Michael Rios*
postado em 23/04/2017 14:45
O momento de dar à luz pode ser marcado por medo e sensação de desamparo em corredores de hospitais e maternidades. Para ajudar os pais nesse período é que existe a figura da doula, profissional que oferece apoio emocional, tira dúvidas, aplica medidas de conforto (como massagens e técnicas de relaxamento) e acompanha gestantes antes, durante e após o parto. Para formar mão de obra capacitada para esse nicho do mercado, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Brasília (IFB), em parceria com a Associação de Doulas do Distrito Federal, criou o primeiro curso de extensão sobre a área do país. Na primeira edição, cujas aulas começaram em 15 de dezembro de 2016, foram oferecidas 100 oportunidades, exclusivamente para mulheres. ;Trabalhamos com questões femininas que, às vezes, não cabem ao homem;, justifica Marilda Castro, presidente da Associação de Doulas do DF.
As vagas foram ocupadas por ordem de inscrição e o grupo foi dividido em duas turmas vespertinas de 50 alunas, cada uma; nos câmpus de São Sebastião e de Ceilândia. Totalmente gratuita, a formação une teoria (passada por professores do instituto e por monitoras da Associação de Doulas do DF) e prática, abordando conteúdos como primeiros socorros, saúde e informática. A aplicação dos conhecimentos é garantida por meio de trabalhos voluntários executados pelas alunas em hospitais. As primeiras turmas do curso de extensão de doulas serão encerradas no mês que vem: a entrega dos certificados está marcada para 28 de maio. ;A nossa missão é levar educação de qualidade e excelência onde não há: o lado mais acadêmico é o que faltava para as doulas. É um curso inovador, modelo para outros;, afirma Nilzélia Oliveira, professora de serviço social e coordenadora do curso no IFB de São Sebastião. Diferentemente do que pode indicar o senso comum, doulas não são parteiras. Isso é ressaltado na formação oferecida pelo IFB. ;O que elas fazem é auxiliar mulheres durante esse momento. Se a profissional faz o parto, ela está sendo antiética;, observa Nilzélia.
Marilda Castro, graduada em saúde pública pela Universidade de São Paulo (USP), ressalta a importância do curso para sanar lacunas de um mercado que vem crescendo na capital federal. ;De cinco anos para cá, a doula teve uma evolução grande no DF. Hoje, somos mais de 700 atuando em Brasília;, relata. Formada em letras pela Universidade Federal de Goiás (UFG) e mestre em educação pela Universidade de Brasília (UnB), Letícia Ribeiro é uma das professoras do curso e explica que cada disciplina que compõe o currículo contribui para a formação das participantes. ;Em sala de aula, ministrando a matéria Leitura e produção textual, trabalhamos as memórias das alunas e fizemos rodas em que histórias de vida foram contadas. Elas reviveram situações boas e ruins relacionadas ao parto. Mesmo que a matéria tenha sido de língua portuguesa, o enfoque era voltado à temática do curso;, observa.
;As aulas têm mostrado a importância de as mulheres se unirem e se ajudarem. A turma tem crescido muito, criando laços que certamente se estenderão para além do curso;, conta Ednizia Ribeiro, coordenadora da formação de doulas no câmpus Ceilândia. Mestre e doutora em geografia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), ela também aprova a interação com mães nas aulas. ;Algumas das gestantes acompanhadas pelas alunas deram à luz. Então essa experiência marcou profundamente as mulheres que estão se formando e serve como um estímulo para elas mesmas e para as colegas;, diz. O curso do IFB ainda não é reconhecido pelo Ministério da Educação (MEC) e, para ser oficializado, é necessário que as estudantes, após concluírem com êxito os estudos, se tornem profissionais que podem estender a atuação para hospitais e casas de parto. Ainda não se sabe quando ou se será ofertada uma nova turma do curso de formação de doulas, mas, segundo Marilda Castro, da associação do ramo, e Nilzélia Oliveira, do IFB, a intenção é que outras vagas sejam oferecidas no segundo semestre.
Experiências
Alzira Francisca dos Santos, 57 anos, concluiu o ensino médio na Escola de Jovens e Adultos de São Sebastião há três anos, tem dois filhos, de 26 e de 21 anos, descobriu as aulas por meio de uma rede social e quis aproveitar a oportunidade. Aos 17 anos, Alzira chegou a fazer o parto de uma sobrinha e essa aproximação com o nascimento e o processo de cuidar e trazer alento para gestantes foi o que a motivou a se matricular. ;É uma área com a qual me identifico bastante. Quero me aprofundar e me dispor a trabalhar como voluntária para ser uma doula eficiente. Acredito que o mundo precisa de amor, de afeto e de um olhar amigo;, opina. A aluna mais jovem da classe de São Sebastião é Maria Júlia de Melo, 20. Estudante de psicologia da UnB, ela soube o que era uma doula acompanhando blogs e sites sobre o tema. Solteira e sem filhos, espera que, no futuro, possa proporcionar ajuda a quem precisa. ;Sempre acompanhei a gravidez das minhas amigas e era angustiante. Percebi que a apreensão é comum durante o parto. Para mim, a gravidez por si só era dolorosa, mas, no curso, entendi que não precisa ser assim, que eu poderia ajudar para que não fosse;, ressalta.
Atribuições
O que a doula faz?
Explica termos e procedimentos, ajuda a mulher a se preparar para o nascimento do bebê. Auxilia a parturiente a encontrar posições mais confortáveis e a relaxar.
O que a doula não faz?
Não realiza procedimentos médicos ou clínicos, administra medicamentos ou monitora a saúde. Não substitui qualquer profissional de saúde. Não cabe à doula discutir procedimentos com a equipe médica ou questionar decisões. Fonte: Marilda Castro
Saiba mais
Curso de formação de doulas
Modalidade: extensão
Carga horária: 205 horas
Informações sobre turmas futuras: www.ifb.edu.br
Origem
A primeira a utilizar o conceito de doula foi a antropóloga americana Dana Raphael, ao observar mulheres que ajudavam novas mães nas Filipinas. Com o tempo, a Organização Mundial de Saúde (OMS) e os ministérios da Saúde de diversos países, entre eles o do Brasil, reconheceram a profissão.
Reconhecimento
A Lei Distrital n; 5.534/2015 regulariza a presença de doulas nos hospitais do DF. O texto afirma que é direito da mulher dispor de um acompanhante escolhido por ela durante o trabalho de parto.
* Estagiário sob supervisão de Ana Paula Lisboa