Natália Aquino, 26 anos, é engenheira eletricista na empresa Smart LY, voltada à energia fotovoltaica, e enfrenta a dificuldade de concentração e rendimento no escritório. ;Trabalho com o computador toda hora e, quando percebo, estou em um site nada a ver ou respondendo mensagens de amigos;, admite. Além disso, ela diz sofrer para chegar ao trabalho no horário. ;Tenho muita sorte porque meus chefes são muito compreensivos.; Segundo a engenheira, os comportamentos afetam bastante a produção e a angustiam. ;Para a autoestima, é ruim porque você se sente incapaz de completar a própria vida e a função;, pondera a jovem que faz acompanhamento psicológico como estratégia para mudar de comportamento.
As atitudes problemáticas relatadas por Natália são comuns entre outros trabalhadores da geração Y ou millennials como são chamados os nascidos entre os anos 1980 e 1990. Em tempos de crise, em que o índice de desemprego nacional atingiu 11,6% em julho deste ano, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é necessário que os jovens se atentem a atitudes inadequadas para evitar entrar para as estatísticas de demissão.
Independentemente da área, os comportamentos profissionais mais mal vistos costumam envolver procrastinar, descumprir prazos e metas, desinteresse, desleixo com a aparência (ao usar peças informais, como shorts, chinelos, regatas e roupas curtas, decotadas e justas), não saber trabalhar em equipe, incapacidade de lidar com pressão, se comunicar de forma negativa e não se organizar. Os erros são mais comuns entre os que estão adentrando o mercado de trabalho, segundo Lucia Costa, diretora geral da Stato, consultoria em gestão de carreira. São pessoas com experiência profissional escassa, menos desenvolvimento pessoal e uma peculiaridade: o fato de terem crescido em era digital.
Os millennials agregam, a esse pacote de maus hábitos, especificidades da geração, como dispersão, dificuldade ao lidar com hierarquia e ao separar vida pessoal e profissional. Segundo pesquisa da PwC Brasil e da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (Easp/FGV), a faixa etária que domina o mercado de trabalho vai de 18 a 35 anos e é responsável por 61% das vagas. Acostumados ao intenso estímulo de informações, jovens carregam singularidades da realidade fugaz: têm, à sua disposição, um mundo de conhecimento e informações, estabelecem relações dinâmicas e horizontais.
Os traços dos ;filhos da era digital; impactam o mercado de trabalho. ;Houve um aumento de atitudes mais dispersas, não apenas pela geração em si, mas por causa da internet, acesso à informação e o fato de os profissionais terem crescido nesse ambiente. Anos atrás, havia outros ritmos, forma de trabalhar e relação com prazo e mudanças. O mundo ficou mais rápido, e essas condutas aumentaram nas empresas;, pondera Lucia Costa. Para Felipe Maluf, sócio-fundador da Y Coach, a dispersão é uma das principais questões comportamentais dos jovens. ;Há uma dificuldade de concentração, de terminar atividades muito grandes. Tarefas não só do trabalho, mas do dia a dia. Por exemplo, é raro encontrar jovens que leiam um livro de forma espontânea, que não seja obrigação da faculdade;, relata.
Além disso, é possível perceber que a mudança das dinâmicas da informação e de relações on-line ; como estabelecer vínculos relacionais digitais de forma mais fácil que quando estritamente presenciais ; influencia o comportamento de profissionais de pouca idade dentro do escritório. Segundo Diego Marra, coordenador de Recursos Humanos da consultoria Spot, respeitar hierarquia também se torna um problema. ;Um hábito comum é contestar tudo de forma aberta com colegas de trabalho quando essas questões podem ser levadas adiante em salas reservadas.;
Faltam ainda objetivos definidos no que tange carreira, o que deriva da fartura de alternativas. ;Muitos não têm ideia do que buscam ou almejam. Existe uma falta grande de referência para jovens porque eles não se espelham em seus gestores por não se identificarem com o estilo de vida deles. Se não há modelo, isso se reflete nos comportamentos e na habilidade para traçar planos e ideais.; Estabelecer barreiras entre os âmbitos profissional e pessoal é um desafio para membros das novas gerações, segundo Diego Marra. É comum que pessoas criadas em meio a diversas ferramentas tecnológicas não tenham discernimento sobre as diferenças de comportamentos necessárias dentro e fora da firma. ;Uma coisa é estar com amigos, outra é replicar a atitude no trabalho. Por mais que os colegas sejam íntimos, deve-se manter atitudes profissionais;, ensina.
O que eu quero é ser feliz
Segundo pesquisa realizada, em 2013, pelo Núcleo de Tendências e Pesquisa do Espaço Experiência da Faculdade de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Famecos-PUC/RS) sobre o comportamento do jovem brasileiro, feito com pessoas de 18 a 34 anos em todas as regiões do Brasil, trata-se de uma geração interessada em ser feliz no trabalho, conhecer o mundo e formar família. Diferentemente de grupos geracionais anteriores, focados no individualismo, os jovens de agora não estão tão interessados em acumular patrimônio, não têm foco exclusivo no sucesso e buscam dividir opiniões e experiências. É importante que o mercado se adapte a esse profissional que ocupará, em breve, boa parte dos cargos executivos e de diretoria ; muitos, inclusive, estão em postos de liderança. Para Lucia Costa, diretora geral da Stato, ;cada empresa se adapta a essa realidade de forma diferente, mas é essencial que o profissional tenha consciência das próprias atitudes para não ter comportamentos inadequados e se tornar improdutivo;.
Como lidar com os millennials
GGilberto Franzoni, 48 anos, diretor da escola de educação profissional Best Minds, localizada em Taguatinga, descreve como é liderar equipes de trabalhadores sempre conectados a smartphones. Para ele, a relação íntima que os jovens mantêm com a tecnologia acarreta no uso dessas ferramentas mais para prazer do que para gerar produtividade, levando o profissional a perder o foco. ;E gestores que proíbem o acesso à tecnologia são taxadas como pessoas fora da realidade;, diz. Para ele, no entanto, a questão é cultural, e o que chefe deve fazer é se comunicar frequentemente com os colaboradores para deixar claras as atribuições.
;O feedback deve ser feito individualmente, mas o superior tem que relatar os problemas pontuais de desempenho. Trabalhar bem com a geração Y é questão de combinar com clareza as regras do jogo e monitorar para que elas sejam cumpridas;, percebe Gilberto. Rita Brum, mestre em psicologia, master coach e sócia-diretora da consultoria Rhaiz, enfatiza que é fundamental estabelecer as competências esperadas do profissional para minimizar desvios na conduta do empregado.
;Se ele tem demonstrado falta de interesse, pouca produtividade, não cumpre horário, aí a empresa tem que avaliar o comportamento e capacitar o funcionário. Mas a firma só consegue fazer isso se conhece o perfil do cargo e do funcionário. O que geralmente gera mau comportamento é a pessoa não saber exatamente para que foi contratada;, explica.
Qual o limite?
A tolerância das empresas varia de acordo com segmento, gestão, porte e metas. Cada instituição tem regulamento próprio que estabelece os regimentos, a forma de avaliação e acompanhamento dos funcionários, e as medidas a serem tomadas ao lidar com condutas inadequadas, como advertências e demissão. As formas de avaliação variam desde análise de satisfação do cliente a relatórios de colegas e superiores para avaliação de desempenho. ;Em média, a tolerância da empresa vai até o ponto em que esse hábito ou essa forma de se conectar ao mundo não comece a prejudicar a produtividade;, revela Lucia Costa, consultora da Stato. Caso seja promovido um acompanhamento do desenvolvimento do profissional e não haja indicação de melhoras, a demissão pode ser a conclusão daquele processo.
Em caso de dispensa devido a erros de conduta, é primordial que o profissional se esforce para alterar seu modus operandi. ;Muitas pessoas veem uma experiência negativa como aprendizado. Outras não, se rebelam e têm atitudes negativas. Ver o que aconteceu no passado e ver o que pode tirar de positivo daquilo é fundamental;, avisa a coach Rita Brum. Na hora de buscar recolocação no mercado, referências e indicações são relevantes e podem prejudicar o candidato caso ele tenha histórico de má conduta. Assim, é importante articular bem o que falar, mas sem mentir para os recrutadores. ;A pessoa tem que administrar o que fala e preparar os entrevistados, contando o porquê de ter saído.;
Mesmo que não chegue ao extremo da demissão, um funcionário com comportamentos inadequados sempre chama a atenção de forma negativa. É necessário ficar atento para isso e cuidar da própria reputação. Para Felipe Maluf, é importante que os jovens entendam que existem regras e modo de operar estabelecidos. ;Se a pessoa quer desafiar o mercado, imprimir uma nova dinâmica e não estar disponível para flexibilizar, com vontades muito próprias, pode levar muita porrada na carreira;, adverte.
Vantagens
A geração Y não é só problema. Por serem multitarefa, capazes de se interessar por uma pluralidade de tópicos ao mesmo tempo, os integrantes dessa faixa etária se tornam profissionais bastante engajados. ;A informação está trazendo muita consciência para o jovem. Ele tem noção de que, se ele não mudar o mundo agora e não interferir, teremos um planeta não tão bom quanto o nosso e o dos nossos pais. Isso traz um sentimento de pertencimento e necessidade de ação muito grande;, afirma Felipe Maluf, da Y Coach.
Além disso, para aqueles que utilizam a abundância de conhecimento disponível pela internet para estudar, o resultado é muito positivo. ;Há profissionais que se especializam, mas o nível de conhecimento que ele adquire fora da própria área de atuação de forma espontânea e gratuita é altíssimo. São pessoas muito completas profissionalmente, que conseguem conectar pontos, porque sabem aproveitar as informações disponíveis.;
Mudança em curso
Uma boa notícia para a geração Y é que sempre há tempo de mudar de comportamento. Foi esse o caminho buscado por Débora Santana, 32 anos, formada em gestão de recursos humanos. Em 2015, ela foi promotora do projeto de marketing nas campanhas de Dia das Mães e dos Namorados de um shopping de Brasília, e no ano seguinte, ganhou o cargo de promotora líder, no qual geria a equipe de atendimento. A transição foi complicada devido às novas responsabilidades, e Débora precisou alterar a própria conduta. Ela aprendeu a controlar a ansiedade, a afobação (ou preciptação) e o tom da voz para lidar melhor com outros funcionários. Para tanto, foi acompanhada de perto por uma equipe de recursos humanos que orientou o desenvolvimento profissional da gestora. ;Sempre que eu conversava com meu chefe, ele estava pronto para ajudar, indicava os pontos negativos e positivos, e eu pedia orientações de como agir, porque eu via que tinham coisas que não estavam ao meu alcance;, destaca.
A psicóloga e coach Rita Brum realça o autoconhecimento como etapa crucial para o desenvolvimento dos jovens. ;Quando o funcionário é contratado, é importante que ele identifique se os valores da empresa estão de acordo com os dele. Se não estiverem, isso vai gerar uma insatisfação por parte dele e da companhia e desencadear comportamento inadequados.; Além da identificação, é importante admitir desvios de conduta. A partir daí, existem diversas opções para aqueles que visam uma mudança de hábitos. No entanto, segundo Felipe Maluf, da Y Coach, o processo é profundo e penoso. ;São hábitos de uma vida;, adverte. Segundo Lucia Costa, diretora da Stato, formas de lidar com os problemas de conduta são: buscar aconselhamentos de especialistas, como terapia, mentoring e coaching e cursos e técnicas destinados ao desenvolvimento profissional. Para Felipe Maluf, outra dica é se aproximar e se espelhar em profissionais modelo, na vida real ou até em páginas de redes sociais.
Cursos
Existem muitos métodos para combater comportamentos prejudiciais para carreira. Confira cursos on-line que podem ajudar:
Coursera
Mais eficiência, menos trabalho: gestão do tempo e a melhora da produtividade pessoal e profissional
Disponível em www.coursera.org/learn/work-smarter-not-harder
Duração: de quatro horas a oito horas de vídeos, leituras e questionários
Valor: gratuito
Learn Cafe
Técnicas de aprendizagem acelerada
Disponível em www.learncafe.com/cursos-gratis/auto-ajuda/desenvolvimento-pessoal
Duração: 10 horas
Valor: gratuito
Prime Cursos
Treinamento e desenvolvimento
Disponível em www.primecursos.com.br/treinamento-e-desenvolvimento
Duração: 40 horas
Valor: gratuito
Instituto Monitor
Curso de motivação pessoal
Disponível em www.institutomonitor.com.br/curso-motivacao-pessoal.aspx
Duração: 10 horas
Valor: R$ 144
Escola Afpesp
Aprenda a administrar o seu tempo
Disponível em www.escola.afpesp.org.br/site/curso-online-detalhe.aspx?idCurso=144
Duração: duas horas
Valor: R$ 34,90
Livros
Por que fazemos o que fazemos?
O filósofo e escritor Mario Sergio Cortella desvenda as principais preocupações com relação ao trabalho. Aborda a importância de ter uma vida com propósito, motivação em tempos difíceis, os valores e a lealdade ; a si e ao emprego. Recheado de ensinamentos como ;Paciência na turbulência, sabedoria na travessia;, é uma obra destinada a quem sonha com realização profissional sem abrir mão da vida pessoal.
Autor: Mario Sergio Cortella
Editora: Planeta do Brasil
176 páginas
R$ 20,80
Vida e Carreira ; um equilíbrio possível?
Cortella e Mandelli defendem que conciliar vida pessoal e carreira não se trata de nenhuma espécie de delírio, mas lembram ao leitor de que nem mesmo é possível separar a vida pessoal da profissional. Diversos temas são perpassados na obra como a construção da carreira, as conexões entre estabilidade e segurança, valores e felicidade, e a contribuição da tecnologia.
Autores: Mario Sergio Cortella e Pedro Mandelli
Editora: Papirus 7 Mares
112 páginas
R$ 28,20
Foco & Atenção
A obra traz 100 perguntas para estimular o cérebro na tarefa de se concentrar. Segundo a obra, o mundo em que vivemos nos distrai o tempo inteiro: ;você começa uma tarefa e para porque recebeu um e-mail. Recomeça o que tinha parado e dá outra parada para ver o Whatsapp. Quando chega o final do dia, é comum aquela sensação de não ter produzido nada, com um cansaço de quem trabalhou dobrado;.
Autora: Flávia Lippi
Editora: Matrix
100 páginas
R$ 32
Código Y: decifrando a geração que está mudando o país
A chamada Geração Y (nascidos entre 1980 e 1995) começa a assumir cargos de maior responsabilidade e decisão. No Brasil, diferem muito das gerações anteriores. Entender essa geração é entender o futuro e o modo como as instituições precisam mudar. A obra aborda como esses jovens se comportam e decifra a geração que está mudando o Brasil.
Autores: Marcos Calliari e Alfredo Motta
Editora: Évora
192 páginas
R$ 64,90
Carreira: o começo certo em um futuro incerto
Será possível registrar um conceito de carreira em um único livro? Com estrutura de pensamento coerente e simples, o autor demonstra que é possível refletir sobre carreira a partir de um posicionamento pessoal que exige protagonismo. Com exemplo e conselhos, a leitura conduz a reflexões muitas vezes óbvias, mas que acabamos esquecendo por pura falta de foco.
Autor: Felipe Maluf
Editora: Integrare
168 páginas
R$ 37,90