trabalho (Setrab), pela Companhia de Planejamento do DF (Codeplan) e pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômico (Dieese) ; revelou que, no Distrito Federal, a taxa de desemprego em maio era de 14,4%, com 223 mil pessoas desempregadas.

A pesquisa da FGV revelou que o número de pessoas que planejam reduzir os gastos passou de 41,1% para 43,5% em relação ao mês de junho. ;A recessão que o país enfrenta atinge, principalmente, a nova classe média alta, que foi inflada de maneira pouco sustentável para uma posição e agora está tendo que retornar para o orçamento anterior;, explica o professor de finanças do Centro Universitário de Brasília (UniCeub) Romildo Araújo. ;Quem procura outras atividades para complementar a renda têm razão em apresentar este comportamento. A recomendação é associar essas alternativas rentáveis a uma redução do nível de endividamento;, completa.


Número da recessão

82,7%

das pessoas estão insatisfeitas com a economia do país

Fontes: FVG, IBGE e Setrab

Histórias de trabalhadores que estão complementando a renda

 (Ana Rayssa/Esp. CB/D.A Press)

Thaís Paulino Ferreira, 25 anos
  • Profissão: arquiteta
  • Renda extra: produção de artigos para festa

Após realizar um curso sobre decoração de festas, a arquiteta Thaís Paulino decidiu investir no negócio. Ela começou a produzir convites, enfeites e decoração para eventos como uma maneira de complementar a renda e, agora, está prestes a iniciar uma empresa na área. ;Eu trabalhava em um escritório de arquitetura e, depois que saí desse emprego, comecei a atender alguns projetos em casa. Mas havia pouca procura;, conta. Atualmente, ela continua atendendo projetos na área de arquitetura quando aparecem, mas, paralelamente, produz artigos para até duas festas por mês. Apesar de ainda não contabilizar quanto o novo negócio rende mensalmente, ela acredita que, com a formalização e a maior divulgação da empresa, pode chegar a realizar um evento por fim de semana. ;O preço do serviço varia muito, então o lucro também é variável. Tudo é personalizado. Se a pessoa quiser uma festa em conta, posso fazer, mas também faço eventos que demandam investimento maior.;

"O preço do serviço varia muito, então o lucro também é variável. Tudo é personalizado. Se a pessoa quiser uma festa em conta, posso fazer, mas também faço eventos que demandam investimento maior;

 (André Violatti/Esp. CB/D.A. Press)

Frederico Silveira, 36 anos
  • Profissão: produtor de serviços gráficos
  • Renda extra: churrasquinho

O Churrasquinho do Fred, como ficou conhecido, está virando o ponto de encontro dos vizinhos dele, em Águas Claras. O negócio começou há menos de duas semanas, mas tem se mostrado lucrativo. ;É um espaço de confraternização. Muita gente não tem lugar para fazer churrasco no prédio ou no apartamento, então vem para cá no fim do dia. Funcionamos de segunda a sábado. Perto do fim de semana, chegamos a fazer R$ 400 por dia;, comemora Frederico. Para montar o negócio, ele precisou fazer um investimento inicial e, por conta disso, ainda não está lucrando. ;Se continuar como está, ao passar esta fase inicial, acredito que consigo tirar uns R$ 2 mil por mês para ajudar no orçamento doméstico;, prevê. Atualmente, Frederico trabalha também com impressão de serviços gráficos, mas afirma que esse seguimento registra queda. ;Independentemente da crise, as pessoas não ficam sem comer;, compara.

"Funcionamos de segunda a sábado. Perto do fim de semana, fazemos
R$ 400 por dia;

 (André Violatti/Esp. CB/D.A. Press)

Ellen Bader, 24 anos
  • Profissão: auxiliar administrativa
  • Renda extra: doces e bolos para festa

A necessidade de controlar o orçamento e pagar os custos da festa de casamento realizada em julho deste ano motivaram o negócio alternativo de Ellen Bader, 24 anos. Durante o dia, ela trabalha como auxiliar administrativa e, no período da noite, fica encarregada da produção das encomendas que recebe. Formada em biologia, ela iniciou a produção de doces e bolos no ano passado, após passar um período desempregada. ;Fizemos um bolo para o aniversário da família, as pessoas elogiaram bastante e continuamos fazendo para amigos e parentes. Foi uma saída que encontramos para equilibrar as contas. Ainda estamos pagando muitas despesas do casamento, e a venda de bolos e doces é uma grande ajuda no orçamento.; Ela afirma que, a renda gerada pelo negócio alternativo chega a ultrapassar o salário que recebe como auxiliar administrativa em uma igreja. ;Em alguns meses, a encomenda de doces gera de R$ 2 mil a R$ 3 mil. O negócio tem ajudado nesse período difícil;, admite.

"Em alguns meses, a encomenda de doces gera de R$ 2 mil a R$ 3 mil;


 (Ana Rayssa/Esp. CB/D.A Press)

Fabrício Passarinho, 40 anos

  • Profissão: professor
  • Renda extra: barraca de coco

O ponto de venda de coco de Fabrício Passarinho, 40 anos, é estratégico: ele monta a barraca e o guarda-sol próximos à ciclovia da 913 Norte. ;Eu não sabia se o coco era lucrativo, mas queria vender um produto saudável, que trouxesse benefício para as pessoas. O pessoal passa fazendo caminhada, andando de bicicleta e compra;, afirma. O produto foi a alternativa encontrada para manter as contas, depois do fim de um contrato temporário com a escola onde trabalhava como professor da educação especial até dezembro de 2014. ;Tive essa necessidade imediata de ter alguma renda. O coco tem ajudado e foi uma boa alternativa para passar por esse período;, conta. Em um dia de bastante movimento, ele chega a vender R$ 500. Como professor, o salário era de R$ 3,6 mil. ;Estou na expectativa de passar em um concurso e, enquanto estudo, a venda do coco consegue segurar as pontas;, destaca.

"O coco tem ajudado e foi uma boa alternativa para passar por esse período;
Palavra de especialista
Opções promissoras

Em tempos de crise, há duas possibilidades: uma é se manter na posição de mercado em que está e buscar aumentar a produtividade; a outra é enxergar oportunidades ainda não trabalhadas. Buscar alternativas para complementar a renda pode ser um caminho interessante, e a atividade pode virar a principal. Apesar disso, não há uma receita para o sucesso. Não podemos afirmar que todas as iniciativas para complementar renda em tempo de crise serão bem-sucedidas, mas o mercado brasileiro ainda é pouco explorado no segmento das indústrias criativas. As pessoas que estão inovando em artesanato, gastronomia, moda, design ou entretenimento podem atravessar esse momento de crise , que retorna de tempos em tempos, desde que sejam realistas e tomem consciência da situação.

Rossana Pavanelli, professora de projetos, estratégia e economia criativa no MBA da FGV
Eles se viram como pode

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