Pesquisa da consultoria PwC entrevistou representantes de 268 empresas familiares de 31 países e concluiu que os herdeiros têm se preparado mais antes de assumir cargos estratégicos nas organizações, o que aponta um caminho de maior profissionalização nesse tipo de companhia. Entre os membros da nova geração, 70% acumulam experiências em instituições externas, ;o que quer dizer que eles conhecem o mercado e o funcionamento de negócios diferentes para levar conhecimento para dentro das firmas familiares;. É o que aponta Fabiano Tessitore, gerente de Auditoria e sócio da PwC Brasil. Em geral, os herdeiros começam de baixo e avançam de forma constante na empresa rumo ao topo. Isso é importante para fugir da impressão de que eles estão ali apenas por serem da família.
;Para minimizar as chances de ter uma reputação comprometida, a melhor saída é se capacitar. Mas é verdade, sim, que, em geral, os sucessores precisam trabalhar mais para provar que são capazes;, observa o sócio da PwC Brasil. O estudo revelou ainda que os membros da nova geração não querem ser meros ;zeladores; do negócio e almejam ver a companhia familiar melhorar e se diversificar. ;Entre as principais novidades, está o fato de que os membros da nova geração de agora têm muita confiança de que possuem as habilidades necessárias para participar ativamente da empresa e não de forma coadjuvante. Esses jovens chegam cheios de novas ideias e querem deixar a própria marca na administração em vez de apenas ouvir de outros o que devem fazer;, observa Fabiano Tessitore.
Um ponto positivo é que os herdeiros se capacitam cada vez mais para que isso seja possível. ;Em algumas companhias familiares em que há plano de sucessão, existem até requisitos de estudo como fazer mestrado ou um curso no exterior;, acrescenta. O principal risco no processo de sucessão é a possibilidade de conflitos. ;A geração atual não necessariamente está confortável pelo fato de os descendentes assumirem o negócio ou parte dele. Existe frustração de ambos os lados, porque os fundadores ou os mais antigos podem não receber tão bem as ideias trazidas pelos herdeiros.; No entanto, é inevitável que, em algum momento, a diretoria seja trocada. Para que o processo seja bem resolvido, Tessitore indica o plano de sucessão. ;As firmas com melhores resultados apostam nesse documento;, garante.
Em território nacional, no entanto, as que contam com tal mecanismo não são maioria, segundo Tessitore. Na diretoria da construtora Conbral, o desenvolvimento de um plano de sucessão está em curso. ;Estamos trabalhando nesse aspecto, pois estou me afastando da execução do dia a dia. Vamos nos sentar e discutir, com civilidade, o que será feito;, revela o fundador, Ennius Muniz, 68 anos. Na empresa, aberta em 1968, ele conta com o irmão Paulo Muniz, como sócio, e dois de seus quatro filhos Marcus Vinicius, 42, e Adriana Karina, 45 na linha sucessória. A mãe, Vanda, e diversos parentes trabalharam na empresa. O patriarca, também detentor do grupo Lorde Perfumaria, ressalta que os sucessores começaram de baixo. ;Não deixei meu filho, engenheiro civil, vir para o escritório enquanto não fizesse obras. Minha filha é administradora e, como ele, conquistou seu espaço;, afirma o avô de cinco netos. ;O mais velho tem 23 anos e vai se formar em administração nos Estados Unidos e, na primeira oportunidade, quero trazê-lo para cá;, programa.
De olho no futuro
Os irmãos Ana Cláudia Graça Couto Miziara, 50 anos, Juliana Graça Couto Amaral, 41, e Leonardo Graça Couto, 39, vêm de uma família com tradição em negócios. Eles comandam juntos a casa de festas Villa Rizza, que oferece bufê e decoração para até 1 mil pessoas. Antes de se situar no Setor de Clubes Sul, o espaço funcionava no Lago Sul, na residência da família. A empresa começou com a matriarca Rizza Vitória Graça Couto e, após a morte dela, há 13 anos, os filhos assumiram. ;Minha mãe gostava muito de receber pessoas e, depois que meu pai morreu, foi um processo natural ela começar a fazer disso um trabalho, há quase 30 anos;, revela Ana Cláudia. O patriarca, o engenheiro José Pereira da Graça Couto, veio para Brasília por causa de uma empreitada familiar. ;Meu avô era dono de uma construtora, da qual participavam meus tios. Nós viemos para a capital federal para meu pai cuidar de obras por aqui.;
Com a passagem do tempo, a instituição familiar do ramo da construção civil se esfacelou. Para que a casa de festas não tenha o mesmo fim, os irmãos sonham com a vinda de herdeiros para a instituição. ;Minha filha mais velha é médica, então não se encaixaria. A do meio é jornalista, e pensamos em um dia trazê-la para cá. Mas ainda tenho uma filha de 13 anos, e meus irmãos têm filhos na infância, então tem muita gente para pensar ainda. Resta esperar, pois o futuro a Deus pertence;, diz.
Inovação e hierarquia em equilíbrio
Com faturamento anual acima de R$ 1 bilhão, o grupo agroindustrial Bonasa Alimentos está na terceira geração. Fundado em 1964 por Aroldo Silva Amorim, que faleceu em 2002, a empresa tem como presidente Aroldo Amorim Filho, 66 anos. Os netos Aroldo Silva Amorim, 34, e o engenheiro de alimentos Pedro Silva Amorim, 32, ocupam cargos de gestão e estão sendo preparados para o futuro.
;Na infância, meu pai tinha o costume de nos levar para visitar unidades. Era uma diversão. Nunca foi imposição dele que entrássemos para a companhia;, revela Aroldo Silva Amorim, zootecnista. Experiências externas foram importantes para ele. ;Estagiei nua empresa de agricultura em Viçosa, e foi bom ter a oportunidade de vivenciar a cultura de outra companhia. Se eu não tivesse passado por isso, sempre me perguntaria como seria trabalhar sem minha família;, diz.
O conhecimento técnico, a dedicação e o respeito fez com que ele conquistasse espaço naturalmente na firma, que tem 5 mil colaboradores. ;Sempre procurei respeitar a hierarquia e tenho ciência da minha inexperiência. Sempre que quis sugerir alguma inovação, discuti primeiro com meu superior direto, em vez de atalhar até meu pai;, garante.
Outros traços os sucessores
Confira conclusões da PwC:
; Sempre pensaram em trabalhar na empresa da família - 58%
; A família sempre esperou que entrassem na empresa logo depois de se
formarem - 40%
; Dizem que as empresas familiares se reinventam a cada nova geração - 50%
A cara da nova geração no Brasil
Nível atual
Conselho 53%
Alta administração 23%
Gerência média 10%
Trainee 5%
Iniciante 3%
Idade
Abaixo de 25 anos 8%
De 25 a 34 anos 55%
De 35 a 44 anos 30%
De 45 a 54 anos 8%
Gênero
Feminino 35%
Masculino 65%
Palavra de especialista
Planejamento
Quando surgem perguntas sobre quem cuidará da empresa após o fundador sair de cena, é necessário pensar num planejamento sucessório. Em muitos casos, é indicado fazer uma holding familiar, cujo objetivo é preservar os recursos e transmitir a herança. A vantagem é que, assim, dispensa-se inventário e testamento que, muitas vezes, geram contestações . Quem não pensa em sucessão desencadeia um processo de quebra da empresa. Além de definir como tudo será feito, é preciso preparar os sucessores com transparência. Sei de um caso em que o fundador deixou tudo preparado para que o genro assumisse o negócio, mas não avisou as duas filhas o que desencadeou problemas.
Patrícia Garrote, advogada, dona de um escritório que leva seu nome, especializado em sucessões
Dicas para a transição
Confira orientações de Ítalo Ribeiro, coordenador do programa Sebrae Mais do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas:
; A transição deve ser uma iniciativa do fundador e conversada com todos os herdeiros
; A missão e os valores instituídos pelo criador da empresa devem ser cultivados
; O modelo de gestão deve ser aperfeiçoado, buscando a continuidade do negócio
; Busque transparência e objetividade na divisão das responsabilidades e atribuições, sobretudo na questão societária (cotas, participações, ações)
; É fundamental a implementação de uma gestão por competência e resultados: a empresa não pode se tornar um cabide de empregos ou passatempo para os herdeiros