Aos 18 anos, a paulista Ana Carolina Queiroz foi escolhida para representar o Brasil no G(irls)20, iniciativa dos países do G20 criada em 2011 para aumentar a presença de mulheres em áreas como economia e política. O congresso segue o mesmo padrão do encontro mundial de líderes e reúne 24 representantes (uma menina de cada país do bloco e outras quatro de África e Oriente Médio) para discutir engajamento econômico feminino. Este ano será na China, para onde a jovem embarca em agosto.
Em dois dias, Ana Carolina participará de workshops e debates. Por fim, as participantes produzirão um documento que será entregue aos líderes do G20. Até lá, a menina está lendo e estudando bastante. ;Na reunião, cada participante se compromete a desenvolver um projeto no próprio país, com a ajuda deles, para empoderar mulheres economicamente. O meu envolve robótica e feminismo;, conta a paulista, que apresentará uma plataforma on-line que disponibiliza materiais de estudo sobre os temas voltados para meninas de 10 a 14 anos que se interessem pelo estudo de computadores e robôs. A ideia se baseia em mentoria e ensina que a temática também é para mulheres.
;Eu me engajei em atividades de robótica por 10 anos, vi o que foi mais positivo na minha experiência e tentei adaptar para as garotas mais novas. A ideia está na fase inicial, estou fazendo quase tudo sozinha, só chamei alguns amigos para ajudar, porque meus conhecimentos de programação são básicos;, explica a estudante do terceiro semestre de direito da Universidade de São Paulo (USP) que, em setembro, se mudará para os Estados Unidos, para estudar na Universidade Stanford, a mesma em que está matriculada a paquistanesa Malala Yousafzai.
Na renomada instituição, pretende cursar matérias de economia, ciência política e programação. ;Não gosto da divisão entre ciências exatas e humanas porque me identifico com as duas áreas. Eu me envolvi com robótica, questões sociais e outros assuntos. Acredito que será interessante estudar política pela possibilidade de me envolver com políticas públicas ao voltar ao Brasil;, revela.
Ana Carolina acumula outras conquistas acadêmicas: competiu em torneios de robótica ; como a olimpíada brasileira no tema e a First Lego League, em que representou o país no Canadá e na África do Sul e conquistou prêmios de primeiro lugar. Durante o ensino médio, foi líder de uma equipe de robótica no Colégio Dante Alighieri, em que desenvolveu um aplicativo que alertava a população de São Luiz do Paraitinga (SP) sobre inundações e o projeto TPM ; Tempo Para Mudanças, que promovia palestras para ensinar meninas da escola e da periferia a conhecerem e amarem o próprio corpo.
A jovem também criou o grupo Gursl da High School, em que mais de 300 meninas debatiam maneiras de diminuir as disparidades de gênero. Não à toa, recebeu elogios da American Psychological Association por meio de um certificado, além de ter ganhado uma bolsa de iniciação científica júnior. ;Eu me interessei por robótica quando vi uma máquina que fazia aparecer uma bala. Achei muito legal e, quando entrei para o grupo, aprendi sobre motores e conteúdos teóricos. Então descobri que adoro pesquisar;, revela.
;Durante os primeiros anos, eu era a única menina da sala envolvida com robótica. Eu tinha que trabalhar muito mais para ser reconhecida. Quando colegas contavam experiências, eu tentava compartilhar alguma e era menosprezada. Sempre fazia os trabalhos sozinha porque ninguém queria fazer comigo;, relata. ;Eu nem sabia o que era machismo, mas algo ali me incomodava;, completa. No 8; ano do ensino fundamental, Ana Carolina pensou em desistir da área e só não largou a atividade por conta do incentivo de uma coordenadora. ;Ela mandou me buscar em sala de aula e pediu para que eu não parasse. Mais velha, passei por situações de discriminação de gênero, mas aprendi a brigar pelo meu espaço;, declara ela que integra o coletivo feminista Dandarta na Faculdade de Direito da USP.
Feminismo
O processo seletivo do G20 consistia em uma série de perguntas sobre experiências pessoais com feminismo e em um vídeo que explicasse o que era empoderamento. ;Acabei escrevendo 11 páginas;, revela. A representante brasileira acredita que o principal problema a ser combatido pelo feminismo é a objetificação, fator que, segundo Ana Carolina, gera todos os casos de desigualdade e violência. ;A sociedade não nos enxerga como seres humanos mas como algo que satisfaz o homem;, critica.
Ana Carolina acredita que a internet facilitou o acesso a textos e pensamentos feministas, mas que esses conteúdos ainda não chegam às comunidades de baixa renda. ;No Brasil, o feminismo é muito branco, e é algo que a gente tem que mudar;, declara. A menina prodígio defende que o engajamento seja aplicado com outros objetivos. ;Hoje, o feminismo é usado apenas contra as coisas. As ativistas não defendem uma pauta própria, só tentam evitar que algo aconteça. Faltam causas definidas para formar um novo projeto de sociedade;, defende. Ela acrescenta que o empoderamento feminino não pode ser individual, mas coletivo e depende de cada um. ;Não adianta bater no peito e falar que não pisa na cozinha e ter uma mulher lá cozinhando para você;, exemplifica.
Reunião na China
O evento será em Beijing entre 8 e 9 de agosto. É possível conferir o perfil de todas as participantes pelo site.